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LUÍS NASSIF
A madura idade
Recebo a seguinte carta de
Gustavo Franco, 15 anos
mais velho que o templário da
PUC, dez anos mais velho que o
economista do Real:
"Escrevo para lhe agradecer
pela crônica de domingo, "O último guerreiro de Vargas", a
propósito de Guilherme Arinos,
meu pai".
"Meu pai é um homem extraordinário e que jamais se
preocupou e mesmo evitou a
notoriedade ou o reconhecimento, jamais quis se apropriar
do legado do "Velho Getúlio" ou
retirar qualquer espécie de vantagem do relacionamento privilegiado que tiveram. Sobre meu
pai, Helio Fernandes disse, certa vez, que "foi o único que serviu a Vargas sem dele se servir"."
"Meu pai tampouco fez alarde de qualquer de suas contribuições pessoais ao "legado" do
Velho, pois a ele nunca importou a autoria, mas a contribuição em si, e principalmente o
projeto maior. Grande lição, essa. A ele sempre importou, mais
que tudo, o desejo de servir ao
Brasil, ao próximo, ao menos
favorecido, sem contrapartida,
e foi isso o que fez a vida toda,
como homem público, como
empresário bem-sucedido e em
suas inacreditavelmente múltiplas atividades de benemerência."
"Arinos é sempre lembrado
nos aniversários da fundação
do BNDES (hoje é único remanescente da primeira diretoria)
e, em 1983, durante a cerimônia, teve o prazer de ver seu único filho vencer o prestigioso
concurso anual de teses de mestrado com uma monografia sobre os primeiros anos da República, que tem sido objeto da várias crônicas suas nas últimas
semanas."
"Mais tarde, Arinos viu seu filho ir para o mesmo Ministério
da Fazenda em que serviu mais
de 40 anos antes e depois para o
Banco Central, que, em sua
época de funcionário do Banco
do Brasil, era apenas um plano.
Arinos viu sua família crescer e
o Brasil se transformar e assim
adquiriu mais clara a consciência de seu tempo, da passagem
do tempo e do significado do
tempo. Apenas os homens realmente extraordinários, e que
têm a benção de viver tão intensamente durante tanto tempo,
adquirem essa perspectiva sobre o que é realmente importante na vida."
"Arinos jamais discutiu comigo sobre os rumos do Real, nem
mesmo quando interpelou diretamente o presidente Fernando
Henrique quando este declarou
que poria fim à Era Vargas. Era
apenas uma frase de efeito,
FHC disse-lhe pessoalmente, e
ele, no fundo, sabia, tanto que
Arinos continuou PSDB de carteirinha, membro do diretório
carioca."
"Arinos nunca viu contradição entre os imperativos de política econômica dos anos recentes e as conquistas da Era
Vargas. A poeira do tempo, ele
bem sabe, é fundamental para
eliminar as emoções, a espuma
e a verborragia sempre a turvar
o que é verdadeiramente importante e duradouro nas querelas sobre política econômica.
As lições e o legado do "Velho
Getúlio", para mim, sempre estiveram misturados com as lições
de meu próprio pai. Se eu estava
em sintonia com ele, como dizer
que estava atacando o legado
que ele preservava?"
"Arinos já viu de tudo. Sabe
que existem muitas maneiras
de servir ao Brasil, muitas formas sinceras de nacionalismo e
que existem muitas fórmulas
diferentes para "um grande homem". E sabe que esses cânones
mudam com o tempo. Todas essas fórmulas, contudo, devem
caber dentro dos ideais de generosidade e desprendimento que
aprendi em casa, com ele, e que
pareciam vir, por transitividade, do "Velho Getúlio". Não são
ideais diferentes dos que vi em
FHC, com todas as variações de
personalidade e circunstância,
ou dos que vislumbro, onde é
possível enxergar, no presidente
Lula. Felizmente, o Brasil tem
muitos grandes homens, muitos
dos quais pensam como nós, e
muitos outros discordam de cada palavra. E viva a diferença."
"O que importa, e nos une ao
fim das contas, é a lealdade às
nossas idéias, a honestidade intelectual e o desejo de servir ao
Brasil, sem nada em troca, e freqüentemente apenas com os
ônus provocados pelos descontentes e ressentidos ou apenas
com a incompreensão e indiferença até mesmo dos beneficiados."
"Aceite um abraço muito especial."
"Gustavo H. B. Franco."
E-mail - Luisnassif@uol.com.br
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