São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2006

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VINICIUS TORRES FREIRE

O novo Estado investidor de Lula


Pacote imita ações do Estado do século 20. Com rigor fiscal e sócios privados, pode dar certo. Mas há o risco-mamata
O PLANO ECONÔMICO de Lula 2 parece imitar, em miniatura, iniciativas típicas do Estado brasileiro de antes dos anos 90 do século passado. Em vez de miniatura poder-se-ia falar em caricatura, mas não se avacalhe o pacote antes que ele venha a público, banhado e vestido (mas não maquiado).
Lula quer que uma grande estatal, a Eletrobrás, lidere o investimento em eletricidade. Quer usar um fundo público de poupança obrigatória, o FGTS, para financiar a construção civil e subsidiar casas populares.
Quer que um banco estatal (CEF) empreste mais a governos e estatais. Indiretamente, o Estado atuaria com desconto de imposto: subsídio.
Subsídio para empresas privadas de infra-estrutura e seus sócios financeiros. Para empresas que invistam bastante em maquinário e para a construção civil. Parêntese: há gente que acha tudo isso besteira. Ao Estado caberia só gastar menos, a fim de poder baixar juros e deixar o setor privado livre para investir, em vez de privilegiar empresários com desconto de imposto. Mas passemos.
Considere-se o caso mais complexo, importante e urgente, o da Eletrobrás. Leis e normas limitam a capacidade da empresa de se financiar e de investir. E a Eletrobrás financia o governo. Com a Petrobras, responde pela grande contribuição das estatais ao superávit primário do governo federal.
Mas qual a alternativa ao apagão? Privatizar elétricas? Parece tolo, pois o dinheiro de novas obras seria desviado para a compra de usinas prontas. A privatização do setor elétrico virou programa de longo prazo.
Mas a Eletrobrás, dado o problema fiscal, vai poder investir à solta, sem limites? Não. E vai precisar de sócios privados. Quem vai definir onde ficarão as novas usinas e quais serão os parceiros privados? Não vai haver mamata político-empresarial e escolhas ineficientes de investimentos? Para que a estatal invista mais, sem que se torne lugar de mumunha política e rombos, é preciso profissionalizar sua direção, melhorar a "governança corporativa", e vender parte de suas ações.
Como a eletricidade das estatais é a mais barata (é investimento amortizado e hidrelétricas novas são mais caras), como fica o preço da energia no mercado? Baixo demais, afastará empresas privadas. Lula vai admitir que os novos investimentos sejam remunerados de modo adequado, a fim de não criar rombos como o dos anos 80 (que deram em um esqueleto de quase US$ 30 bilhões)?
Pode ser uma boa idéia, mas não será fácil nem rápida a reengenharia legal para "recriar" a Eletrobrás e para regular sua associação com o setor privado. O mercado de energia será afetado. E, mesmo que o retorno do investimento seja bom, é preciso calibrar as contas públicas. Se a nova Eletrobrás não pingar dinheiro no governo federal, dado o gasto público constante ou crescente, a mágica estatal pode virar ruína pública.

vinit@uol.com.br


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