São Paulo, domingo, 25 de abril de 2004

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PRESSÃO DE FORA

Choque de preços externos eleva IPCA no 1º trimestre e deve dificultar cumprimento do centro da meta de inflação

Alta das commodities ameaça tarefa do BC

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

O choque dos aumentos de preços das commodities (produtos cotados em dólar no mercado externo) causou estrago na inflação ao consumidor no primeiro trimestre e tornará mais difícil a tarefa do Banco Central de cumprir o centro da meta (5,5%) em 2004.
Segundo dados levantados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) a pedido da Folha, as altas de preços de produtos diretamente influenciados por commodities tiveram um impacto de 0,42 ponto percentual no IPCA acumulado de 1,85% nos três primeiros meses de 2004.
A variação desses itens -que vão de óleo de soja a automóveis- foi maior do que a do IPCA: 4% no ano.
Para o economista do Grupo de Conjuntura da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Carlos Thadeu de Freitas Filho, "o longo e extenso" choque das commodities, que se iniciou no começo do ano, impedirá o cumprimento do centro da meta -há um intervalo de tolerância de 2,5 pontos para cima ou para baixo. A inflação de 2004, prevê, deve ficar entre 6% e 6,5%.
"O BC pode começar a mirar numa inflação maior, considerando que a alta das commodities está durando mais do que se esperava, embora não seja um movimento que atinja de modo generalizado os preços ao consumidor", disse. Mas ele afirma que os repasses do atacado para o varejo "estão contidos", o que permite ao BC manter a política, ainda que gradual, de redução dos juros.
Neste mês, não fosse a pressão dos preços internacionais, o BC poderia ter cortado o juro em 0,5 ponto percentual -mais do que o 0,25 ponto definido-, avalia o economista Ricardo Denadai, da consultoria LCA.
"Por causa das commodities, a previsão de uma inflação de 1,5% no primeiro trimestre não se confirmou", diz o economista Alexandre Sant'Anna, da administradora de recursos ARX Capital. Ele prevê IPCA de 6,3% neste ano.
Apesar de esperarem uma inflação maior do que o centro da meta, os especialistas ouvidos concordam que os repasses para o varejo não são expressivos e que há espaço para o corte de juros.
Sant'Anna ressalta que tal constatação foi feita pelo próprio BC na ata da reunião deste mês. No documento, a autoridade monetária afirma que "deve-se observar que a magnitude e o ritmo de repasses das altas dos preços industriais no atacado para os preços ao consumidor têm se mostrado dentro do esperado".
De acordo com Denadai, a ata revela que o BC irá reduzir mais lentamente os juros do que se previa no final de 2003. Manterá o corte de 0,25 ponto ao mês -hoje, a Selic está em 16% ao ano. Ele afirma que um dos principais motivos para a queda suave é a pressão das commodities.

Repasse monitorado
Para Freitas Filho, a política monetária nada pode fazer para conter os aumentos das commodities, já que os repasses não estão elevados. "O BC não tem culpa dos preços lá fora estarem subindo. O que ele tem de fazer -e está fazendo- é monitorar o nível de repasses, que, por ora, está baixo", disse Freitas Filho.
Na avaliação de Salomão Quadros, coordenador de análises econômicas da FGV (Fundação Getúlio Vargas), que pesquisa a variação dos preços no atacado, os aumentos estão concentrados em poucos produtos que têm um peso grande na inflação.
Para Quadros, não há um quadro de elevação generalizada das commodities a ponto de se espalhar pelos preços ao consumidor. Muitas delas, diz, já até desaceleram -é o caso de celulose, trigo e alguns tipos de metais.
"É um movimento que está ficando cada vez mais localizado, mas, ao menos tempo, mais agudo, com altas maiores e persistentes." Na lista de produtos cujos aumentos resistem em ceder estão a soja e aço.


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