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Crise agrícola gera oportunidade ao país
Brasil deve aproveitar momento para fazer acordos longos com importadores, obter investimento e avançar na industrialização
No entanto, ainda existem barreiras internas para aumentar participação no
mercado de alimentos, como juros altos e impostos
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
A crise atual no setor de alimentos abre grandes oportunidades para o Brasil. Mas o país
não pode pensar só em volume,
como sempre ocorreu, mas em
estratégias de produção e de
comercialização mundial.
Seguramente o mundo não
será mais o mesmo nas negociações internacionais após o
forte desequilíbrio atual entre
produção e consumo. E esse desequilíbrio, diferentemente do
que se verificou em outras crises, não tem um peso preponderante das quebras de safras,
mas de elevação de consumo.
Os emergentes têm mais renda
e comem mais e melhor.
Demanda por alimentos de
um lado e biocombustíveis de
outro levaram, aos poucos, os
estoques mundiais para níveis
perigosos neste momento.
Os EUA, por exemplo, líderes
mundiais em produção de milho, mas que adotaram o produto como energia alternativa,
chegam ao final do ano-safra
2008/9 com estoques suficientes para apenas mais 14 dias. O
de soja será de apenas 34 dias.
Oferta aquecida, demanda
apertada e estoques baixos foram o estopim para uma aceleração nos preços, incrementada ainda mais pelos fundos de
investimentos, que também escolheram as commodities agrícolas para investir.
Com esse cenário, a menos
que haja uma redução muito
forte no ritmo da economia
mundial, a demanda por alimentos vai continuar forte e,
nos patamares atuais de produção, a reposição dos estoques
demora alguns anos.
Países como Japão e China,
grandes importadores de alimentos e com muito dinheiro
em caixa, provavelmente vão
pensar em abastecimento de
produtos básicos com uma visão de mais longo prazo.
Alto custo
Aí entram as oportunidades
do Brasil. O país elevou em
muito a produtividade nos últimos anos, mas ainda patina no
processo de produção devido a
elevados custos e baixo poder
financeiro dos produtores.
Governo, cooperativas e câmaras de comércio deveriam
buscar acordos internacionais
de longo prazo com esses países
carentes em alimentos e torná-los responsáveis pela comida
que consomem, do plantio à
produção final.
O Japão, por exemplo, um
dos grandes importadores
mundiais de alimentos, empresta dinheiro a um juro próximo de 0,5% ao ano no mercado financeiro mundial. Com
uma taxa semelhante, os agricultores brasileiros diminuiriam em muito os custos, elevariam a rentabilidade e estariam
dispostos a investir ainda mais
na agropecuária.
Os produtores brasileiros, de
certa forma, já fazem vendas
antecipadas às tradings, mas
indiretamente acabam tendo,
embutidas no produto vendido,
taxas de até 8% de custos financeiros, descontados dos preços
finais. Essa diferença de taxas
significaria um grande ganho
para o produtor.
Os contratos de produção
com esses países poderiam
contemplar, ainda, uma garantia de seguros de produção, um
dos gargalos dos brasileiros no
momento. Os contratos poderiam ser de longo prazo, de cinco a dez anos, o que garantiria
abastecimento aos importadores e investimentos por aqui na
produção. Quanto aos preços
finais dos produtos, seriam
ajustados conforme valores vigentes no mercado internacional de cada período.
Outra grande oportunidade
para o Brasil neste momento é
a agregação de valores. O Brasil
deveria pensar em uma estratégia de longo prazo para elevar a
industrialização, diminuindo
as vendas externas de matérias-primas, com menor valor.
Isso significa romper algumas
barreiras impostas por muitos
países importadores. E este é o
melhor momento porque eles
precisam de alimentos.
Mudanças tarifárias
Mas, para isso, o país precisa
de mudanças tarifárias internas. A passagem de matérias-primas de um Estado para outro pode tornar a industrialização inviável devido à diferença
de impostos interestaduais.
No caminho inverso, o adubo
importado pode chegar a Mato
Grosso sem pagar impostos,
mas, se sair de misturadoras
brasileiras, é tributado, elevando o custo.
O Brasil pode ser um dos
principais fornecedores de alimentos e de biocombustíveis,
principalmente por deter a
maior disponibilidade de terras
agricultáveis do mundo.
Com isso, o país poderia aprimorar acordos com países dependentes em alimentação ou
empresas ligadas ao setor para
desenvolver também a infra-estrutura, um dos gargalos para
o setor de grãos.
Os investimentos feitos por
esses países ou empresas garantiriam acesso a produtos de
que necessitam.
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