São Paulo, quinta-feira, 25 de setembro de 2008

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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

Como fica o Brasil?


A economia está bastante sólida e deve atravessar a crise razoavelmente bem, mas todo o cuidado é pouco

A CRISE aqui nos Estados Unidos afetará o Brasil? Essa é a pergunta mais importante para nós. Os mercados financeiros brasileiros já estão acusando o golpe, mas a questão é saber se a turbulência contaminará a economia real.
A resposta depende, evidentemente, dos desdobramentos da crise. Há muitas incógnitas. Por exemplo: o resgate de até US$ 700 bilhões será rapidamente aprovado pelo Congresso dos Estados Unidos? E, se aprovado, poderá evitar o colapso do sistema financeiro? Não se pode excluir um cenário-catástrofe, mas parece razoável admitir que o resgate venha a ser aceito sem grande demora pelos parlamentares, ainda que com modificações importantes.
O custo para o contribuinte americano será provavelmente estratosférico. Por isso mesmo, predomina a expectativa de que o plano do secretário do Tesouro norte-americano, Henry Paulson, será capaz de salvar Wall Street. A instabilidade persistirá, não só nos Estados Unidos como em outros países, mas a gigantesca intervenção do Estado deve evitar o pior: a desintegração do sistema financeiro, a exemplo do que ocorreu na década de 1930.
Nesse cenário, o Brasil deve atravessar a crise razoavelmente bem. A economia do país está bastante sólida. No exterior, as avaliações sobre o Brasil continuam positivas.
A maioria dos indicadores parece dar razão a essas avaliações. A economia está em expansão, e os investimentos produtivos cresceram no passado recente. O déficit fiscal é pequeno (apesar da carga de juros) e a dívida pública vem diminuindo como proporção do PIB (Produto Interno Bruto) e da receita tributária. Como o governo é credor líquido em moeda estrangeira, a depreciação cambial ajuda a melhorar as suas contas.
A inflação está aparentemente sob controle. As expectativas de inflação vêm caindo há várias semanas, de acordo com o relatório de mercado publicado pelo Banco Central. Entre os países que adotam o regime de metas, o Brasil é um dos poucos, talvez o único, a manter a inflação abaixo do teto da meta.
Além disso, o sistema financeiro nacional parece seguro. Nunca se sabe com total certeza, posto que a opacidade é a regra nesse terreno. Mas não há evidências de que os bancos brasileiros tenham se envolvido nas aventuras financeiras que vitimaram seus congêneres americanos. Uma razão é que o mercado local, com suas taxas de juro exorbitantes, sempre proporcionou amplas oportunidades de lucro para as instituições brasileiras.
O nosso ponto fraco talvez seja a rápida deterioração do balanço de pagamentos em conta corrente. Essa deterioração se deve em parte à própria crise externa. A remessa de lucros e dividendos para o exterior, por exemplo, aumentou de maneira extraordinária. O Banco Central calcula que ela possa chegar a nada menos que US$ 34 bilhões em 2008. Vários setores, notadamente bancos e montadoras de automóveis, estão remetendo grandes montantes para cobrir resultados negativos em suas matrizes.
O Banco Central projeta um déficit em conta corrente de US$ 33 bilhões em 2009. Com o agravamento da situação financeira mundial, será mais difícil financiá-lo. A instabilidade externa pode levar também a saídas de capitais do país, tensionando o mercado cambial e os mercados financeiros domésticos.
Em resumo, ainda que a posição brasileira seja basicamente forte, todo cuidado é pouco.


PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. , 53, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).

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