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HISTÓRIAS REAIS
Plano deu base para
crescer 4%, diz Fraga
DO PAINEL S.A.
O economista Armínio Fraga,
46, ex-presidente do Banco Central (04/03/1999 a 1º/01/2003), é
considerado, por muitos, o pai do
"Plano Real 2", se é que se pode
chamar assim o período pós-desvalorização da moeda, em 1999, e
que se mantém até hoje.
Apesar de não ter tido participação na elaboração do Plano Real,
foi ele o principal mentor da política econômica dos últimos quatro anos do segundo mandato do
governo Fernando Henrique Cardoso. Por pouco ele não continuou na presidência do Banco
Central no governo Lula.
Em entrevista à Folha, Fraga diz
que o Plano Real marcou a política econômica dos últimos anos.
Além da estabilidade, houve também outros avanços, como o ajuste fiscal e bancário e a mudança
bem-sucedida do regime cambial.
Tudo isso, a seu
ver, construiu a
base para o crescimento da economia no ritmo
atual, de 3,5% a
4% ao ano. Para
crescer mais, Fraga diz que é necessário avançar na
agenda microeconômica. Leia a seguir trechos da entrevista.
(GUILHERME BARROS)
Folha - Como o
senhor classifica o
Plano Real?
Armínio Fraga -
O Real foi um plano econômico de
grande sucesso
porque permitiu
finalmente que o
país se livrasse da
inflação. E conseguiu isso depois
de várias tentativas frustradas. Mesmo assim, já
dura dez anos. A meu ver, é algo
que passou a ser cada vez mais
uma demanda da sociedade.
Folha - O sr. dividiria o Plano Real
em duas partes? Antes e depois da
desvalorização?
Fraga - O Plano Real, por si só,
foi um mecanismo de estabilização da economia pré-anunciado,
com a URV. O que veio depois foi
uma seqüência que seria até uma
forçação de barra dizer que foi tudo Plano Real. Depois do plano
veio o período pós-Real imediato,
com a adoção do câmbio fixo ou
administrado, que precedeu uma
transição forçada para a flutuação
cambial, pela primeira vez na história sem a volta da inflação. São
duas fases diferentes. O espírito
ou a filosofia por trás da ação do
governo nesse período foi que a
inflação prejudica o crescimento e
o desenvolvimento do país. Foi
esse o espírito que prevaleceu do
Plano Real.
Folha - O sr. concorda com as críticas segundo as quais o regime de
câmbio fixo se estendeu demais?
Fraga - É uma discussão velha.
Se a gente olhar para trás, é fácil
afirmar que demorou, mas as circunstâncias não foram fáceis na
época. A gente tem que lembrar o
que aconteceu. Houve a crise bancária no Brasil, a crise da Ásia, a
crise bancária no exterior, a crise
da Rússia... sim, talvez tivesse sido
melhor mudar o regime antes,
mas há que levar em consideração
o que aconteceu nesse período.
Folha - Alguma lição deixada pelo
Real, dez anos depois?
Fraga - A sociedade gostou de
viver sem inflação, especialmente
os mais pobres.
Folha - Foram tentados alguns
planos antes do Real, mas não não
deram certo. O que faltou?
Fraga - Os outros planos ou foram mal concebidos ou estavam
incompletos.
Folha - O Real resolveu o problema da inflação. O que falta para a
economia crescer?
Fraga - Falta agora avançar nos
temas da agenda microeconômica. Nessa lista, estão, por exemplo, as reformas tributária e trabalhista. Do lado macro, também é
preciso também tratar das questões que afetam a credibilidade do
país a longo prazo, como a Previdência e outros aspectos do gasto
público, dado que não é possível
aumentar a carga
tributária. No fundo, deve-se enterrar de vez a idéia
de que existe um
plano B, uma solução fácil, tudo o
que este governo
vem tentando fazer e, se insistir,
vai conseguir.
O que estava por
trás do Plano Real
era uma vontade
de resolver a questão da inflação,
que tinha se mostrado um grande
empecilho para o
desenvolvimento
do país, além de
ser também um
mecanismo muito
perverso de concentração de renda. Eu acho que
isso ficou.
Folha - Mas a melhora na distribuição de renda não
foi tão grande.
Fraga - Na década de 90, de acordo com estudo realizado pelo Bird
(Banco Mundial), o Brasil assistiu
a uma importante redução no nível de pobreza e a uma pequena
melhora na distribuição de renda.
Foi uma fase de bastante crescimento do mundo e, via de regra,
com piora na distribuição de renda.
O fato de o Brasil ter melhorado
sua distribuição de renda, ainda
que pouco, não deixa de ser uma
vitória. Se a gente olhar de maneira mais ampla, além da estabilidade econômica do Real, ocorreram
durante esses anos vários ajustes
macroeconômicos importantes.
Não foi só a questão da inflação.
Veio também o ajuste fiscal, infelizmente todo ele feito por meio
de aumento da carga tributária,
mas ainda assim foi feito.
Houve também o ajuste bancário, para administrar a crise no
sistema tanto pública como privada. E, por último, uma crise cambial, que provocou uma mudança
bem-sucedida no regime.
Portanto o Plano Real, entendido assim, de maneira mais ampla,
construiu a base para pelo menos
crescer no ritmo deste ano, entre
3,5% e 4%, mas, além disso, é preciso fazer mais. São as várias frentes de trabalho predominantemente micro, mas com preservação e consolidação da estabilidade macroeconômica.
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