|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Gasto com dívida segura investimentos
Para consultoria Economática, metade das empresas corre risco de registrar prejuízo por causa das despesas financeiras
Previsão ainda não leva
em conta as perdas nas operações de derivativos que empresas estão tendo após a disparada do dólar
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
As empresas brasileiras com
ações em Bolsa devem destinar
cerca de 70% de seus ganhos
para cobrir despesas financeiras com juros e variação cambial no terceiro trimestre deste
ano, segundo projeção da consultoria Economática.
Isso significa que essas empresas terão menos dinheiro e
propensão para investir nos
próximos meses. Tenderão a
cortar custos e despesas, comprometendo ainda mais o crescimento da economia.
No estudo, a consultoria percebeu uma relação bastante estreita da evolução das despesas
financeiras das empresas abertas com a variação do dólar pela
Ptax, a média do Banco Central
para ajuste de contratos na
BM&F (Bolsa de Mercadorias
& Futuros). O grosso das despesas financeiras refere-se ao
pagamento de juros das dívidas, deduzindo a variação cambial e eventuais saldos com
aplicações financeiras.
Com a alta de 20% da moeda
americana no terceiro trimestre, a expectativa é que as despesas com juros e câmbio batam facilmente em R$ 17,067
bilhões, montante que deve
consumir 71% do lucro operacional (da ordem de R$ 24 bilhões) das empresas abertas. O
lucro operacional é o ganho obtido na atividade-fim da empresa, antes do pagamento de
tributos, juros e dos dividendos
aos acionistas.
"Se essa previsão se confirmar, vai ser um desastre. Para
metade das empresas, o pagamento das despesas financeiras
vai levar ao prejuízo. Teremos
uma maré vermelha nos balanços do terceiro trimestre. E não
falamos até agora do avanço
das aventuras com derivativos.
Nossas projeções foram feitas
com base nos últimos trimestres, quando essas aventuras
ainda eram menores", disse
Fernando Exel, presidente da
Economática, que já vê essa
tendência nos primeiros balanços divulgados.
A Economática analisou dados de 241 empresas, excluindo
Vale e Petrobras, nos últimos
nove trimestres. Também considerou que as empresas mantenham o mesmo comportamento de rolagem de dívida e de exposição cambial.
O comportamento do câmbio, que, com o fortalecimento
do real, reduzia o custo da dívida das empresas, chegando até
a zerá-lo no ano passado, agora
tem efeito contrário, turbinando o endividamento.
No segundo trimestre de
2007, quando o dólar desabou
6,06%, as empresas pesquisadas tiveram ganho financeiro
-entenda-se com o câmbio-
de R$ 5,551 bilhões, capaz de
praticamente zerar as despesas
de R$ 5,577 bilhões, a maior
parte com juros.
No segundo trimestre deste
ano, os ganhos com câmbio foram mais do que suficientes para pagar juros da dívida e ainda
sobrou R$ 1,643 bilhão -no caso, tiveram despesa financeira
líquida negativa- para compor
o lucro dessas empresas. Agora,
a situação se inverteu.
"As empresas estão acostumadas com resultado financeiro menor do que o gasto com os
juros. Tinha o pagamento do
juro, mas havia um alívio pelo
câmbio, que era cadente. Em
junho, houve ganho. De repente, elas vão se deparar com uma
despesa de R$ 17 bilhões. O lucro operacional inteiro vai para
o ralo. Não vai sobrar nada para
o governo nem para o acionista.
Não é o fim do mundo, mas é
um trimestre inteiro perdido",
disse Exel.
Incertezas
O comprometimento do caixa das empresas com essas despesas agrava ainda mais o quadro de grandes incertezas e baixa confiança dos empresários
por causa da crise econômica.
"Essa incerteza em relação às
perdas cambiais das empresas
será um suspense até a divulgação de todos os balanços do terceiro trimestre, em meados de
novembro. A incerteza é tão
grande que nem os US$ 50 bilhões do governo [para evitar a
disparada do dólar] mudou o
cenário do câmbio no curto
prazo. Vai continuar preocupante, vai afetar a inflação e, no
limite, vai fazer com que a Selic
[taxa básica de juros] fique
mais tempo elevada, por conta
dos riscos inflacionários. Já a
certeza em relação à atividade
mais fraca existe e é concreta",
disse Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados.
Para Exel, a situação só não é
mais preocupante porque a
maioria das empresas prejudicadas pelo endividamento em
moeda estrangeira terá mais
receitas com as exportações.
"O impacto [cambial] que vai
ter nas receitas das empresas é
outra história. Se o dólar estacionar aí, as receitas também
serão maiores. Insolvência total não teremos. Ninguém vai
ter problema de caixa por causa
da variação cambial na dívida.
Isso é administrado, aconteceu
em 1999 e em 2002. Agora, se o
dólar cair, isso tudo se reverte.
Nesse caso, vai aparecer, de novo, um superganho financeiro",
disse Exel.
Segundo Fabio da Paz, especialista em câmbio do Ibmec-SP, as empresas com receita em
dólar foram as que mais se endividaram em moeda estrangeira, e agora devem se beneficiar com o dólar valorizado.
"Ninguém esperava essa variação em tão pouco tempo. Mas,
quando o dólar se valoriza, é favorável também para melhorar
as exportações. Só que o mundo fala em recessão [nos Estados Unidos e na Europa] e a expectativa de faturamento dos
exportadores está sendo revisada para baixo", disse.
Texto Anterior: Mercado Aberto Próximo Texto: Frase Índice
|