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Ex-FMI vê perigo de "mexicanização"
CÍNTIA CARDOSO
ENVIADA A CAMPOS DO JORDÃO
O maior perigo que a atual crise
política pode trazer para o país é
fazer o Brasil passar por um processo de "mexicanização". Ou seja, um quadro de estagnação das
reformas necessárias para a modernização da economia. "Eu
acredito que seria um problema
para o Brasil se as reformas que
estão em andamento hoje parassem e se o Brasil seguir o mesmo
caminho que o México. Nos últimos anos, na verdade desde o final dos anos 90, nada acontece no
México. Nenhuma reforma vem
sendo implementada", disse à Folha Kenneth Rogoff.
Ex-diretor do FMI (Fundo Monetário Internacional) e professor
na Universidade Harvard, ele está
no Brasil para participar do Congresso Internacional de Derivativos e Mercado Financeiro organizado pela BM&F em Campos do
Jordão (SP). Leia a seguir entrevista concedida à Folha.
Folha - Quão bem vão os fundamentos da economia brasileira?
Kenneth Rogoff - Há dois fatores
essenciais. Um é a economia global, que tem sido excepcionalmente favorável para o Brasil, os
preços das commodities estão altos, o Brasil tem conseguido diversificar sua pauta exportadora,
a demanda da China e dos EUA
está elevada... Em suma, há combinação favorável de altos preços
de commodities e baixas taxas de
juros globalmente.
Folha - E em relação ao cenário
político brasileiro. Essa crise atual
traz riscos? Os investidores parecem não ter se afastado do Brasil.
Rogoff - O Brasil tem ido muito
bem. O recente ruído político não
tem ainda eclipsado a impressão
geral de que o Brasil está crescendo, que é um dos maiores países
emergentes. Ao lado de China, Índia e Rússia, será uma das maiores forças da próxima década. Sob
a perspectiva exterior, há internacionalmente ainda hoje uma impressão muito boa a respeito da
transição suave que se deu do governo de Fernando Henrique para o governo Lula. Houve uma
continuidade da política macroeconômica do governo anterior e
isso agradou a todos. Quanto à
crise, não estou tão bem informado em relação a todos os rumores
políticos do Brasil atualmente,
mas eu acredito que seria um problema para o Brasil se as reformas
que estão em andamento hoje parassem e se o Brasil seguir o mesmo caminho que o México. Nos
últimos anos, na verdade desde o
final dos anos 90, nada acontece
no México. Nenhuma reforma
vem sendo implementada. A sorte da economia mexicana são as
reservas de petróleo e também esse momento de boom nos preços
do produto. Sem isso e sem o fato
de a economia dos EUA estar se
expandindo, o México não cresceria nem 3%. A longo prazo, essa
é a principal questão para o Brasil:
manter as reformas. É por isso
que a crise política é preocupante.
O Brasil tem que continuar a liberalizar a sua economia, flexibilizar
certos setores, abrir-se para o comércio exterior. Se muitos anos
passarem sem que nenhuma reforma seja feita, as vulnerabilidades da economia brasileira tendem a crescer.
Folha- O que está atravancando
o crescimento brasileiro?
Rogoff - O setor exportador é
muito dinâmico, mas há muitos
setores na economia brasileira
que não o são. Eu vejo uma relação entre o que está acontecendo
no Brasil e o que está se passando
na Europa, a despeito das diferenças entre os dois. Hoje vivemos
uma era de mudanças e é preciso
uma economia capaz de responder a essas mudanças rápidas. No
Brasil, as leis trabalhistas, por
exemplo, ainda fazem difícil o
ambiente para novos investimentos. Mas são situações que podem
ser resolvidas facilmente. Não
precisa esperar 20 anos para isso.
Folha - E qual o peso do atual patamar da taxa de juros no crescimento lento do Brasil?
Rogoff - A taxa real de juros de
uma economia não é definida
apenas por políticas monetárias
do Banco Central. São questões
muito complexas, mas é desencorajador que esteja levando tanto
tempo para haver queda na taxa
de juros e para independência
[oficial] no Banco Central. Mas é
verdade que o Banco Central também tem que lidar com um legado
de 20 anos de hiperinflação e desconfiança e agora tem que tentar
procurar estabelecer credibilidade nos mercados. Por isso acredito que a primeira coisa a ser tentada é o estabelecimento legal da independência do Banco Central.
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