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ANÁLISE
Finalmente um ataque à raiz da crise
FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL
Mais de 5,6 milhões de famílias já perderam suas casas nos
EUA desde o início de 2006.
Mas só agora o governo norte-americano apresenta um programa com dinheiro grosso para tentar estancar o problema,
que está na base da atual crise
financeira mundial.
Ao destinar US$ 600 bilhões
do novo pacote de socorro de
US$ 800 bilhões para o setor
imobiliário, o Fed e o Tesouro
dos EUA têm um duplo objetivo: estancar os despejos de mutuários que não estão conseguindo pagar pelos seus imóveis e tentar conter uma queda
que parece sem fim nos preços
das residências nos EUA.
No último trimestre terminado em setembro, os preços
dos imóveis nos EUA caíram
mais 16,6% (já tinham perdido
15,1% do valor no trimestre anterior). Hoje, já roçam um patamar anterior a 2004.
Já o ritmo atual de despejos
pode levar, em pouco mais de
um ano e meio, quase 14% da
população norte-americana a
perder o teto (considerando a
proporção de quatro habitantes por domicílio). Isso em um
cenário já negativo, de aumento do desemprego e de queda na
renda e no consumo.
O ritmo de despejos no país
passou de 1,2 milhão em 2006
para 2,2 milhões no ano passado. Em dez meses de 2008, o
volume já é maior ao de todo o
ano passado inteiro.
Entre os Estados mais afetados, estão Califórnia, Flórida,
Arizona e Nevada. Eles concentram grande número de imigrantes e americanos que adquiriram imóveis antes de a
"bolha" imobiliária explodir.
A injeção de US$ 600 bilhões
servirá tanto para que as empresas do setor tenham fôlego
para renegociar dívidas de mutuários inadimplentes quanto
dinheiro novo em caixa para
comercializar os imóveis que
ficaram vazios com os despejos.
Essa grande oferta de imóveis realimenta a crise: como
muitos mutuários têm dívidas
hoje superiores aos preços de
mercado de suas casas (que não
param de cair), eles simplesmente deixam de pagar as prestações.
Ao serem despejados, acabam indo morar de aluguel,
normalmente no mesmo bairro, pagando até a metade do valor da prestação, impostos e taxas que bancavam antes.
O problema é que eram justamente essas prestações que estão deixando de ser pagas que
remuneravam trilhões de dólares em títulos e papéis que foram vendidos a investidores ao
redor do mundo.
Quanto mais mutuários deixam de pagar suas dívidas, mais
"tóxicos" (sem valor) esses títulos se tornam. E mais rombos
são abertos nos bancos.
No caso do socorro de anteontem ao Citigroup, mais de
US$ 300 bilhões da carteira de
US$ 2 trilhões do banco tiveram de ser garantidos pelo Tesouro norte-americano dada a
sua "toxidade".
Transição
A ação do Fed é também um
reconhecimento de que o seu
principal "canhão" convencional, a redução da taxa de juro
(hoje já em níveis negativos),
não foi suficiente para reavivar
o mercado de crédito imobiliário e incentivar outras pessoas
a comprar os imóveis que ficaram disponíveis.
Para muitos interessados, esperar mais um tempo para fechar negócio mostra-se vantajoso, já que os preços ainda não
encontraram um piso.
Desde antes de sua vitória, o
presidente eleito dos EUA, Barack Obama, vinha insistindo
na necessidade de um programa destinado diretamente a
enfrentar a crise imobiliária.
A administração George W.
Bush vinha preferindo outro
caminho, como injetar dinheiro nos bancos em troca de participações acionárias.
Até ontem. O que pode ser
uma demonstração de que uma
transição conjunta entre as
duas administrações começou.
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