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ARTIGO
Sem medo de sermos felizes!
ALBERTO GOLDMAN
A discussão, pela imprensa, de
uma matéria importante para o
país objetiva colocar o leitor a par
das diversas concepções que estão
se confrontando, para que ele possa tirar suas próprias conclusões.
Para isso, é preciso que os expositores dos diversos pontos de vista, em primeiro lugar, respeitem-se mutuamente. Em segundo
lugar, que haja absoluta honestidade intelectual, para não se desvirtuarem nem os fatos nem os
conceitos daquele que está sendo
contestado, apresentando-o como
autor ou defensor de teses impopulares, com a finalidade de trazer
para o "acusador" a simpatia do
leitor e, com isso, desqualificar o
oponente.
Infelizmente, o deputado Walter
Pinheiro (PT-BA), em artigo na
Folha (11/8), ao abordar a Lei Geral de Telecomunicações aprovada
pelo Congresso, da qual fui relator, não mostra respeito pelas pessoas que não pensam como ele,
muito menos pelos 312 deputados
que aprovaram o projeto, derrotando os 90 que o rejeitaram, em
um resultado dos mais expressivos
dos últimos anos em matéria complexa e polêmica. E, mais grave
ainda, distorceu, deliberadamente, com má-fé, o que a nova lei significa.
É preciso esclarecer que a oposição defendia manter o sistema Telebrás como estatal, atuando em
todo o país, e admitia apenas que
novas concessões, privadas, pudessem, em diversas áreas do país,
concorrer com a estatal.
A proposta da oposição, por paradoxal que possa parecer, ao invés de garantir a existência da Telebrás estatal, levaria-a à destruição. Pois a Telebrás, com a obrigação de manter a rede básica (ela é
uma só) disponível para o acesso
das demais empresas privadas
-que, certamente, vão buscar os
"nichos" mais lucrativos-, submetida aos controles estatais (controles internos, Tribunal de Contas, Lei de Licitações), aos padrões
salariais das empresas públicas e
aos interesses políticos governamentais que impedem um gerenciamento eficaz e a longo prazo,
estaria fadada ao fracasso.
Mais adiante, quando tivéssemos de privatizá-la, estaria com
seu valor depreciado. A maior
prova do que dizemos é o início
das concessões da banda B do serviço celular: as primeiras licitações
obrigaram a Telebrás a baixar preços, sob pena da perda da clientela.
E isso significa menor faturamento, menor lucratividade e, portanto, menor valor da empresa.
Diferentemente do modelo no
setor de petróleo que produzimos
no Congresso (presidi a comissão
especial que deu parecer sobre a
matéria), no qual a Petrobrás é
mantida como estatal pelo fato de
que apenas nos prazos médio e
longo se poderá criar um mercado
competitivo, no setor de telecomunicações, quanto mais cedo se
implantar a ampla competição,
privada versus privada, melhor resultado teremos para o patrimônio nacional e para o atendimento
às necessidades que o país tem de
um serviço amplo e eficiente.
Por um certo tempo, em algumas áreas, ainda teremos a situação de monopólio privado, pois
não se imagina que em todas, ao
mesmo tempo, a competição se
instale. Por isso o papel da Anatel
(Agência Nacional de Telecomunicações) de controle de tarifas,
qualidade e nível de atendimento.
Melhor que a situação atual, em
que quem controla a Telebrás estatal é ela mesma, confundindo-se
o concessionário com o poder
concedente.
Para garantir a competição, a lei
é clara: imediatamente após a privatização, abrir-se-ão as áreas de
concessão para o setor privado.
Contudo a distorção mais grave
na desinformação trazida pelo
ilustre deputado é quanto à questão da universalização das telecomunicações, que é, ao lado da garantia da existência da competição
e do controle do poder econômico, a alma da lei.
Ela tem um capítulo específico
que trata da questão. E diz que a
agência regulará as obrigações de
universalização atribuídas às prestadoras de serviços, que são definidas como as que objetivam possibilitar o acesso de qualquer pessoa ou instituição de serviço público aos serviços, independentemente de sua localização e condição socioeconômica (artigo 79).
Essas obrigações serão objeto de
metas periódicas, conforme plano
específico elaborado pela agência
após consulta pública e aprovado
pelo Poder Executivo, detalhando
as fontes de financiamento (artigo
80).
A universalização será concretizada, em primeiro lugar, por meio
dos contratos de concessão, provenientes das licitações públicas,
nas quais os concorrentes, em função das obrigações determinadas,
ofertarão o valor da outorga da
concessão e as tarifas a serem cobradas.
Apenas e tão-somente para cobrir custos atribuíveis ao cumprimento das obrigações de universalização que não façam parte do
contrato de concessão e que não
possam ser recuperados com a exploração eficiente do serviço, poderão ser destinados recursos
complementares (artigos 80 e 81)
oriundos do Orçamento da União,
dos Estados e dos municípios ou
do Fundo de Universalização das
Telecomunicações -que será
constituído com recursos das próprias outorgas, objeto de projeto
de lei que deverá ser encaminhado
em 120 dias ao Congresso.
Os recursos públicos, assim, só
serão destinados a ampliar obrigações não previstas nos contratos
de concessão e dependerão das decisões políticas próprias de cada
nível de governo, inclusive de seus
Poderes Legislativos.
Atualmente, o Brasil tem menos
de dez telefones por cem habitantes, média entre 50 telefones por
cem habitantes nas áreas mais ricas e zero telefone por cem habitantes em extensas áreas populacionais pobres. 90% dos telefones
instalados estão em residências de
famílias com renda superior a R$
1.000,00.
Essa é a situação a que as forças
do atraso nos levaram, e é nessa
que pretendem que fiquemos. Vamos atacá-la e superá-la, sem medo de sermos felizes.
Alberto Goldman, 59, é deputado federal pelo
PMDB de São Paulo. Foi ministro dos Transportes (governo Itamar Franco) e secretário da Administração do Estado de São Paulo (governo
Quércia).
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