São Paulo, sexta-feira, 27 de abril de 2007

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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Novos desafios para o Copom

O Copom pode ter menos influência do que pensa na atividade com o controle dos juros de curto prazo

A DIVULGAÇÃO DA ATA do Copom é sempre um momento rico aos analistas, que têm a chance de avaliar eventuais mudanças no pensamento dos que decidem os rumos da política monetária. O placar de 4 x 3 da última reunião tornara a ata desta semana especialmente interessante. O leitor desta coluna conhece desde 2006 minha opinião a respeito da importância determinante das importações para a queda rápida da inflação. Tive a satisfação de ler na ata que, após longo atraso, o Copom começa a dar a importância devida ao papel do canal externo, tendo mencionado textualmente o fator como determinante para o voto dos três membros em favor de corte de 0,5 ponto percentual.
Mas quero abordar alguns outros temas que estão se tornando cada vez mais importantes aos rumos da política monetária. O primeiro, ainda parte do canal externo, é a aceleração consistente das entradas de capital financeiro. A atratividade do mercado de capitais brasileiro, dado o novo ambiente de inflação baixa e estável, já estava evidente desde 2006, com a forte entrada de recursos na Bolsa e em títulos públicos de renda fixa. Nos últimos meses, esse fluxo ganhou o reforço de capitais de curto prazo, incluindo financiamento de fornecedores, e de um ritmo mais rápido de captações de médio e longo prazo por parte das empresas. Certamente há um pedaço que visa só a arbitragem de juros, mas a busca por recursos no exterior é um movimento racional, que decorre do custo baixo do dinheiro em moeda estrangeira e da expectativa, cada vez mais disseminada, de estabilidade da taxa de câmbio no patamar atual por vários anos.
Ao contrário do período de câmbio fixo, que incentivava artificialmente empresas e consumidores a contrair dívida externa, o movimento atual é puramente de mercado e ocorre a partir da solidez de nossas contas externas. Por isso mesmo ele pode ser grande e duradouro. A aceleração das entradas financeiras nos últimos meses tem forçado o Banco Central a intervir cada vez mais no mercado. Nada menos que US$ 31 bilhões foram incorporados às reservas nos primeiros quatro meses de 2007, praticamente o mesmo valor do acumulado no ano passado inteiro. O movimento reforça consideravelmente a pressão por uma redução mais rápida dos juros, mas ainda não foi incorporado nas atas.
Outro fator muito relevante é a dinâmica dos juros no mercado. Aqui é possível distinguir entre os contratos de juros relativamente curtos e influenciados pelo Copom (até 18 meses) e os mais longos (até 2012), que dependem mais das expectativas de longo prazo. Aos que se ocupam de analisar o comportamento da curva de juros de mercado, uma mudança importante ocorreu recentemente nos juros curtos. Até há poucos meses, o mercado era refém da retórica do Copom e dificilmente colocava no preço mais de dois cortes de juros à frente. Claramente o mercado se libertou do palavreado das atas e hoje a curva de juros curtos considera nada menos que nove cortes de 0,25 p.p., com possibilidade de dois cortes de 0,50 p.p. nas próximas duas reuniões. É uma mudança importante de comportamento, que só se explica por uma alteração no mecanismo de formação de expectativas, já que a linguagem do Copom segue a mesma. Já nos juros longos assistimos a algo inédito no Brasil: a taxa de juros nominal está se aproximando de 10% ao ano.
A conclusão inescapável é que a economia está fazendo por si mesma o que a autoridade monetária reluta em fazer. Hoje, mais do que nunca, a dinâmica do crédito, das operações do mercado de capitais e do processo de decisão das empresas está nos prazos mais longos, que já refletem nova visão dos agentes econômicos a respeito da economia brasileira. Ou seja, é possível que o Copom esteja influenciando menos do que pensa a atividade econômica com o controle dos juros de curto prazo, o que só reforçaria a possibilidade de uma convergência mais rápida, para o bem do Tesouro.
Por fim, quero mencionar mais uma notícia relevante à política monetária: as expectativas de inflação de longo prazo (até dez anos à frente) já estão abaixo de 4% ao ano. Nos EUA, as pessoas (e o Fed) estão acostumadas a trabalhar com expectativas longas, refletidas nos títulos indexados à inflação (as chamadas Tips). Pois bem, temos aqui as nossas expectativas embutidas nos papéis indexados ao IGP-M e ao IPCA, que mandam a mesma mensagem ao nosso Copom.


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).

lcmb2@terra.com.br


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