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ALIMENTOS
Exportadores do país vizinho só vendem quando o câmbio é muito favorável; no Brasil, pão deve subir 15%
Trigo vira reserva de dólar da Argentina
ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
A crise argentina transformou o
trigo em reserva de valor no país
vizinho e quem pagará essa conta
será o consumidor brasileiro. Os
produtores argentinos querem fechar contratos volumosos de venda do trigo (cotado em dólar) nos
períodos em que a desvalorização
do peso dispara. Com isso, conseguem trocar os dólares recebidos
por uma maior quantidade de pesos. Os moinhos brasileiros, que
compram o produto, estão revoltados e travam hoje uma queda-de-braço com os argentinos.
A situação chegou a tal ponto
que grupos do setor alimentício
decidiram comprar trigo da Polônia, mais barato, segundo a Folha
apurou. O produto entra neste
mês no país se conseguir autorização fitossanitária. A Polônia
não é um tradicional produtor de
trigo. Com isso, tenta-se reduzir a
dependência da Argentina.
A operação de venda e compra
tem sido feita da seguinte forma:
os moinhos no Brasil recebem o
produto e pagam em dólares no
momento da entrega. Há casos
em que o pagamento ocorre dentro de até 90 dias. No primeiro caso, os argentinos são pagos no ato
e podem trocar as notas por pesos. Se a operação for fechada numa semana em que o peso sofreu
forte desvalorização, eles saem
ganhando: o produtor pode trocar seus dólares por mais pesos.
E eles precisam de pesos, urgentemente. Em abril, o governo da
Argentina determinou que o valor da dívida das empresas em dólar seria transformado em pesos
sem qualquer correção. Haverá
uma atualização dessas dívidas
em agosto. Os produtores têm dívidas de US$ 3,05 bilhões.
"O trigo se tornou reserva de valor para eles, Não imaginei que
chegasse a esse ponto", diz Lawrence Pih, presidente do Moinho Pacífico, que responde por
20% do abastecimento de trigo
consumido em São Paulo. "A saída é comprar dos EUA", diz.
"Não adianta conversar. O argentino só vende o produto quando sentir segurança de que a troca
será interessante para ele. O produto virou um ativo em dólares
para o país vizinho", afirma Edson Cisipai, do Moinho Santista,
da empresa de alimentos Santista.
Quem vai pagar a conta dessa
especulação, dizem eles, será o
brasileiro. Há falta de trigo no
mercado internacional e o preço
disparou. No começo do ano, a
tonelada estava em US$ 110. Hoje,
ultrapassa os US$ 160. O produto
argentino que chega hoje ao porto
de Santos custa aos moinhos US$
177 (incluído o frete).
Como ocorreu forte desvalorização do real nas últimas semanas, os moinhos precisam de mais reais para pagar a compra. E esse custo será repassado. "O preço subiu muito e isso não será absorvido. Acreditamos que haverá um
aumento de 15% no preço do pão", diz Antonio Carlos
Henriques, presidente do sindicato das padarias no ABC paulista.
Os moinhos acreditam que esse reajuste chegará ao consumidor
dentro de 30 dias.
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