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Índia trava negociações comerciais na OMC
Discussões sobre abertura "começam a andar", mas país asiático se mostra inflexível em relação a mecanismo de salvaguarda
Impasse pode colocar Brasil
e Índia em choque; Amorim
diz que hoje é um dia crucial
para saber se acordo na
Rodada Doha é possível
MARCELO NINIO
DE GENEBRA
A intransigência da Índia
deixou por um fio as negociações da Rodada Doha da OMC
(Organização Mundial do Comércio). Após quatro dias de
intensas negociações, o encontro em Genebra destinado a finalmente fechar as bases de um
acordo global de comércio esteve perto do colapso.
Os esforços para avançar esbarraram na resistência do ministro do Comércio indiano,
Kamal Nath, em fazer concessões. Além de ameaçar a rodada, o impasse pode colocar Brasil e Índia em choque.
O chanceler Celso Amorim
reconheceu que as discussões
estão em um momento "complexo" e disse que hoje será um
dia decisivo para a rodada.
"Amanhã [hoje] vamos ter que
saber se um acordo é possível."
Amorim disse que as discussões continuam em ritmo lento
e que ainda há muitos pontos
de divergência. Fontes próximas às negociações, entretanto, contaram que elas "começaram a andar", com os principais
países envolvidos dando demonstrações de flexibilidade. A
exceção foi a Índia.
Kamal Nath, que ficou ausente dos dois primeiros dias
do encontro para poder acompanhar no Parlamento indiano
a votação de uma moção de
desconfiança que quase derrubou o seu governo, não aceita
fazer concessões nos temas que
lhe são prioritários. Fortalecido pela vitória de seu governo,
voltou com posições duras.
Na proposta agrícola, o maior
entrave é o Mecanismo de Salvaguarda Especial (SSM, na sigla em inglês), que prevê aumentos tarifários no caso de súbitos aumentos de importação
de um produto. A Índia exige
um nível muito alto de tarifa
como remédio, o que sofre resistências abertas dos EUA e
veladas de outros grandes exportadores agrícolas, entre eles
o Brasil e a Argentina.
O impasse coloca em risco a
aliança de Brasil e Índia como
líderes do G20 de países em desenvolvimento, pois passam a
ter posições divergentes na discussão agrícola.
Uma nova proposta sobre o
mecanismo começou a ser negociada, e até a China, que também vinha se mostrando inflexível, começou a ceder. Mas o
representante indiano não se
mexeu. "Ele é o "senhor não'",
ironizou um negociador.
A resistência da Índia levou o
presidente dos EUA, George W.
Bush, a intervir. Ele telefonou
ontem para o primeiro-ministro indiano, Manmohan Singh,
e pediu que coopere.
A reunião de ontem seguiu o
formato reduzido de apenas sete ministros, de Brasil, Índia,
EUA, União Européia, China,
Austrália e Japão. O ministro
indiano chamou a atenção pela
recusa em ceder e por momentos de desdém. Num certo momento do encontro de 35 ministros, Kamal Nath simplesmente passou a ler jornal.
Flexibilidades começaram a
ser demonstradas ontem, embora de forma moderada. Os
europeus mostraram espaço
para aumentar o acesso a seus
mercados agrícolas. Os EUA indicaram que poderão melhorar
a oferta feita na terça-feira, de
fixar o teto de seus subsídios
agrícolas a US$ 15 bilhões
anuais. A representante do Comércio americana, Susan
Schwab, porém, avisou ontem
aos demais ministros que a redução não será significativa.
Tarifas industriais
O Brasil acenou com uma
concessão num dos temas que
têm sido mais insistidos pelos
americanos, a exigência de
acordos setoriais para redução
ou até eliminação de tarifas industriais. O Itamaraty está disposto a "engajar-se" com os
americanos, enquanto tenta fazer com que os acordos sejam
voluntários, como exige a Fiesp
(Federação das Indústrias do
Estado de São Paulo).
O temor é desproteger setores sensíveis da indústria, como
o automotivo e o químico, com
a eliminação de tarifas.
Um outro movimento feito
pelo Brasil foi desistir da exigência do Mercosul de proteger
16% de sua indústria dos cortes
tarifários. O Brasil concordou
que o número baixe para 14%, e
isso poder gerar atrito com outro aliado-chave. A Argentina
insiste nos 16%.
Por outro lado, a diplomacia
brasileira começou a receber
uma contrapartida num dos assuntos que mais lhe interessam, o álcool. Antes refratários
à idéia de aumentar o acesso a
mercado do combustível, europeus e norte-americanos já
aceitam negociar.
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