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Fraude contábil era uma artimanha simples
ANDREW HILL
DO "FINANCIAL TIMES", NOVA YORK
Não esperem ver quaisquer diagramas complexos como os da
Enron detalhando a fraude contábil na WorldCom: com base na
informação disponível, os especialistas contábeis concordam em
que o truque empregado pela empresa de telecomunicações era
uma das artimanhas contábeis
mais simples que existem.
Robert Willens, analista de contabilidade no Lehman Brothers,
disse ontem que "não existe grande controvérsia quanto ao tratamento correto desses itens. O que
deve causar incômodo é: de que
maneira algo assim passou despercebido? Trata-se de uma das
questões básicas da contabilidade: registrar um desembolso como despesa ou capitalizá-lo?"
De acordo com a WorldCom,
cerca de US$ 3,8 bilhões foram
transferidos da rubrica "despesas" para as contas de investimento de capital em 2001 e no primeiro trimestre deste ano.
A tática tinha efeito lisonjeiro
sobre diversos índices básicos de
aferição do desempenho de uma
empresa, em um momento em
que ela estava sob intenso escrutínio devido ao estouro da bolha do
setor de telecomunicações.
Os ativos podem ser depreciados a longo prazo, de modo que a
WorldCom evitava, dessa maneira, a necessidade de registrar um
custo de caixa imediato, e assim
inflava sua receita líquida.
Na verdade, a WorldCom disse
que se tivesse computado corretamente as despesas, teria registrado prejuízo líquido em 2001 e no
primeiro trimestre deste ano. Não
se sabe ao certo que dimensão terá a correção da renda declarada.
O custo de depreciação desses
"ativos" não surgiu ainda nos ganhos anteriores aos juros, impostos e depreciação, um dos mais
importantes indicadores sobre a
saúde financeira da WorldCom.
Depois da correção, os ganhos anteriores aos juros, impostos e depreciação da empresa em 2001 foram de US$ 6,3 bilhões, e não os
US$ 10,5 bilhões registrados no
balanço. Para o primeiro trimestre de 2002, ficaram em US$ 1,4 bilhão, em vez dos US$ 2,2 bilhões
computados originalmente.
As margens de lucros anteriores
aos juros, impostos e amortização
foram, obviamente, maquiadas
de maneira semelhante. Em 2001,
essas margens foram de 30% em
termos reais, e não de 49%, como
declarado. No primeiro trimestre
deste ano, foram de 28%, e não de
43%. O fluxo de caixa operacional, outro importante indicador
para os analistas que acompanham as empresas de telecomunicações, também foi adulterado.
Os dispêndios de capital foram
inflados por meio da transferência de despesas para a conta de
ativos. Os analistas agora estão
ávidos por uma redução nos gastos das empresas de telecomunicações que realizaram investimentos excessivos durante o
boom do setor. De fato, John
Sidgmore, o executivo chefe da
WorldCom, reiterou na terça-feira que o grupo continuava comprometido em reduzir seus investimentos de capital para US$ 2,1
bilhões em 2003.
O dispêndio de capital declarado caiu de US$ 11,48 bilhões em
2000 para US$ 7,89 bilhões no ano
passado. Mas o montante real foi
de apenas US$ 4,8 bilhões, um
corte mais drástico que poderia
ter alertado os analistas para os
problemas que a gigante do segmento de telefonia de longa distância está enfrentando.
Por outro lado, os custos operacionais eram evidentemente superiores aos reportados. Em 2001,
a WorldCom anunciou que eles
haviam subido de 40% para 42%
de seu faturamento. Mas na realidade eles representavam 50% de
sua receita.
Os especialistas em contabilidade concordam que há diversas
áreas indefinidas, sob as normas
contábeis vigentes, no que tange à
maneira correta de capitalizar
despesas. Como resultado, existem exemplos de capitalização
agressiva e indevida de despesas.
Mas em pelo menos duas áreas
não resta dúvida de que aquilo
que a WorldCom fez viola os
princípios contábeis gerais tanto
na forma como no espírito.
Primeiro, a empresa anunciou
em seu balanço anual de 2001 que
"os principais componentes dos
custos operacionais são as tarifas
de acesso e as tarifas de transporte", essencialmente pagamentos
pelo uso das redes de outras empresas de telecomunicações.
Joseph Carcello, professor de
contabilidade da Universidade do
Tennessee, diz que "isso equivale
a pagar por um serviço em um dado período. Não sei de que maneira se pode alegar que esse pagamento represente parte de um ativo físico que terá vida de 10, 20 ou 30 anos".
Segundo, de acordo com o relato da WorldCom sobre o que
aconteceu, as despesas não foram
classificadas erroneamente como
ativos de capital, mas "transferidas" para as contas de capital. Isso
sugere que se trata de custos registrados inicialmente como despesas e a seguir simplesmente transferidos para as contas de capital
no momento de fechamento da
contabilidade do período.
A Creditsights, empresa independente de análise de crédito,
afirmou em comunicado que a
"transferência implica mudança
ativa do tratamento contábil".
"Isso é um princípio básico de
contabilidade", acrescenta Willens, do Lehman Brothers. "Acreditar que isso tenha sido ignorado por tantas pessoas é algo que preocupa os investidores, pelo
menos aqueles com quem conversei hoje [ontem]. Eles estão
prontos a desistir do mercado porque acreditam que os números não merecem confiança em quase todos os casos."
"Jamais ouvi falar de algo tão indigno, e trabalho no ramo há 33
anos. As pessoas estão simplesmente enojadas", declarou.
Tradução de Paulo Migliacci
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