São Paulo, sexta-feira, 27 de julho de 2007

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Para analistas, crise está apenas no começo

Preocupação maior é que a tensão saia do mercado financeiro e contamine a economia real dos Estados Unidos

Bancos impõem restrições ao crédito imobiliário, que trava negócios com imóveis; troca de hipoteca barata por cara gera perda de renda

Richard Drew/Associated Press
Operadores no pregão da Bolsa de NY, que ontem caiu 2,26%


TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Os mercados financeiros viveram ontem mais um soluço de uma crise que pode ter conseqüências sobre toda a economia americana e mundial. A chamada crise do subprime (os empréstimos de alto risco do setor imobiliário) começa com uma dúvida sobre o valor correto dos papéis ligados a esses empréstimos e que fazem parte do portfólio de grandes fundos de investimento -ou seja, esses fundos compraram títulos por um preço muito acima do que conseguiriam vender hoje.
Como os fundos sofrem fortes pedidos de resgates dos cotistas, vendem outros ativos para poder honrar as demandas e derrubam os preços de ações e de papéis de dívida, incluindo os de países emergentes, como o Brasil. Prevendo que os preços caiam mais, outros investidores também vendem, gerando uma bola de neve com baixas generalizadas.
Essa dúvida quanto aos preços dos papéis chega com a popularização de um instrumento derivativo chamado CDO (Obrigação Colateralizada de Dívida, na sigla em inglês), que fatia o crédito imobiliário já securitizado (transformado em recebíveis) em vários níveis de risco e oferece como opção de aplicação financeira de alto retorno para o investidor, que agora amarga perdas.
Além da preocupação com o crédito prime, começa a aparecer um questionamento sobre o que os bancos e as agências de rating atribuíram a chancela de prime (bom pagador). O temor é que muitos créditos de primeira linha sejam, após uma avaliação criteriosa, classificados agora como subprime.
"O crédito prime não representa problemas, segue outras taxas de inadimplência e de comportamento de pagamento que diferem do subprime", disse Flavio Serrano, economista-chefe da corretora López León.
Até aí, trata-se de um problema de correção de preços saudável, que o mercado financeiro passa de tempos em tempos. Para a economia real, os desdobramentos surgem com uma maior restrição dos bancos na hora de conceder empréstimo. O crédito restrito trava os negócios no mercado imobiliário e pode respingar no preço dos imóveis. A preocupação é com um estouro da "bolha imobiliária" a partir de uma eventual queda nos preços das casas.
"Digo que a bolha está desinflando, e não estourando. O medo de essa bolha estourar existe e é isso que vai deixar o mercado volátil nos próximos meses", disse Ricardo Amorim, diretor de Pesquisa Econômica e Estratégia para a América Latina do banco WestLB.
Para o economista, as pessoas que tiveram aumento de renda a partir da troca de uma hipoteca mais cara por uma barata agora estão tendo efeito contrário e perdendo capacidade de compra. Isso se agrava pelo aumento dos preços do petróleo e da gasolina, o que reduz a renda disponível.
"A questão é se a crise será suficientemente forte para trazer abaixo o resto da economia mundial. Acho possível, mas improvável. Isso porque o resto da economia mundial -China, Europa e até a América Latina- vem se acelerando, e não desacelerando. A gente só vai ter certeza disso daqui a alguns meses", disse.
Para Marcelo Salomon, economista-chefe do Unibanco, a crise do subprime afetou todo o mercado de dívida de maior risco dos EUA. "Cada dia envolve novos produtos e fundos. Fundos de private equities [participação privada] estão tendo problemas para captar dinheiro. Ninguém sabe o tamanho real."


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