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Brasil faz obras nos vizinhos temendo China
Gastos de linha do BNDES com serviços de engenharia nas Américas do Sul e Central cresceram quase 30 vezes desde 2002
Executivo de construtora brasileira afirma que chineses geralmente vencem disputa porque
são "imbatíveis" no preço
EDUARDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Com medo de perder espaço
para a China na exportação de
serviços de engenharia na
América Latina, o governo está
turbinando a concessão de financiamentos para empresas
de construção com projetos na
região. Líder nas Américas do
Sul e Central, o Brasil praticamente multiplicou por 3.000%
os valores liberados nos últimos sete anos para aumentar a
competitividade das companhias nacionais nas grandes licitações da região.
Com a crescente internacionalização das empresas brasileiras e o aumento da concorrência com os asiáticos nos países vizinhos, a linha do programa BNDES-Exim para o setor
saltou de US$ 42 milhões em
2002 para uma estimativa de
US$ 1,26 bilhão neste ano, dos
quais US$ 957 milhões já foram
liberados até o mês passado.
Segundo levantamento da
consultoria Valora, o Brasil exportou US$ 5,673 bilhões em
serviços de engenharia para os
países latino-americanos em
2008, que representam uma
participação de 50% a 60% do
mercado regional. A presença
brasileira ocorre principalmente nas obras de infraestrutura de geração de energia,
transportes e saneamento.
"Mundialmente o peso do
Brasil é pequeno e já foi até
maior nas décadas passadas na
África e no Oriente Médio.
Mas, na região, o país é inegavelmente o principal ator", afirma o sócio da Valora e ex-diretor operacional do BNDES-Exim, Renato Sucupira.
Entre os principais projetos
tocados por empresas brasileiras com recursos do banco de
fomento, estão a construção de
três usinas hidrelétricas na República Dominicana e uma na
Venezuela, linhas dos metrôs
de Caracas e Santiago, dois gasodutos na Argentina e uma autopista em Cuba.
O vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do
Brasil, José Augusto de Castro,
afirma que, além de serviços de
engenharia, arquitetura, construção e logística, esse mercado
está atrelado a setores da indústria nacional, que fornecem
máquinas e suplementos.
Segundo o estudo da Valora,
cada projeto executado no exterior beneficia uma cadeia de
até 1.500 fornecedores, a maioria pequenas e microempresas.
A estimativa é que, para cada
US$ 100 milhões em serviços
exportados, outros US$ 400
milhões em bens seguem para
fora do país pelo mesmo canal.
"Pode-se dizer que os serviços propriamente ditos representam só 20% das obras. E, como o BNDES obriga as construtoras a comprar o máximo no
país, se não houvesse condições
para competir nos projetos, esses equipamentos nunca seriam exportados", diz Castro.
Para ele, o Brasil ainda leva
vantagem na região devido à
possibilidade de fechar contratos por meio do CCR (convênio
de créditos recíprocos), que
funciona como uma câmara de
compensação multilateral entre os membros da Aladi (Associação Latino-Americana de
Integração). No entanto, a China, que em 2007 detinha apenas 4,5% do mercado no subcontinente, já começa a incomodar a posição brasileira.
"Os chineses já dominam a
África, inclusive em mercados
que nos eram cativos, como Angola, e agora estão cada vez
mais presentes por aqui. A
competição fica acirrada porque a China consegue financiar
a preços e juros quase absurdos
pois precisa gerar empregos."
De acordo com o diretor de
negócios da Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos), Maurício Borges, o fortalecimento
da imagem das construtoras
nacionais em outros países ajuda a facilitar a atuação dessas
companhias em um cenário de
maior competição no mercado.
"Apesar de o crédito ter ficado mais escasso na crise, muitos países optaram pela estratégia de investir em obras de infraestrutura como política anticíclica. Neste ambiente, as
empresas precisam ser cada
vez mais flexíveis para conseguir fechar contratos."
Identificar oportunidades
Para o diretor de estruturação financeira da Andrade Gutierrez, Luiz Cláudio Jordão, o
grande papel das construtoras
é identificar oportunidades de
negócios no exterior e transformá-las em projetos -que dificilmente seriam executados
sem o suporte do BNDES para
as compras de suprimentos no
país. Ele cita os dois gasodutos
construídos pela empresa na
Argentina, que tiveram 80%
dos US$ 300 milhões do custo
da obra financiados pelo banco.
Apesar da boa penetração da
companhia na região, Jordão já
sentiu na pele o peso da concorrência asiática. A Andrade Gutierrez foi responsável pela
construção do primeiro trecho
de uma ponte em Guayaquil
(Equador), mas perdeu para
uma empresa da China o contrato para o restante da obra.
"Os chineses têm incomodado muito a gente. Se eles são
pré-qualificados para disputar
o projeto, geralmente ganham,
porque são imbatíveis no preço", completa o executivo.
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