São Paulo, domingo, 26 de março de 2006

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DESIGUALDADE

Para Ipea, que realizou estudo, vínculo mais frágil com empresas pode explicar tempo maior para subir na carreira

Mulher espera 35% a mais por promoção

MAELI PRADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Se um recém-formado com nível universitário leva 6,5 anos, por exemplo, para ser promovido a gerente ou diretor, uma mulher nas mesmas condições sobe de patamar em dez anos. Ou seja, para elas, o salto na carreira demora 35% a mais, mostra estudo que analisou a evolução profissional de administradores, contadores, chefes de seção, economistas, engenheiros e supervisores dentro de grandes empresas.
O mesmo levantamento, que foi realizado pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), órgão ligado ao Ministério do Planejamento, conclui que a tendência é que essa diferença, apesar de existir, não é tão grande nas empresas de capital estrangeiro. Uma explicação possível é que essas companhias seriam mais eficientes -uma eventual discriminação poderia levar à ineficiência.
É a primeira vez no Brasil que um pesquisador calcula as diferenças de tempo para promoção de homens e mulheres nas grandes empresas. Para chegar a esse dado, o economista Danilo Coelho tomou como base informações de 1996 a 2004 da Rais (Relação Anual de Informações Sociais), uma espécie de censo anual do mercado de trabalho formal do Ministério do Trabalho.
De acordo com ele, a promoção mais lenta das mulheres, seja nas empresas de capital nacional ou estrangeiro, não é explicada somente por preconceito dos empregadores.
"Pode ser discriminação, mas pode ser também que as mulheres tenham um vínculo mais frágil com as empresas. Elas podem ter alternativas mais atraentes que os homens fora do mercado de trabalho, como ter filhos."

Licença-maternidade
A professora do Ibmec São Paulo Regina Madalozzo, especializada em economia do trabalho, aponta na mesma direção. "A coisa mais óbvia que a gente pode imaginar é que o fato de as mulheres deixarem de trabalhar para tirar licença-maternidade de quatro meses já explica parte do tempo a mais que elas levam para serem promovidas. São pelo menos quatro meses a mais."
O nível educacional, lembram especialistas, não pode ser a razão para uma ascensão mais lenta das mulheres, já que elas, em média, são mais escolarizadas do que os homens. "Esses números podem refletir uma procura das empresas por custos mais baixos", diz a economista Anita Kon, da PUC-SP. "Quando as mulheres têm filhos, saem e uma pessoa tem que ser contratada para substituí-las."
Dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio), do IBGE, mostram os efeitos da ascensão mais lenta das mulheres dentro das grandes empresas brasileiras de transformação: elas representam atualmente apenas 14% dos cargos de comando, como gerência e direção.
De qualquer forma, o quadro é melhor do que o de anos atrás: em 1996, por exemplo, as mulheres representavam 22% do total de empregados nessas indústrias e somente 8% dos cargos de comando (leia texto abaixo).

Indústria de transformação
O economista tomou como base, para realizar o estudo, os trabalhadores da indústria de transformação (aquela que agrega valor ao produto, como vestuário, calçados, eletroeletrônicos, alimentícia, entre outras).
Os funcionários pesquisados foram os que exerciam cargos de administrador, contador, chefe de seção, economista, engenheiro, supervisor de vendas e supervisor de compras de 1996 a 2004.
Apurou-se, por meio dos dados fornecidos pelas empresas ao Ministério do Trabalho, quanto tempo homens e mulheres nesses cargos levaram para ser promovidos a gerente ou diretor.
O pesquisador selecionou apenas quem tinha entre 20 e 26 anos quando entrou na empresa e curso superior completo.
Coelho chegou a dois resultados diferentes sobre o tempo adicional que a mulher leva para ser promovida em relação ao homem. O primeiro, que apontou uma diferença de 35%, é mais representativo, já que leva em conta toda a amostra.
O segundo cálculo feito pelo pesquisador exclui o efeito que a profissão em si pode ter sobre uma promoção (engenheiros, por exemplo, são promovidos mais rapidamente do que advogados, e a proporção de homens engenheiros é maior).
Nesse caso, o resultado também é desfavorável para as mulheres: elas levariam 23% a mais de tempo para serem promovidas do que os homens, em média.
Mas esse cálculo não é tão representativo, já que, para fazê-lo, o pesquisador teve de retirar da base pesquisada aqueles funcionários cuja posição na empresa antes do período analisado por ele (com início em 2006) é desconhecida. Isso reduz o universo pesquisado e contamina a amostra, pois retira exatamente os funcionários que foram promovidos mais rapidamente (a maioria homens, que já eram gerentes ou diretores em 2006 e dos quais se desconhece o cargo anterior).
Esses funcionários cuja posição anterior se ignorava foram retirados porque, sem essa informação, não era possível calcular o efeito do cargo que exerciam sobre a promoção que tiveram.

Mais gente, promoção tardia
Além da comparação do tempo até a promoção entre homens e mulheres, outra conclusão do estudo foi que contratações podem retardar promoções, de homens ou mulheres, dentro de uma empresa: a cada 1% de mais funcionários, o tempo de emprego até uma promoção sobe 6,7%. "Isso ocorre porque a quantidade de cargos de gerência e direção em uma empresa cresce menos, proporcionalmente, do que o número de empregados", diz Coelho.
Os números apontam ainda em quais cargos os funcionários, de qualquer sexo, têm mais chance de promoção: em primeiro lugar, aparece o chefe de seção, e, em seguida, os supervisores.
Em terceiro, vêm os engenheiros, que levam 29% a menos de tempo para serem promovidos do que advogados, economistas, administradores e contadores. O estudo do Ipea mostra ainda que, na região Sudeste, a competição por promoções é mais acirrada: os trabalhadores de indústria de transformação da região levam, em média, 12% a mais de tem- po para subir de posição.


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