São Paulo, sábado, 27 de setembro de 2008

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Aracruz também perde com câmbio e afeta exportadoras

Como a Sadia, fabricante de celulose sofre com crise financeira e alta do dólar

Valor do prejuízo não foi divulgado e diretor de finanças é trocado; papéis de exportadoras sofrem forte queda na Bovespa

CRISTIANE BARBIERI
DA REPORTAGEM LOCAL

Depois de a Sadia comunicar perdas de R$ 760 milhões com operações no mercado financeiro ligadas ao dólar, ontem foi a vez de a Aracruz Celulose admitir que enfrenta o mesmo problema. A empresa, no entanto, afirma não saber o volume da perda. Nos dois casos, o prejuízo foi causado pela crise nos mercados financeiros internacionais.
Com a ameaça de que a situação atingisse outras empresas exportadoras, a Bovespa (Bolsa de Valores de São Paulo) registrou queda de 2,02% ontem. Diversas empresas, depois de fortes perdas no valor de seus papéis, vieram a público negar prejuízos semelhantes.
Segundo o fato relevante divulgado pela Aracruz, as operações no mercado financeiro foram influenciadas "pela recente instabilidade das cotações do dólar norte-americano, decorrente do momento de grande volatilidade dos mercados mundiais".
Tanto a Sadia como a Aracruz se posicionavam no mercado de câmbio esperando o fortalecimento do real. Mas a alta do dólar, que chegou a quase 18% em setembro, causou as perdas. As incertezas no cenário internacional forçaram-nas a rever a estratégia financeira e a reconhecer os prejuízos.
No comunicado, a Aracruz informou ter tomado iniciativas para minimizar o impacto da exposição cambial e para ampliar seus controles internos. A empresa disse que a exposição não deve afetar "significativamente" seu caixa, hoje de US$ 500 milhões.
A Aracruz afirma também ter contratado uma empresa especializada para apurar o valor de sua exposição. "A notícia é bastante negativa, uma vez que a Aracruz nem sequer tinha completo controle sobre sua posição de derivativos cambiais [operação no mercado financeiro]", diz Luiz Otávio Broad, analista da Ágora Corretora.
Segundo Broad, a Aracruz encerrou o segundo trimestre com posição vendida em dólar (apostando na valorização do real) na BM&F de US$ 360 milhões, o equivalente a seis meses do fluxo de caixa. "Isso significa que essa exposição cresceu nos últimos meses", diz Broad. Segundo ele, no entanto, é impossível determinar o tamanho do prejuízo.

Licença
Em razão da crise, Isac Roffé Zagury, diretor financeiro e de relações com investidores da Aracruz, apresentou pedido de licença do cargo, assumido interinamente por Carlos Aguiar, presidente da companhia. No dia anterior, Adriano Lima Ferreira, diretor financeiro da Sadia, havia sido demitido.
Com a expectativa de que empresas pudessem enfrentar o mesmo cenário, papéis de diversas companhias caíram ontem. As ações da Sadia registraram a maior perda, com queda de quase 35%. Os papéis da Aracruz perderam 15,57%, os da VCP, 8,88%, os da Embraer, 7,35%, os da Klabin, 5,36%, e os da Perdigão, 4,23%.
Vale, Cosan, Perdigão, Marcopolo, PDG Realty, entre outras, soltaram comunicados nos quais negavam perdas com exposição à variação cambial. A Embraer e a Vicunha Têxtil disseram à Folha que não enfrentam problemas semelhantes.
Para alguns especialistas, as perdas das empresas no mercado financeiro foram estimuladas pelos ganhos fáceis conseguidos no mercado de câmbio nos últimos anos. Apesar de reclamarem que o valor do real impossibilitava as exportações, as empresas acabavam lucrando -e muito, segundo analistas- operando no mercado futuro de câmbio.
"Estava muito fácil especular a favor [da valorização] do real", diz Antonio Corrêa de Lacerda, professor da PUC-SP.
Para Júlio Sérgio Gomes de Almeida, consultor do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), é procedimento rotineiro para empresas exportadoras fazer operações no mercado futuro. "Elas pegam o dinheiro do ACC [Antecipação de Contratos de Câmbio, que as permite receber o valor exportado em reais até seis meses antes da venda] e apostam na valorização da moeda", diz Almeida. "É uma forma de proteção."
Isso porque, se o real for mesmo apreciado, suas margens com as exportações cairão. "O problema é quando a maré muda e pega as empresas no contrapé", diz Almeida.
Para os especialistas, a melhor maneira de evitar o problema seria manter o câmbio atraente para exportações. Isso evitaria, dizem eles, "tentações especulativas".


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