São Paulo, domingo, 27 de junho de 2004

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Maior estabilidade não se converte em crescimento

Em dez anos, economia sempre registrou expansão menor que a dos demais emergentes

ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil deve encerrar 2004 com um histórico de dez anos seguidos de crescimento anual abaixo da expansão média de seus pares emergentes. Em comparação com a economia mundial, a brasileira perdeu em nove dos últimos dez anos, a partir de 1995.
Uma mistura inflamável de desequilíbrio fiscal, até 1999, juros altos, renda deprimida, em quase todo o período, e falta de investimentos impôs limites à expansão do PIB (Produto Interno Bruto).
Para piorar, a ocorrência de quatro crises externas e três domésticas fez essa combinação inflamável explodir, levando o crescimento a nocaute.
Essa análise se traduz facilmente em números. Se o Brasil crescer 3,5% neste ano, como prevê o Fundo Monetário Internacional (FMI), terá uma média acumulada de expansão de 2,2% entre 1995 e 2004. Para a economia global, essa média será de 3,7% e, para o grupo de mercados emergentes, de 4,9%, no mesmo período, também considerando estimativas do Fundo para este ano.
O surto inicial de crescimento com a adoção do Plano Real, em julho de 1994, foi sustentado pelo consumo, graças aos ganhos de renda da população mais pobre. Mas esse boom durou pouco.
Segundo o economista Jorge Arbache, professor da Universidade de Brasília, as reformas macroeconômicas -que incluíram, também a abertura da economia- feitas pelo governo FHC eram apropriadas, mas foram feitas em um contexto ruim: "A situação fiscal do país era muito ruim, e o quadro era de estagnação desde a década de 1990. Esperava-se que o país teria um boom de investimentos que não aconteceu, porque, devido à estagnação de mais de uma década, a demanda era insuficiente".
De acordo com o economista Ricardo Carneiro, professor da Unicamp, a estrutura de investimento público já vinha sendo desmantelada nessa época, mas não se criaram políticas ativas que atraíssem o setor privado.
O pior, segundo o economista Armando Castelar Pinheiro, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), é que, além de não crescer, a taxa de investimento seguiu em queda.
"O crescimento do estoque de capital foi de 3,2% ao ano no período entre 1981 e 1993 e de 2,2% entre 1994 e 2002", diz Pinheiro.

Juros altos
Pinheiro ressalta ainda que a adoção da âncora cambial obrigou a prática de uma política monetária de juros altos. Isso levou a uma profunda piora da situação externa do país, com a explosão da dívida pública.
Essa situação foi se deteriorando ao longo dos anos à medida que começaram a explodir as crises financeiras nos mercados emergentes: no México, em 1994; na Ásia, em 1997; na Rússia, em 1998; no Brasil, em 1999, na Argentina, em 2001, e, novamente, no Brasil, em 2002. Além disso, também em 2001, a economia brasileira enfrentou a crise de abastecimento de energia elétrica.
"Os choques externos foram uma constante nos últimos anos. O país sempre reagiu aumentando a carga tributária e os juros para tentar cobrir o seu buraco de Estado megagastador e atrair investimento", diz Fernando Ferreira, sócio da GlobalInvest.
Quando passou a perseguir superávits primários (economia para pagar juros), a partir de 1999, a situação fiscal do governo melhorou. Somada à adoção do câmbio flutuante, essa mudança tornou o país, segundo economistas, menos vulnerável a crises externas.
Isso não quer dizer, no entanto, que o caminho para o crescimento esteja pavimentado. Muito pelo contrário. Para economistas, o Brasil ainda enfrenta problemas e desequilíbrios que atrasam a retomada de investimentos.


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