São Paulo, sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

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Banco francês sofre fraude de US$ 7 bi

Na maior fraude da história bancária, operador perdeu bilhões no mercado de ações e criou cobertura fictícia para rombo

Société Générale faz emissão de US$ 8 bi para cobrir perdas e diz que Jérôme Kerviel não teve ganho pessoal com fraude

DO "FINANCIAL TIMES"

O Société Générale, um dos pilares das finanças francesas e um dos mais lucrativos bancos europeus, revelou ontem que foi vítima de trapaças de um operador, na maior fraude da história bancária, o que forçou a instituição a lançar uma emissão de emergência para captar 5,5 bilhões (US$ 8 bilhões).
A fraude, simples mas sofisticada, foi atribuída a Jérôme Kerviel, 31, operador que trabalha no banco em Paris. Seu paradeiro era desconhecido.
Kerviel parece ter apostado bilhões de euros em movimentação futura dos mercados europeus de ações e criou posições fictícias de hedge para cobrir seus rastros, em uma fraude que custou 4,9 bilhões (US$ 7,1 bilhões) ao banco.
O Société Générale, que teve as negociações de suas ações suspensas temporariamente ontem, rapidamente desmontou as posições de derivativos de ações que o operador havia estabelecido, cujo montante total foi estimado entre 50 bilhões e 70 bilhões.
No final do pregão, as ações do banco fecharam ontem com queda de 4,1%, enquanto a Bolsa de Paris subiu 6%.
A fraude reduziu o impacto do anúncio do Société Générale, ontem, de que a crise do mercado de crédito hipotecário americano forçou o banco a contabilizar prejuízos de 2 bilhões, montante muitas vezes superior ao impacto que a instituição havia estimado há algumas semanas. Tanto o presidente-executivo Daniel Bouton quanto Jean-Pierre Mustier, o presidente da divisão de investimento, apresentaram suas renúncias, mas o conselho do banco as rejeitou.
Tendo descoberto a fraude no final de semana, o Société Générale esperou até que pudesse desfazer as posições antes de revelar as dimensões do rombo. O escândalo abalou a liderança financeira francesa, que rapidamente cerrou fileiras em apoio ao banco.
"Não estou preocupado com a confiança. Prova disso é que o Société Générale, mesmo com uma fraude em escala sem precedentes como essa, conseguiu consertar a situação em três dias e emergir ainda mais forte", disse Christian Noyer, presidente do Banque de France.
Executivos de bancos rivais querem saber como Kerviel pode ter criado posições dessa magnitude sem atrair a atenção. Eles afirmam que o desequilíbrio deveria ter ficado claro com base no fluxo de caixa do banco, e que o hedge falsificado deveria ter sido percebido pela mesa de operações encarregada de cobrir as posições em aberto. Mas Kerviel parece ter acumulado seus prejuízos em prazo muito curto. Segundo Mustier, sua posição de dezembro foi fechada com um pequeno lucro, e voltou a operar no começo de janeiro.
Os executivos do Société Générale foram alertados quanto à fraude pela primeira vez na noite de sexta-feira, depois de uma denúncia de outro operador. Àquela altura, Kerviel havia acumulado prejuízos de 1,5 bilhão. Mas, quando o banco tentou desfazer suas posições em aberto, na segunda-feira, a queda global nos mercados de ações levou a uma multiplicação dos prejuízos.
Mustier diz acreditar que Kerviel tenha agido sozinho e que sua motivação não parece ter sido o ganho financeiro. "Ele não tinha senso de realidade e não compreendia o que estava fazendo", disse Mustier, que estabeleceu as dimensões da fraude depois de interrogar Kerviel durante toda a noite de sábado. "Quando eu vi as dimensões da posição, compreendi que não era algo que a maioria das pessoas fosse capaz de compreender."
Kerviel e cerca de seis de seus superiores hierárquicos foram demitidos. A escala da trapaça do operador e a ausência de benefícios pessoais causaram espanto nos altos executivos no banco.
Os executivos de primeiro escalão do Société Générale pareciam tão surpresos com a ausência do lucro como fator de motivação para as ações de Kerviel quanto pela escala de sua fraude. Embora tenha evitado divulgar informações sobre Kerviel -inicialmente não revelou nem mesmo seu nome-, executivos do banco privado criado há 140 anos dizem que o antigo aluno da Universidade de Lyon talvez tenha sido afetado por uma tragédia familiar, dois anos atrás, quando começou a trabalhar na função.
"O que é completamente inacreditável é que essa pessoa tenha agido como agiu sem procurar benefícios pessoais", disse uma fonte importante no Société Générale. "Ele não obteve nada com sua trama."
Com o interesse febril da mídia -o nome de Kerviel chegou a ser o 26º mais procurado no Google ontem-, o banco disse não saber onde ele estava.
O operador trapaceiro foi contratado pelo banco em 2000, e em seu melhor ano no banco teve renda de 100 mil, entre salário e bonificação.
Pessoas que trabalhavam com Kerviel dizem que ele parece ter sofrido um abalo com a tragédia familiar e também teria rompido recentemente com sua namorada.


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