São Paulo, terça-feira, 27 de abril de 2004

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"PROJETO CARNAVAL"

Inquérito também investiga notas "frias" e texto no qual empresa diz preferir prestador de serviços da Espanha

Polícia apura se Telefônica tentou criar cartel

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

A Polícia Civil de São Paulo decidiu instaurar um inquérito policial para investigar se a Telefônica praticou o crime de formação de cartel na criação de um consórcio para tentar comprar a Embratel. O procurador-geral do Estado, Rodrigo César Rebello Pinho, designou o Gaeco (Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado) para acompanhar o inquérito.
A Folha revelou na edição de domingo um documento apreendido pela polícia na mesa do vice-presidente da Telefônica que diz que a "a união das teles" permitirá alinhar "preços pelo teto". O texto projeta que a empresa terá ganhos de até R$ 750 milhões caso consiga comprar a Embratel com outras duas operadoras.

Notas frias
Telefônica, Telemar e Brasil Telecom formaram um consórcio, chamado Calais, para tentar comprar a Embratel, ex-estatal que foi adquirida em 1998 pelo grupo americano MCI. A Embratel é a principal concorrente das três teles. Na Telefônica, a negociação entre as três operadoras recebeu o nome de "Projeto Carnaval".
Um juiz de Nova York deve decidir hoje se aceita a proposta das fixas ou a da Telmex, maior grupo de telefonia do México.
A Polícia Civil apura desde outubro do ano passado se a Telefônica provocou, indiretamente, a falência da SP Cobra, empresa que prestava serviços de telefonia à operadora de origem espanhola.
O primeiro inquérito tem 148 volumes. O novo inquérito investigará se a Telefônica cometeu outros três eventuais crimes, segundo o delegado Maurício Del Trono Grosch, que preside os dois inquéritos: contra a ordem econômica, contra a ordem tributária e contra a organização do trabalho.
Crime contra a ordem econômica ocorre quando uma empresa tenta eliminar a concorrência, combinando preços ou tentando dominar o mercado, entre outras ações, com prejuízos óbvios aos direitos do consumidor.
Os indícios de crime contra a ordem tributária na Telefônica podem ser caracterizados, de acordo com a interpretação da polícia, por notas frias que a empresa recebeu da SP Cobra.
As notas frias foram apresentadas à polícia pelo empresário Armando Kilson Filho, ex-sócio da SP Cobra, como um indício de que a Telefônica controlaria essa prestadora de serviços.
Entre os cerca de 80 kg de documentos apreendidos, a polícia também encontrou um documento no qual a Telefônica diz não querer sócios brasileiros nas empresas que prestam serviços para ela, mas só da Espanha.
O empresário Kilson Filho diz que foi isso o que aconteceu com ele. A Telefônica, diz, impôs sócios espanhóis à SP Cobra e estes teriam minado o negócio e provocado a sua saída da sociedade.

"Indício"
Os documentos sobre a Embratel encontrados na Telefônica podem ter implicações na área criminal e cível, segundo especialistas ouvidos pela Folha.
José Carlos Magalhães Teixeira Filho, professor de direito econômico na PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) e sócio do escritório Sarti, Farina e Magalhães Teixeira, afirma que "qualquer coisa que você combine com o seu concorrente é infração".
O documento da Telefônica, na interpretação dele, comentando o caso em tese, "é um indício bastante forte de cartel".
Segundo ele, o crime está previsto na lei 8.884 de 1994. Não é preciso, segundo Teixeira Filho, que o cartel seja formado -a simples tentativa já é infração.
O caso é punido com multa de 1% a 30% sobre o faturamento bruto das empresas, segundo a lei. Em 2003, a receita operacional bruta da Telefônica foi de R$ 16,2 bilhões. Os diretores das empresas também podem ser punidos. O órgão encarregado de aplicar as multas é o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica).


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