|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Política e economia
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
As próximas eleições presidenciais serão decididas fundamentalmente por fatores econômicos. As pesquisas de opinião
que estão sendo realizadas quase
semanalmente mostram que 70%
dos entrevistados querem mudanças na economia. A falta de
crescimento dos últimos anos e o
aumento do número de brasileiros fora do mercado de trabalho
vêm provocando uma queda contínua nos salários reais. Trabalhadores e sindicatos têm sido
obrigados a privilegiar a manutenção dos postos de trabalhos em
detrimento dos aumentos que
mantenham constante o valor de
compra dos salários. Além disso, o
aumento superior à inflação média das tarifas de energia elétrica
e de outros serviços públicos fez
com a queda da parcela dos salários disponíveis para consumo
fosse ainda maior. "Last but not
the least", os juros estratosféricos
cobrados no crédito pessoal têm
limitado ainda mais a capacidade de consumo da sociedade. Não
fica difícil entender, portanto, a
tendência oposicionista dos eleitores.
Comentando recentemente um
estudo do IBGE sobre o padrão de
consumo dos brasileiros nos últimos anos, o presidente Fernando
Henrique disse não entender a
malaise atual dos brasileiros
diante de indicadores que mostram uma clara melhoria da qualidade de vida durante seu período de governo. A explicação é
muito simples: houve uma melhora no estoque de bens de consumo
do brasileiro médio durante o primeiro mandato de FHC, mas a
renda dos últimos anos colocou
um freio nesse processo. A malaise deriva, portanto, da percepção
clara de que o padrão de vida do
brasileiro médio estagnou. "Não
temos futuro", disse um dos entrevistados em uma dessas pesquisas.
Essa decepção não está limitada
aos cidadãos consumidores. Mesmo os empresários, médios e pequenos principalmente, dos mais
diversos setores de produção estão a pedir mudanças. Espremidos entre seus clientes sem poder
de compra e custos financeiros
elevadíssimos, eles também não
conseguem ter esperança com o
futuro. Todos nós conhecemos hoje algum empresário que, talvez
pela primeira vez, esteja considerando a hipótese de votar no PT.
Entre uma economia organizada,
com bons fundamentos, mas sem
crescimento e uma tentativa nova
de voltar a crescer, ainda que com
enormes incertezas em relação a
seus resultados, muitos vão escolher essa última hipótese. Por
mais arriscada que seja.
Aparentemente, nesse início da
campanha eleitoral, estamos
diante de um dilema que coloca
de um lado a opção por uma economia organizada e sem força e
do outro por uma economia sem
a disciplina necessária à estabilidade, mas com alguma chance de
crescimento. Nada mais falso,
meus amigos da Folha! Existe um
terceiro caminho, difícil e que exige sabedoria e competência para
ser trilhado, que pode levar o Brasil a um ciclo virtuoso de crescimento e ordem. Não é o chamado
malanismo nem o petismo light
que Duda Mendonça tenta vender na televisão. A essa outra alternativa a imprensa brasileira,
quase sempre simplificadora das
coisas, chamou de desenvolvimentismo. Nome falso e sem significado, mas que serviu ao ministro Pedro Malan para desclassificá-la, quando do início do segundo mandato do presidente
Fernando Henrique.
Um dos maiores desafios do senador José Serra será o de retomar a construção dessa alternativa. Mostrar que seu governo vai
buscar a convivência entre estabilidade e crescimento econômico e
que a alternativa PT envolve riscos enormes pela falta de clareza
do programa de Lula e pelas contradições entre as teses defendidas historicamente pelo partido e
as necessidades de uma economia
ainda em mutação como a brasileira deverá ser o centro de sua
campanha. Não vejo nas eleições
deste ano condições para que seu
discurso seja apenas o de satanizar e desqualificar seu adversário.
Será preciso antes desenvolver
uma autocrítica segura e clara
dos caminhos trilhados nos últimos quatro anos. Feito isso, aí,
sim, ele poderá então chamar a
atenção dos eleitores para a fragilidade administrativa e programática do candidato do PT.
A passagem de Serra pelo Ministério do Planejamento nos primeiros anos do longo mandato de
FHC dará a seu discurso uma legitimidade importante. Enquanto ele fazia parte da equipe econômica do presidente, defendeu alternativas à política do ministro
Malan. Uma visão menos ideológica do funcionamento de uma
economia de mercado como a
nossa; um entendimento mais
realista do comércio internacional; a defesa de políticas públicas
que acelerem as transformações
de nosso tecido produtivo; uma
preocupação mais agressiva com
os níveis de juros internos e a redução de nossa dependência exagerada à entrada de recursos externos são alguns dos pontos que
puseram o hoje senador por São
Paulo em rota de colisão com o
todo-poderoso ministro da Fazenda. Ele saiu do governo porque perdeu essa disputa. Agora,
no momento em que foi escolhido
como candidato oficial de FHC
ao cargo de presidente da República, ele pode retomar esse seu
caminho.
A polarização entre o candidato do governo e Lula vai permitir
um debate mais rico e livre das
fraquezas inerentes aos candidatos Garotinho e Ciro Gomes. O
eleitor terá bastante tempo para avaliar vantagens e riscos das
duas alternativas disponíveis durante o período eleitoral na televisão. Teremos certamente um belo momento da nossa consolidada democracia.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 59, engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
Texto Anterior: Erro em especulação com dólar e juros faz risco-país passar de mil Próximo Texto: Análise: Descaso de Bush agrava crise na América Latina Índice
|