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São Paulo, terça-feira, 26 de agosto de 2003

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LUÍS NASSIF

Superávit e balança

Uma conspiração entre a indústria farmacêutica e a psiquiátrica, especialmente nos Estados Unidos, originou um processo nefasto, com reflexos no Brasil. Um analista qualquer, de preferência de mente inquieta, junta um conjunto de sintomas, alguns presentes até em pessoas "normais", e cria um estereótipo, uma "doença" -que, obviamente, além de permitir escrever best-sellers, abre espaço para um novo medicamento específico.
Algo similar ocorre com essa marketinização das idéias econômicas. Há um conjunto de ferramentas com as quais se constroem políticas econômicas. A arte da política consiste em recorrer pragmaticamente a cada uma delas, utilizando-as de acordo com as circunstâncias e na dosagem correta.
Na discussão econômica brasileira atual, nessa simplificação criada pelos "cabeças de planilha", tudo é estereotipado. Um caso clássico é essa idéia de que o que importa para a estabilização da economia é o tamanho do comércio exterior, não necessariamente o do superávit comercial.
De acordo com essa visão, até para exportar mais o país precisa de importações -vide exemplo da Embraer. Ora, esse argumento -largamente repetido nos últimos dias- só é adequado para rebater propostas de controle administrativo das importações. Do jeito que vem sendo brandido, causa a impressão de que todos aqueles que são a favor do aumento do superávit comercial são contra o crescimento das importações. É justamente o contrário.
Desde os anos 50, todo processo de retomada do crescimento esbarrou no estrangulamento externo. O que se tem hoje é um equilíbrio nas contas externas fundado em rescaldo de uma desvalorização cambial -que está sendo perdida- e em recessão. Em um quadro de crescimento, haverá muito maior pressão sobre as importações, especialmente se houver necessidade de novos investimentos. Garantir superávits comerciais, portanto, é medida prudencial para preparar o terreno para que, na hipótese de retomada dos investimentos, haja espaço para importar mais.
Nesse quadro se insere também a questão da substituição das importações. Para a nova etapa de desenvolvimento, o país necessitará de investimentos em áreas de ponta. A substituição de importações se dá em áreas tradicionais, nas quais o país já tenha capacitação. Por isso, ao se substituírem importações nessas áreas, se estará abrindo espaço para a importação de novas tecnologias.

Vinculação de receita
Uma das "verdades" repetidas a torto e a direito pelos "cabeças de planilha" é a idéia de que a crise brasileira é decorrência da vinculação orçamentária -que destina obrigatoriamente recursos para determinadas áreas, como saúde e educação.
Estudos de especialistas em "focalização" da Faculdade de Administração e Economia da USP constataram que o único indicador brasileiro que melhorou sensivelmente na última década foi o ensino básico. Motivo: a vinculação orçamentária, criada pela Constituição de 1988, e o Fundef, que municipalizou o ensino básico. Não fosse isso, esse dinheiro teria ido pelo ralo, assim como foram todos os recursos da privatização.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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