São Paulo, quinta-feira, 27 de julho de 2006

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"Pacote cambial" frustra exportadores

Jamil Bittar/Reuters
O ministro Mantega e o presidente do BC, Henrique Meirelles, anunciam mudanças em Brasília


Empresas poderão deixar no exterior até 30% de suas receitas com exportações, com isenção do pagamento da CPMF

Mantega diz que medidas "não são para enfraquecer o real, uma conquista" do país, e podem ser revogadas se situação no câmbio mudar

SHEILA D'AMORIM
LEANDRA PERES
SUCURSAL DE BRASÍLIA

Após meses de discussão, o governo anunciou ontem medidas cambiais mais tímidas do que as esperadas por exportadores. Elas autorizam que os exportadores deixem até 30% dos recursos obtidos com as vendas externas depositados no exterior. Os outros 70% deverão ser trazidos ao país em até 210 dias.
Com a medida, o governo espera reduzir o volume de dólares em circulação, o que poderá valorizar a moeda. E o dólar mais forte aumenta a competitividade dos produtos brasileiros. A medida reduzirá ainda o custo dos exportadores, que poderão utilizar os recursos no exterior para pagamento de dívidas sem trazê-los para o país, como funciona atualmente.
Para empresários e analistas, as medidas foram tímidas, afetando poucas e grandes empresas e sem muito impacto na taxa de câmbio. Elas entram em vigor nos próximos dias após publicação de medida provisória e resoluções do CMN (Conselho Monetário Nacional).
Horas antes de anunciar a medida, o governo voltou atrás e decidiu isentar do pagamento da CPMF o dinheiro que ficar depositado no exterior. Na prática, a equipe econômica estará abrindo mão de até R$ 400 milhões por ano em arrecadação com a CPMF que incidiria sobre essa parcela dos recursos.
As atuais compras de dólares realizadas pelo BC e pelo Tesouro e a quitação antecipada de dívida pública externa não têm sido suficientes para elevar a cotação do dólar diante da enxurrada de moeda estrangeira que entra no país fruto de vendas de bens e serviços e do alto juro que atrai estrangeiros.
Foi justamente por causa da alta das exportações que o governo decidiu acabar com a exigência de que todas as receitas com vendas externas sejam convertidas em reais e trazidas ao país. "Essas medidas não são para enfraquecer o real, que é uma conquista do Brasil, são só para evitar que ele se valorize tanto, [para] atenuar essa valorização", disse o ministro Guido Mantega (Fazenda), após a reunião do CMN que aprovou as medidas.
O impacto dessa mudança na taxa de câmbio atual, no entanto, é contestada por especialistas e até mesmo no governo.
A discussão para fechar o pacote de medidas -que incluiu também a redução da burocracia com a simplificação dos contratos de câmbio e a regularização de investimentos que não estavam registrados no Banco Central- se estendeu por boa parte da noite da véspera do anúncio. Até as 22h da terça-feira, a decisão era autorizar que até 100% das receitas com exportações ficassem no exterior para pagar dívidas ou outro compromisso das empresas. Mas, nesse caso, haveria a cobrança de CPMF.
O problema era a fórmula jurídica para cobrar a contribuição. Depois de muita discussão, a equipe econômica entendeu que a própria simplificação do contrato de câmbio poderia servir como base para incidência da CPMF. O temor, no entanto, era que, sem isenção do pagamento da CPMF, os empresários não teriam interesse em deixar o dinheiro lá fora.
"Se não houvesse desoneração [da CPMF], o exportador não ia querer ficar com o recurso fora do país. Cheguei à conclusão de que não adiantava fazer uma medida que tivesse pouca repercussão. O que me fez mudar de idéia é que, sem essa desoneração, a medida não teria eficácia", disse Mantega.
Um levantamento junto ao empresariado foi repassado ao ministro pelo secretário de Política Econômica, Júlio Sérgio Gomes de Almeida, que alertou sobre o risco de uma medida inócua. Como não era possível abrir mão da CPMF sobre todas as exportações -perda de arrecadação de cerca de R$ 1,2 bilhão por ano-, optou-se pelo limite de 30%. Mas não será aceito que o dinheiro fique depositado em paraísos fiscais.
"Começamos com um valor menor e poderemos elevá-lo se for o caso. Também poderá ser revogada. O governo deu mais liberdade, mas mantém todos os controles cambiais na mão e pode usá-los a qualquer momento", afirmou Mantega, explicando que, se no futuro o Brasil tiver falta de dólares, esse benefício pode acabar.


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