São Paulo, quarta-feira, 26 de agosto de 2009

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VINICIUS TORRES FREIRE

Odor de santidade


Para oposição, Lina passou de "sindicalista" a "mártir'; para o governo, de "fiscal do grande capital" a "inepta ressentida"

NÃO FAZ MUITO tempo, Lina Vieira era a madrinha do assalto da "república sindicalista" aos postos-chave da Receita Federal. O tucanismo, na política e na mídia, e a oposição em geral estrilavam contra Lina, capataz de mais uma onda de "politização de um órgão técnico" no governo Lula.
"Meses depois...", como dizem aqueles letreiros de novela, Lina largou uma casca de banana no meio do caminho de Dilma Rousseff, que nela pisou e escorregou, afoita e esbaforida na manhã ainda de sua caminhada planaltina -para o Planalto. Então, a mesma torcida que espinafrava a ex-secretária da Receita faz dela uma espécie de mártir do serviço público, demitida em prejuízo do rigor tributário, pois Lina teria caído por multar demais grandes empresas e contrariar outros interesses, dentro e fora do governo.
Para o governo e o governismo, a nomeação de Lina representava, enfim, a mudança de um "esquema viciado" de poder, que predominaria na Receita Federal desde FHC. Agora, a ex-secretária da Receita não passa de uma inepta que não soube tocar as reformas pautadas pelo governo, que trocou as mãos pelos pés ao lidar com os casos da família Sarney e da Petrobras (empresa que "devemos amar", diz o governo), que cai atirando contra a premiê de Lula por ser uma tresloucada ressentida.
Mas não se sabe quase nada do que se passou na gestão Lina Vieira.
Não é possível, por ora, dizer que aquele banco, aquela montadora e aquela siderúrgica, supostamente multadas ou contrariadas pela Receita, tiveram algum papel na queda de Lina. Não se conhecem bem os lados e os motivos do tiroteio interno da Receita, que tem quase tantos partidos como a Polícia Federal.
Se o Congresso não fosse esse contubérnio de desclassificados ou, quando muito, de promotores da chacrinha politiqueira, poderíamos vir a saber algo. Mas a oposição, na falta de programa de oposição ao lulismo, tira apenas casquinhas de banana da infinita capacidade do lulismo de malversar a República.
Sabe-se apenas e mais uma vez que o indo e vindo da cara-de-pau de oposição e governo é infinito. Depois da transmutação da imagem de Lina, sobreveio a da senadora Marina Silva que, de "santa verde", "indiazinha", madrinha do boitatá, do curupira e defensora do reacionarismo ambiental, entre outros insultos (de governo e oposição, do DEM em especial), tornou-se "santa ética" e, por contraste, imagem viva da podreira política do PT, para alegria hipócrita da maioria da oposição.
Oposição que acordou apenas ontem, a seis dias da festa do pré-sal de Lula, para a necessidade de submeter a mudança das leis do petróleo a debates públicos, leis que o governo Lula quer aprovar com urgência suspeitíssima. Mas o que esperar de uma oposição, PSDB, DEM e cia., que fala contra a "gastança" de Lula e aprova todos os aumento de gastos com servidores propostos pelo lulismo? Que aprova sem piar o desbaratamento da reforma previdenciária de FHC (votando a indexação das aposentadorias do INSS etc.)? Que faz biquinho contra o estatismo e aprova o aumento da dívida pública a fim de dar fundos ao BNDES? Que faz lobby para que o BNDES ajude empresas amigas trumbicadas ou em processo "fusões & aquisições"?

vinit@uol.com.br


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