São Paulo, sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Agência quer criar cartão-frete para "alforriar" caminhoneiro

Rodrigo Capote/Folha Imagem
O caminhoneiro Antonio Sousa, que reclama da carta-frete

AGNALDO BRITO
DA REPORTAGEM LOCAL

A ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) quer a publicação já em janeiro de medida provisória que cria o cartão-frete no país e muda a relação entre transportadoras e caminhoneiros autônomos. "A medida será a alforria dos autônomos", diz Bernardo Figueiredo, diretor-geral da ANTT.
A criação de um sistema eletrônico para pagamento do frete pode acabar com a chamada carta-frete, instrumento ilegal que aprisiona do ponto de vista econômico a maioria dos caminhoneiros autônomos a regras impostas pelos embarcadores.
Pelo modelo arcaico, os autônomos ficam à mercê de acordos entre transportadoras e postos de serviço, que autorizam os postos a descontar os créditos da carta-frete em gastos com combustível e alimentação ou ainda o recebimento de dinheiro mediante deságios.
A carta-frete geralmente representa custos mais altos para os autônomos. "Com a carta-frete, o óleo do diesel que custa R$ 1,90 por litro passa a R$ 2,20 ou R$ 2,30", diz o autônomo Antônio Vicente de Sousa, 63.
O sistema é ilegal e parte de uma extensa rede de informalidade no transporte de carga, mas é praticado livremente em todo o país. "Já existe lei que torna essa prática irregular, o problema é que não temos mecanismo eficaz para coibir essa prática", diz Figueiredo.
Segundo ele, o cartão-frete será o instrumento pelo qual a ANTT irá monitorar e coibir a prática no país. O mecanismo também pode ajudar a agência a fiscalizar outra prática ilegal: o não pagamento dos pedágios por parte das empresas embarcadoras. Pela lei, os embarcadores são os responsáveis por pagar o custo do frete. Segundo estimativas da ANTT, só 30% dos caminhoneiros do país recebem o vale-pedágio para o custeio dessa despesa. "O que ocorre é que o transportador informa o valor do meu frete, mas inclui ali o valor do pedágio. No fundo, quem está pagando o pedágio é a parte do meu frete", diz Sousa.
Na via Dutra, Sousa diz que recebeu R$ 7.100 pela viagem, o que incluía todos os custos, incluindo pedágios. "O certo seria o transportador me entregar o vale-pedágio separado. Se você reclamar, fica sem carga", diz.
Esse é o maior problema para coibir a prática ilegal. Segundo Norival de Almeida Silva, presidente do Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens do Estado de São Paulo, poucos caminhoneiros denunciam empresas. "Todos temem ficar marcados e sem frete. A situação é cruel, mas é assim que funciona", diz.
Flavio Benatti, presidente da NTC&Logística (associação dos transportadores de carga), reconhece a gravidade da situação. "Lamentavelmente [o uso da carta-frete] ainda ocorre. É algo que precisa acabar no setor, mas infelizmente é algo ainda lento", diz. Segundo ele, parte da solução implicará formalização dos caminhoneiros, o que muitos não desejam. O sistema torna o transporte rodoviário, a principal modalidade para o trânsito de mercadorias do país, um negócio com imenso nível de informalidade.
Segundo a ANTT, o caminhoneiro é o mais atingido. Sem comprovação de renda, que a carta-frete não dá, ele nem sequer pode se habilitar a qualquer linha de financiamento para renovar o caminhão. O que ajuda a explicar por que a idade média da frota autônoma é superior a 20 anos.


Texto Anterior: Arrecadação de pedágio bate recorde em SP
Próximo Texto: Modelo penaliza usuário, dizem empresas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.