São Paulo, sábado, 26 de maio de 2007

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Corrupção afeta grau de investimento

Agências de risco acompanham denúncias, mas ainda não vêem sinais preocupantes nos escândalos em curso no país

Preocupação maior é com efeito paralisante de uma grande crise que possa ameaçar reformas e atual política econômica


TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

A economia brasileira vai bem, e isso sensibiliza as agências de classificação de risco, mas escândalos de corrupção -como o da Operação Navalha e o do mensalão- que de tempos em tempos despontam no cenário político podem atrasar a ambição brasileira de obter o grau de investimento, selo de qualidade de bom pagador que abriria o país para a entrada de dinheiro farto e barato para financiar seu crescimento.
Estudo do Ibmec-SP desenvolvido pelo professor José Luiz Rossi, obtido pela Folha, mostra que, além das variáveis econômicas, as agências de classificação de risco estão de olho em fatores como percepção de corrupção, respeito a liberdades individuais, fragilidade no marco regulatório, indústria de liminares e mesmo a formação educacional deficiente-variáveis que podem limitar o crescimento do país.
"Todos olhavam apenas para as contas externas, então fui pesquisar outras variáveis que indiquem o grau de respeito às regras do jogo. E as conclusões são que o lado externo continua sendo o mais importante, mas outros fatores também pesam. E eles mudam ao longo do tempo", disse Rossi.
Segundo o estudo, as agências Moody's e Fitch avaliam a qualidade das agências reguladoras, enquanto a Standard & Poor's considera o grau de corrupção do país uma variável importante na determinação de uma nota. Já a variável relativa a "voz e transparência", indicador de respeito a liberdades individuais, é significativa para a Moody's e para a S&P.
Rossi fez um levantamento minucioso da atuação das agências de classificação de risco Moody's, S&P e Fitch, todas dos EUA, de 1997 a 2004. Concluiu que não há um comportamento único e que o peso de algumas variáveis mudam ao longo do tempo. De acordo com o estudo, a expectativa é que o Brasil obtenha o grau de investimento a partir de 2008.
Segundo Rossi, as agências estão mais preocupadas com a instabilidade que os escândalos podem trazer ao país. "Escândalos geram instabilidade que atrapalham o andamento das reformas. Se aumentar a probabilidade de o país eleger um populista, que coloque em dúvida o pagamento da dívida, vai preocupar as agências", disse.
Mauro Leos, analista sênior da Moody's, admite que a agência acompanha com atenção os desdobramentos dos escândalos de corrupção, como a Operação Navalha. Ele afirma, no entanto, que os escândalos mais recentes não foram capazes de alterar a condução da política economia, nem quando Antonio Palocci deixou o comando da Fazenda.
"É importante acompanharmos os escândalos, mas eles só preocupam à medida que os custos políticos impliquem romper com as regras de pagamento. Os escândalos não têm sido fatores determinantes na capacidade de pagamento do Brasil. Apesar dos escândalos, o país continuou cumprindo suas metas fiscais", disse.
Rafael Guedes, analista da Fitch, afirma que a crise política só preocupa quando causa uma paralisia no governo e no Congresso, o que ainda não acontece. Lisa Schineller, analista da Standard & Poor"s, afirma que a Operação Navalha só terá impacto sobre a classificação do Brasil caso venha a prejudicar as políticas do governo.
"Se algum caso de corrupção tem impacto na política do governo, pode ter impacto [na classificação do país], mas não diretamente", disse ela.
Fabio Akira, economista do JP Morgan, concorda que escândalos de corrupção podem limitar a avaliação do país se afetar sua capacidade de pagamento. Mesmo assim, afirma que o lado político pode ser contrabalanceado se o país tiver condições excepcionais de crescimento ou criar condições favoráveis para diminuir seus gastos, como por meio de reformas estruturais. "O canal de contaminação é quando a questão política impede o avanço das reformas", disse.
Para Sérgio Werlang, diretor do Itaú e ex-diretor do Banco Central, escândalos políticos não devem atrasar o grau de investimento. "Pode afetar perto de uma eleição, se houver um candidato com chances de vencer, que não deixe claro como será sua política econômica."

História
A pesquisa mostra que mais de 60% dos países com grau especulativo, como o Brasil, estão ou já estiveram em situação de "default". "Países com melhor qualidade de regulação apresentam uma melhor classificação de risco. Isso acontece porque a variável sinaliza o grau de respeito às regras de mercado e é um indicador de como a sociedade aceita rupturas", disse Rossi.
O modelo que Rossi elaborou para entender a concessão do grau de investimento foi testado com o Brasil. Ele concluiu que o país está no caminho de obter a aguardada chancela.


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