São Paulo, sexta-feira, 24 de outubro de 2008

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Greenspan admite ter errado "parcialmente"

Ex-chefe do Fed, antes visto como "oráculo" do mercado, é inquirido duramente sobre sua atuação no BC dos EUA

Greenpsan depõe durante 4 horas e diz que errou ao crer que as próprias instituições teriam receio de operações que pudessem quebrá-las

FERNANDO RODRIGUES
ENVIADO ESPECIAL A WASHINGTON

Antes tratado com deferência e respeito, o "maestro" Alan Greenspan ontem enfrentou perguntas duras dos congressistas americanos ao ser questionado se não houve negligência das autoridades em relação à atual crise financeira global.
Foram cerca de quatro horas de questionamento sobre a capacidade do mercado funcionar com poucas regras e ter capacidade de reagir sozinho a crises. Acuado, o ex-presidente do Fed (o BC dos EUA) de 1987 a 2006, admitiu ter errado, mas apenas "parcialmente".
Greenspan, 82, foi nas últimas décadas o maior defensor do livre mercado e da auto-regulamentação das instituições financeiras, com o mínimo de intervenção do Estado.
Depois de ler um texto preparado previamente, Greenspan passou a ser diretamente inquirido pelos congressistas. O deputado democrata Henry Waxman, da Califórnia, que preside da comissão na qual se deu o depoimento, argumentou que Greenspan "tinha autoridade para interromper as práticas de empréstimos irresponsáveis que alimentaram o mercado de empréstimos imobiliários subprime [de baixa qualidade], mas "rejeitou os apelos para que interviesse".
Conhecido como "oráculo" por muitos anos no mercado, Greenspan passou a manhã toda acuado. Waxman fez a pergunta que nunca ninguém tinha feito de forma tão explícita, e em público: "O sr. errou?". Constrangido, o economista respondeu: "Parcialmente".
Ao elaborar sobre o sistema de livre mercado, disse: "Eu encontrei uma falha". Esse defeito, argumentou, foi ter acreditado durante quatro décadas que as próprias instituições que fazem empréstimos fosse capacitadas para proteger o interesse dos seus controladores. Ou seja, que um banco não vai começar a emprestar dinheiro de maneira irresponsável porque sabe que vai à falência.
"Aqueles de nós, eu inclusive, que esperávamos que o interesse próprio das instituições de empréstimo protegesse os acionistas estão em estado de descrença e choque", afirmou.
Waxman não se contentou e fez o que pôde para expressar sua insatisfação. "O sr. foi aconselhado [a impor limites ao mercado] por tanta gente (...) e agora a economia inteira está pagando o preço. O mantra era que a regulamentação do governo era errada. Que o mercado era infalível", disse.
Ao admitir que errara apenas "parcialmente, Greenspan se referiu a algum tipo de regulamentação para o mercado de derivativos. Não está agora defendendo uma regra geral para todas essas operações, mas só às conhecidas como "credit default swaps", os derivativos de crédito. O restante continuaria livre de regras, inclusive contratos sobre a variação cambial -os que mais afetaram empresas no Brasil.
O desafio agora, declarou Greenspan, será os congressistas e as autoridades reguladoras enfrentarem a questão "muito grande para quebrar". Trata-se da tese de que certas instituições financeiras são tão agigantadas que o custo de uma falência seria sempre maior do que um socorro do governo -por causa do risco sistêmico.
Para Greenspan, é necessário que sejam definidas algumas "punições" para os grandes bancos que se arrisquem a ponto de ficarem em situação de pré-falência para que não tenham sempre uma vantagem injusta sobre rivais menores.


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