São Paulo, sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

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Governo banca 76% do PAC, diz Dilma

Dos R$ 504 bi de investimentos previstos no programa, R$ 384 bi serão bancados com dinheiro público, segundo ministra

Gerente do PAC afirma não ter projeto político, diz que rigor fiscal será mantido e que não haverá "balcão de negociação" do programa

Alan Marques - 22.jan.07/Folha Imagem
A ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil, a "gerente' do PAC


VALDO CRUZ
PEDRO DIAS LEITE

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Dos R$ 503,9 bilhões de investimentos previstos no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), R$ 384 bilhões serão bancados com dinheiro público do Orçamento da União, das estatais federais e de financiamentos de bancos oficiais. "É dinheiro público direto na veia", disse a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), autora do cálculo "conservador" que aponta que 76% dos investimentos virão do governo.
Em entrevista à Folha, Dilma admitiu ajuste nos gastos públicos se o país não crescer 5%. "Ninguém administra um país de olhos vendados", justificou. Mas afirma que, se isso ocorrer, o programa não ficará comprometido. "Dá uma redução da dívida [pública] menor, mas continua consistente."
Gerente do PAC, Dilma disse que o governo não vai transformá-lo num "balcão de negociação". A ministra só admite alguns "ajustes na margem".
Reconhece, porém, que o governo pode negociar com os governadores quando for tratar da prorrogação da CPMF.
Diz que o PAC não significa o fim da era Palocci, mas vê o começo de uma "nova receita". Elogia o ex-ministro da Fazenda e afirma que foi sua política que permitiu a Lula essa "nova receita", sem abrir mão da "robustez fiscal".
Crítica dos juros altos, Dilma não acha que a decisão do Banco Central, de diminuir o ritmo da queda da Selic, possa comprometer o PAC. "O que importa é que [a taxa] mantém a tendência de queda."  

FOLHA - O que a sra. achou da decisão do Copom, criticada por empresários e trabalhadores? Pode influenciar negativamente o PAC?
DILMA
- Não, não concordo. O que acho muito positivo na decisão é mais o sentido dela do que o tamanho. O que importa é que mantém a tendência de queda da taxa de juros. O processo teve continuidade, talvez uma pequena desaceleração.

FOLHA - No governo, havia defensores da redução de 0,50, e não 0,25 ponto percentual.
DILMA
- No mercado também, mas o importante é que está mantida a tendência. Para o PAC, é isso o que importa. Combinado com o crescimento, isso se reflete numa redução consistente do tamanho da dívida pública ante o PIB, além de uma redução muito significativa do déficit nominal.

FOLHA - E uma interrupção da queda prejudicaria o PAC?
DILMA
- Não vejo nada na conjuntura econômica e nas variáveis macroeconômicas que justifique interrupção. O que não podemos deixar de dizer é que, do nosso ponto de vista, não vemos muito motivo para isso.

FOLHA - O ex-ministro José Dirceu pediu ontem a demissão do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. O que a sra. acha disso, vindo de uma pessoa com grande influência no PT?
DILMA
- Eu prefiro não comentar. Não temos uma crise por conta disso [queda de 0,25 ponto nos juros]. Um país precisa ter planejamento estratégico. Ao mesmo tempo, manteremos a robustez fiscal, porque nós não rompemos com nenhum dos preceitos que adotamos desde 2003.

FOLHA - Como a sra. avalia as críticas ao PAC, principalmente dos governadores, insatisfeitos com a escolha das obras e com a perda de receita por conta de desonerações?
DILMA
- Antes do PAC, falei com vários governadores. Achei uma coisa muito curiosa: todos os pleitos coincidiam com o que estava no PAC. Eram os nossos. É muito difícil tamanha dissintonia entre o que é necessário numa região, entre o governo federal e o estadual.
E eu quero crer que, na grande maioria dos Estados, são as obras prioritárias possíveis. Porque são aquelas que são factíveis no curto e no médio prazo. Algumas podem ser importantes, mas terá de ter projeto. Temos recursos escassos.

FOLHA - Pode haver mudanças negociadas com os governadores?
DILMA
- Para ter mudança, algo tem de sair. A hipótese de que está tudo aberto para ser negociado não fecha na realidade. Tenho a orientação clara do governo no sentido de dizer que não estamos abertos a negociações desse tipo. O PAC não é uma lista de obras.

FOLHA - O PAC está ou não fechado a ajustes?
DILMA
- Está fechado a ajustes. A estrutura do PAC tem uma lógica, a de que estamos trabalhando com recursos escassos.
Para incluir qualquer coisa, outra tem de sair. Como acho que sempre é possível um reajuste na margem, não vou dizer que não pode tirar um projeto lá.
Agora, da forma como estava sendo dito, que estava aberto a negociação, não é um balcão de negociação, é um programa. São ajustes muito na margem.

FOLHA - O PAC foi montado num cenário de crescimento de 4,5% neste ano e de 5% nos próximos. Se essas metas não forem atingidas, como fica o plano? O ministro Guido Mantega disse que, se não crescermos 5%, "estaremos perdidos".
FOLHA
- Isso é uma expressão retórica dele. O que eu acho é o seguinte: para nós, é muito melhor que cresça 4,5%, 5% ou até mais, porque vai até sobrar espaço para incluir alguma coisa no PAC. Em qualquer processo de gasto público, você tem a possibilidade de ajustar, ninguém administra um país de olhos vendados. Você administra com ajuste fino.
O PAC não é R$ 67 bilhões de verbas públicas apenas. O governo mobilizou todas as suas instituições financeiras para assegurar uma adequação entre as estruturas de financiamento e as obras.

FOLHA - E isso garante 5% de crescimento em 2008?
DILMA
- Acho que vamos ter efeito direto das medidas, que o Mantega calculava de 0,5 ponto percentual a 1 ponto do PIB.

FOLHA - Mas, se não crescer 5%, as metas fiscais ficam comprometidas?
DILMA
- Não acredito, não compromete. Dá uma redução menor do tamanho da dívida ante o PIB, mas continua sendo consistente. Pode ser de 40%, 42% ou 43% no final do governo, mas o importantíssimo é que vai manter a trajetória de redução da relação dívida/PIB.

FOLHA - Quanto dos R$ 504 bilhões de investimentos previstos no PAC para os quatro anos do segundo mandato é dinheiro novo?
DILMA
- Fiz uma conta, conservadora, que mostra que, nos quatro anos, de dinheiro público, entre orçamento fiscal, estatais e financiamentos de bancos oficiais, dá R$ 383,62 bilhões. União pura, dinheiro público direto na veia. Numa conta conservadora, é no mínimo 76%. É bem mais do que estávamos investindo, antes, no primeiro mandato, tínhamos todas as dificuldades.

FOLHA - Quando vocês lançaram o PAC, disseram que a infra-estrutura é uma das principais prioridades. Então, por que os investimentos no setor não deslancharam no primeiro mandato?
DILMA
- Herdamos uma situação fiscal gravíssima, juros e inflação em alta, e absoluta ausência, inexistência de projetos. Os poucos que pegamos tinham problemas, distorções.

FOLHA - Foi um erro não incluir CPMF e DRU no PAC? Pode aumentar o preço da negociação?
DILMA
- Não. Tem prazo grande para negociar. Às vezes, é melhor negociar em partes. Nem estou sabendo que vai ter negociação com governadores sobre isso agora. Não está na pauta.

FOLHA - O PAC marca o fim da era Palocci?
DILMA
- Não. O Palocci deu uma grande contribuição ao país. No início do governo Lula, o país estava numa situação de absoluto desequilíbrio. Todo mundo apostava que a gente ia desta para melhor. O mérito do Palocci foi ter construído as condições para darmos esse passo. Estranho seria que, hoje, com uma situação melhor, repetíssemos a receita de 2003.

FOLHA - Mas não é o fim de uma era de ajuste fiscal?
DILMA
- Se você me pergunta se transformamos a realidade, sim. O que fizemos de 2003 a 2006 permite que a realidade de 2007 seja radicalmente diferente da de 2003. Nós não estamos mudando a política econômica, estamos mudando é a realidade. Nós superamos uma fase que nos permite adotar uma nova receita.

FOLHA - É a era Dilma agora?
DILMA
- Isso é uma tentativa de diminuir o PAC. Ele não é um produto de uma pessoa, mas de um governo, uma obra coletiva, uma obra do governo.

FOLHA - O presidente Lula pode tentar um terceiro mandato?
DILMA
- Está fora de cogitação.

FOLHA - O governo pode reduzir o superávit abaixo de 3,75%?
DILMA
- De jeito nenhum.

FOLHA - A parte fiscal do PAC não foi muito tímida?
DILMA
- Não.


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