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BENJAMIN STEINBRUCH
A Copa e o câmbio
A confirmação da meta de
4,5% para a inflação de 2008
é bem-vinda, abre caminho
para um câmbio mais realista
EM 17 de junho, Munique viveu
uma noite barulhenta de sábado, pouco comum para a
capital da Baviera, na Alemanha.
Milhares de brasileiros de camisetas
verde-amarelas, que se misturavam
a australianos com roupas da mesma cor, tomaram a Marienplatz, a
praça mais importante da cidade.
Segundo relato dos jornais, o batuque e o samba vararam a madrugada
que antecedeu o jogo entre Brasil e
Austrália.
A poucos metros dali, na Hofbräuhaus, talvez a mais famosa cervejaria do mundo, com 1.300 lugares, o
espetáculo era o mesmo. Para decepção de alguns brasileiros que
gostariam de desfrutar do ambiente
típico da casa, a música não era alemã. Era samba.
É impossível saber ao certo quantos brasileiros estão na Alemanha. A
crise da Varig permitiu algumas estimativas. Só os turistas com passagens da Varig na Alemanha seriam
15 mil. Ao todo, segundo apurou a
Folha na semana passada, de 40
mil a 50 mil pessoas seriam dependentes da Varig no exterior, sem a
garantia de que seus bilhetes serão
honrados na hora da volta.
A Copa do Mundo e a presença
dessa multidão de brasileiros no
exterior refletem uma realidade
bastante atual para a economia do
país, a do real forte. Embora a moeda nacional tenha perdido valor
desde o início de maio, por conta
das turbulências do mercado internacional, nos últimos dois anos
ainda apresenta valorização de
40% em relação ao dólar. Isso torna
mais acessíveis os custos das viagens e estadias no exterior, o que
certamente explica a atual revoada
de turistas.
Nada contra isso. Viajar ao exterior é uma experiência fascinante,
que infelizmente pode ser desfrutada por apenas 5 milhões de brasileiros, ou seja, menos de 3% da população. O problema é que a valorização do real, que persiste, já deixa
suas marcas nas exportações e pode representar um desastre para o
comércio exterior brasileiro a médio e longo prazos. O desempenho
comercial do país perde força, e o
superávit acumulado no ano já é
menor do que o do mesmo período
do ano passado. As exportações pararam de crescer, enquanto as importações aumentaram cerca de
20% até a terceira semana de junho.
No meio da euforia da Copa, que
deve continuar hoje com o jogo entre Brasil e Gana, passou quase despercebida uma boa notícia que tem
muito a ver com o câmbio. O Conselho Monetário Nacional, em sua
reunião de quinta-feira, vai confirmar a meta de inflação de 4,5% para 2008, mantendo, portanto, o
mesmo objetivo já fixado para
2006 e 2007.
A boa notícia é que, pelo menos
na perspectiva do governo do presidente Lula, que no sábado confirmou sua candidatura à reeleição,
há uma manifesta intenção de caminhar mais devagar na redução da
inflação, que já é bastante baixa para os padrões brasileiros. Afasta-se,
portanto, o risco de que a ala ortodoxa da equipe econômica possa
impor uma meta mais ambiciosa
para a inflação de 2008 -3,5%, por
exemplo-, que exigiria a adoção de
política monetária mais rígida, com
elevações de juros e com danos indesejáveis à atividade econômica e
ao emprego.
Os turistas barulhentos da Marienplatz e do Hofbräuhaus, que
hoje estarão com suas camisas verde-amarelas em Dortmund, certamente ficarão felizes por poderem
pagar seus gastos nos cartões de
crédito com o dólar na faixa de R$
2,20 quando retornarem ao Brasil.
Mas isso pode desviar as atenções
das graves conseqüências do real
forte para o comércio exterior do
país.
A atitude mais moderada em relação à meta de inflação indica que
não será necessário usar a valorização cambial, como se fez nos últimos anos, para ajudar a segurar os
preços. Além disso, espera-se da
autoridade monetária duas coisas:
1) o gerenciamento mais flexível da
meta de inflação, com o uso da banda de até dois pontos percentuais
sempre que a conjuntura exigir; 2)
aperfeiçoamento do sistema, para
que a meta não seja necessariamente fixada para um ano-calendário e possa ser perseguida em
prazo mais longo.
De qualquer forma, a confirmação da meta de 4,5% é bem-vinda.
Isso abre caminho para a adoção de
um câmbio mais realista nos próximos anos. Em economia, como no
futebol, é preciso ter fé.
BENJAMIN STEINBRUCH , 52, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do
conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.
bvictoria@psi.com.br
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