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CAIXA ALTA
Descontada a inflação, o aumento de receita com títulos públicos foi de 56,5% desde o início do Plano Real
Bancos ampliam lucros com dívida pública
ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL
A explosão no endividamento
do governo federal brasileiro tem
sido uma fonte bastante rentável
para os bancos. Desde 1994, ano
de adoção do Plano Real, a receita
das instituições financeiras com a
compra de títulos da dívida pública interna triplicou, de R$ 13,6 bilhões para R$ 41,7 bilhões.
Descontada a inflação medida
pelo IGP-DI, o aumento de receita
que essas instituições tiveram financiando o governo, por meio
dos investimentos em títulos públicos, foi de 56,5%.
Os dados levantados pela consultoria ABM Consulting, a pedido da Folha, se referem aos 20
bancos com as maiores carteiras
de títulos públicos do país. Segundo analistas, o levantamento revela que os bancos descobriram um
verdadeiro filão financiando o governo. A compra de títulos públicos tem sido um ótimo negócio
tanto em termos de remuneração
quanto de segurança.
Lucros frequentes
Os altos juros brasileiros, atualmente em 19% ao ano, garantem
um retorno elevado aos compradores de títulos públicos. Isso
porque 52,4% da dívida do governo federal em títulos no mercado
(mobiliária) é corrigida pela variação da taxa básica de juros. Outros 22% da dívida são indexados
à taxa de câmbio. Ou seja, sempre
que os juros sobem ou o real se
desvaloriza os compradores de títulos públicos lucram.
"Como a economia brasileira
foi muito afetada com a volatilidade causada pelas crises que se
sucederam nos últimos sete anos,
os bancos só têm saído no lucro",
disse o professor Fernando Cardim, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). "Por isso, o Brasil é o único país em que
os bancos tiveram ganhos altíssimos com o abandono do câmbio
fixo e a desvalorização."
Cardim lembra que a compra
de títulos públicos também garante aos bancos uma proteção
contra as fortes oscilações provocadas no mercado pelas crises financeiras. "Quem tem título público no Brasil dorme tranquilo",
afirmou o professor da UFRJ.
Não é por acaso, portanto, que
41% da receita total dos bancos
analisados venha, hoje, de investimentos em títulos da dívida mobiliária. No fim de 1994, ano em
que o Plano Real foi adotado, esse
percentual era de 22,5%.
De acordo com Alberto Borges
Matias, professor da USP e sócio
da ABM Consulting, esse dado revela uma dependência crescente
dos bancos em relação ao governo federal. "Quase a metade da receita dos bancos vem atualmente
de investimentos em títulos públicos", disse Matias. "Em parte,
isso mostra que as taxas de juros
no Brasil são mantidas altas para
que os bancos continuem vivos."
Estabilidade
A emissão de títulos públicos remunerados por taxas de juros altas sempre foi um dos principais
pilares do modelo de estabilidade
econômica, adotado em julho de
1994. Como o real nasceu valorizado em relação ao dólar, o governo brasileiro passou a depender
de recursos externos para compensar os déficits gerados na balança comercial.
Altas taxas de juros passaram a
atrair investimentos estrangeiros
para o Brasil. E a venda de títulos
públicos começou a ser usada
tanto para financiar o governo como para retirar do mercado o dinheiro que entrava no país, evitando uma volta da inflação.
"O governo se tornou prisioneiro da emissão de títulos para financiar seus déficits", afirmou o
economista Otaviano Canuto,
professor da USP.
Como os diversos choques de
juros promovidos pelo governo
durante as crises financeiras vêm
afetando o país desde 1995, a dívida interna explodiu, aumentando
de R$ 59,2 bilhões, em julho de
1994, para R$ 624 bilhões, em dezembro de 2001.
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