São Paulo, domingo, 26 de outubro de 2008

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ENTREVISTA

ANTÔNIO FRANCISCO DE LIMA NETO

Em hipótese alguma o Banco do Brasil vai comprar "mico"

Presidente do BB afirma que o banco analisará ofertas de compra apenas quando o negócio for considerado saudável

Sérgio Lima/Folha Imagem
Antônio Francisco de Lima Neto, presidente do Banco do Brasil


SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Prevendo uma "nova onda de fusões e aquisições" diante da crise que assola a área financeira no Brasil e no mundo, o presidente do Banco do Brasil, Antônio Francisco de Lima Neto, defende a edição da medida provisória nº 443 -que deu ao BB e à Caixa Econômica Federal poderes para comprar bancos e empresas- como um instrumento necessário para não deixar a instituição fragilizada em relação à concorrência.
Ele afirmou, em entrevista à Folha, que o foco inicial do Banco do Brasil é a área de veículos, com ênfase no consumo final. Na semana passada, a instituição comprou mais de R$ 1 bilhão em carteiras de financiamento de veículos.
Declarações do presidente Lula sobre a atuação do Banco do Brasil nesse setor reforçaram os boatos de que a instituição estaria adquirindo bancos ligados a montadoras. Cauteloso, Lima Neto evita se comprometer com operações específicas. "Se vamos comprar ou não, o tempo dirá."
Segundo ele, a decisão de avançar na negociação das carteiras para instituições é uma questão de oportunidade e de afinidade com o banco. "Só vamos avaliar [ofertas] que considerarmos saudáveis. Instituições que tenham tecnologia boa, administração de risco e força de venda."
Lima Neto não deixa transparecer a tensão e o cansaço que têm predominado nas mais de 12 horas diárias de trabalho. Nega que esteja sendo pressionado pelo governo e que fará maus negócios. "Em hipótese alguma compraremos micos.
Temos boa governança".
Ele diz que o mercado não entendeu a medida provisória.
"A leitura inicial da MP pode ter levado a uma interpretação errada de que ela é para entubar o Banco do Brasil com mico. Não é isso. A idéia é fazer uma ação preventiva."

 

FOLHA - O que muda na atuação do BB com a MP 443?
ANTÔNIO FRANCISCO DE LIMA NETO
- A medida provisória dá um instrumento a mais para levar adiante a estratégia que tínhamos de crescer não apenas organicamente. Nos possibilita fazer aquisições. Queremos crescer levando em conta dois aspectos: 1) geográfico, mirando em regiões onde o BB não tem posição relevante; e 2) nichos específicos, o mais óbvio é o de veículos, em que nossa posição não é forte.

FOLHA - Mas o BB já atua nessa área há algum tempo...
LIMA NETO
- Temos uma carteira de veículos desenvolvida de forma horizontal, dividida em várias áreas. O ideal é termos operação verticalizada e força de venda própria. Assim teremos um foco concentrado.

FOLHA - Veículos é um nicho importante mesmo com o crescimento menor da economia?
LIMA NETO
- É um mercado relevante, que vem crescendo. Nossa carteira de veículos é de R$ 6 bilhões, enquanto nossos competidores têm R$ 40 bilhões. Esse é um ponto fraco do banco. É um setor dinâmico, em expansão, além de ter toda uma cadeia de concessionárias, autopeças etc. O Banco do Brasil é bom na etapa anterior ao consumo. Temos participação forte com montadoras, mas não estamos participando tanto na ponta final, no financiamento do consumo.

FOLHA - Em que a medida provisória ajuda se o BB já negocia a compra de carteiras de veículos?
LIMA NETO
- Antes, a participação do BB em iniciativas societárias tinha de ser minoritária. O banco precisava de autorização específica e, em determinadas situações, isso nos fazia perder o "timing" do negócio. A MP dá liberdade ao banco. Como no atual momento da economia mundial é provável que haja uma nova onda de fusões e aquisições, se o BB não pudesse participar [desse processo] seria uma fragilidade.

FOLHA - O BB vai comprar bancos ligados a montadoras?
LIMA NETO
- A conclusão óbvia do processo, para qualquer analista que veja o BB -um banco com R$ 400 bilhões de ativos-, é que o que falta na formação de resultado, em comparação com seus competidores do mesmo tamanho, é que o banco não tem foco na área de veículos. Isso nos leva a olhar esse mercado. Se vamos comprar ou não, o tempo dirá.

FOLHA - O BB já comprou carteiras de veículos de outros bancos?
LIMA NETO
- Já estamos comprando carteiras de veículos e hoje [sexta-feira] devemos fechar algo acima de R$ 1 bilhão.

FOLHA - O que vai determinar a hora de o BB avançar para a compra de outros bancos?
LIMA NETO
- Vai depender da oportunidade que surgir e se ela faz sentido para o banco. Não vamos colocar dentro do BB algo que não tenha a ver com o nosso interesse estratégico. Se não for assim, não conseguiremos desenvolver. Só vamos avaliar [ofertas] que considerarmos saudáveis. Instituições que tenham tecnologia boa, administração de risco e força de venda.

FOLHA - O governo está pressionando o BB para ajudar o mercado a superar a crise a qualquer custo?
LIMA NETO
- Não há pressão do governo.

FOLHA - O que garante que o BB não vai comprar um "mico"?
LIMA NETO
- Em hipótese alguma compraremos "mico". Temos boa governança, uma administração que tem dado provas concretas da boa gestão do banco. A medida provisória não trouxe uma surpresa para o banco -ela veio com uma estratégia de olhar oportunidades. E o compromisso do governo é ter um banco eficiente.

FOLHA - Por que o mercado reagiu tão mal à edição da MP? As ações do BB caíram quase 10%...
LIMA NETO
- As ações do BB estão sendo punidas com as dos demais bancos. Existe um mau humor em relação a bancos por causa da crise. Os fundamentos do banco são bons. A leitura inicial da medida provisória pode ter levado a uma interpretação errada de que ela é para entubar o BB com "mico". Não é isso. A idéia é fazer uma ação preventiva.

FOLHA - Qual tem sido o tom das conversas com o ministro Guido Mantega e com o presidente Lula para definir a atuação do BB?
LIMA NETO
- As conversas têm sido sobre como preservar a eficiência, como reforçar a atuação do BB. É possível buscar oportunidades nessa crise para crescer? Tem sido assim.

FOLHA - O BB já analisa a compra de algum banco?
LIMA NETO
- Não estou analisando ainda. Quando estivermos, cumpriremos todos os ritos exigidos para empresas de capital aberto.

FOLHA - E a compra da Nossa Caixa, vai sair?
LIMA NETO
- Estamos negociando. Podemos ter uma forma de fazer o negócio, mas, por enquanto, só o que podemos dizer é o que já publicamos: estamos conversando.

FOLHA - E a oferta de crédito para o comércio exterior, como está?
LIMA NETO
- Tivemos uma restrição também. O governo agiu pontualmente, e o BB pegou US$ 1 bilhão no leilão de linha do Banco Central. Voltamos a fazer ACCs [operações para antecipar receita aos exportadores] e, ontem [quinta-feira], desembolsamos mais de US$ 300 milhões. As coisas começam a ser retomadas. O leilão do BC começa a ter resultado e aí, a tendência é o mercado seguir seu fluxo normal.


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