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Sem inércia, conter inflação fica mais fácil
Economistas vêem mudança estrutural nos preços e maior eficiência do BC, além de credibilidade da política econômica
Câmbio também tem
ajudado no controle da
inflação, com volatilidade
mais baixa e preço menor
de produtos importados
MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Controlar a inflação brasileira ficou mais fácil e "barato". A
inércia -a inflação herdada do
período anterior- já não assusta mais e o câmbio atormenta
bem menos do que no passado
recente.
Não menos importante, dizem economistas, a política
monetária ganhou credibilidade: as pessoas confiam que o
Banco Central, chefiado por
Henrique Meirelles, fará o necessário para que os preços não
subam descontroladamente.
"A dinâmica inflacionária
hoje é menos dependente da
inflação passada e mais dependente das sinalizações do BC",
diz Luiz Fernando Figueiredo,
ex-diretor de Política Monetária do BC, hoje sócio da Mauá
Investimentos.
Guilherme Maia, da consultoria Tendências, argumenta
que o processo inflacionário no
Brasil passa hoje pelo que ele
chama de "mudança estrutural". Primeira mudança importante: a queda significativa da
inércia inflacionária.
Maia estima que pouco menos da metade da alta dos preços livres no ano de 2004 era
explicada pela inércia, ou seja, a
inflação herdada do ano anterior. Em 2005, a inércia ainda
explicava mais de um terço da
elevação de preços livres.
Neste ano, estima o economista da Tendências, a inflação
herdada de 2005 só explica
24% da alta dos preços livres,
que, nas contas dele, subirão
apenas 2,5%. "O governo quebrou a espinha dorsal da inércia", diz Fábio Kanczuk, economista da USP (Universidade de
São Paulo).
À menor inércia há que se somar o câmbio bem comportado. Menor volatilidade da taxa
de câmbio também leva a menos reajustes de insumos e produtos finais importados. Na
prática, o câmbio tem se valorizado, o que torna esses produtos mais baratos, ajudando no
controle da inflação.
Não é apenas por meio de
menores repasses de preços
que o câmbio tem ajudado. Carlos Langoni, economista do
Centro de Economia Mundial
da FGV, lembra que a economia brasileira está hoje muito
mais sujeita à concorrência externa, o que também exerce
pressão de baixa sobre os preços internos.
Langoni lembra que o coeficiente da abertura brasileiro,
medido pela soma das compras
e vendas externas em relação
ao tamanho da economia, girava, historicamente, em torno
de 15%.
"Hoje está em 30%", ressalta.
Figueiredo concorda: "A inflação é limitada também pelo
menor poder de mercado dos
produtores domésticos, devido
ao contínuo e relativamente
acelerado processo de aumento
das importações."
Credibilidade
Não menos importante para
"civilizar" a inflação brasileira,
argumentam os especialistas
em política monetária, é a credibilidade alcançada pelo Banco Central. "Resultados teóricos e empíricos para outras
economias mostram, por
exemplo, que ganhos de credibilidade significam menos custos para alcançar a meta inflacionária", diz Alkimar Moura,
da FGV-SP.
"Uma mudança fundamental
foi a alteração das expectativas
inflacionárias, principalmente
por conta da autonomia funcional do Banco Central", diz Langoni. O raciocínio por trás do
papel da credibilidade associada à política monetária não é
difícil. Uma série de contratos e
preços é reajustada, em uma
economia, de acordo com a expectativa que as pessoas têm a
respeito da inflação futura.
Quanto maior a crença em que
há um compromisso em combater e controlar a alta de preço, mais as expectativas ficaram ancoradas à meta estabelecida pelo governo, o que acaba
facilitando o trabalho do BC.
"Essa reversão das expectativas inflacionárias é algo inédito
na história econômica brasileira", conclui Langoni, que diz
acreditar que um ganho ainda
maior de credibilidade seria assegurado com a independência
formal do Banco Central.
Todos concordam que a inércia reduzida, o câmbio tranqüilo e as expectativas ancoradas
facilitam o trabalho do BC, mas
ninguém diz que manejar a política monetária tornou-se fácil, pelo contrário.
Juros neutros
A maior parte dos economistas concorda também que a taxa de juros no Brasil está relativamente próxima ao que acadêmicos e banqueiros centrais
chamam de juro neutro, ou de
equilíbrio.
Explique-se: seria aquela taxa que permite que a economia
cresça a sua plena capacidade e
não mais que isso, e que, portanto, não causa inflação.
As estimativas, para o Brasil,
são as de que essa taxa gire em
torno de 8% em termos reais. A
taxa básica de juros está hoje
em 13,75%. Como a inflação
prevista para o próximo ano gira em torno de 4%, a taxa real
está, grosso modo, em 9,7%.
Ou seja, há espaço para queda, algo com o que todos também concordam.
Mas ninguém sabe qual o limite. Os modelos, admitem os
economistas, não são uma panacéia. Nem aqui nem nos demais países.
Na década passada, ninguém
menos que Alan Greenspan, o
então presidente do Federal
Reserve, teve que desafiar os
modelos que associavam a taxa
neutra a uma determinada taxa
de desemprego. Baixar o desemprego para níveis abaixo de
5%, mostravam as regressões
econométricas para os EUA,
traria inflação. Greenspan
achava que ganhos de produtividade haviam mudado a relação, e acertou. Baixou os juros,
e a inflação não apareceu.
Quais os problemas com os
modelos brasileiros? "Nós fazemos os melhores modelos possíveis, mas há sempre uma incerteza estatística", diz Kanczuk. Podem faltar dados, séries
históricas, lembra o economista. Outro problema: os modelos
também podem ser "pessimistas", como argumenta Maia.
Para fazer uma estimativa,
um modelo usa a história passada. Se algo muito extraordinário ocorre, de forma a mudar
o padrão com que os dados se
comportam, as estimativas podem não ser realistas. Dito de
outra forma: o modelo pode
descrever uma economia que
não existe mais porque os únicos dados disponíveis são os
que a descreviam bem.
De qualquer forma, a única
saída, diz a maior parte dos economistas, é o gradualismo. "O
BC deve ir testando gradualmente taxas mais baixas e descobrir no tato, por tentativa e
erro", conclui Figueiredo.
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