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Kindle não ajudará jornais, diz especialista
Para diretor da Universidade Harvard, receita que empresas de mídia terão com leitor de livros eletrônicos será marginal
Sistema de micropagamentos
de notícias na internet está
condenado, diz especialista,
para quem publicidade ainda
é a melhor fonte de receita
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O diretor do Laboratório de
Jornalismo da Fundação Nieman, na Universidade Harvard,
Joshua Benton, não enxerga no
Kindle, o leitor de livros eletrônico da Amazon, ou em outros
aparelhos similares solução para as finanças dos jornais. Os
leitores não vão usar de forma
disseminada um equipamento
só para ler livros ou jornais, diz.
Para Benton, será necessário
que os novos e-readers sejam
multifuncionais para terem
mais apelo. Sobretudo, oferecendo acesso facilitado à internet. Mas, nesse caso, surge um
problema adicional: poucos leitores vão se dispor a pagar para
ler um jornal se a web estiver a
um clique de distância oferecendo notícias gratuitamente.
O sistema de micropagamentos também estaria "condenado". Uma coisa, diz Benton, é
pagar US$ 0,50 por uma música que poderá ser ouvida várias
vezes. Outra é comprar uma
notícia para ser lida uma vez e
da qual não se conhece previamente a qualidade.
A internet tem efeitos negativos para o chamado "jornalismo de qualidade", com orçamentos mais reduzidos para
longas e custosas investigações.
Mas Benton aponta as vantagens oferecidas pela web na
produção de reportagens de
boa qualidade.
Ele menciona o fato de ter se
tornado "trivial a transmissão
de uma reportagem de qualquer lugar no mundo". Os repórteres também têm hoje à
disposição ferramentas poderosas de pesquisa. A propagação do conteúdo ficou mais fácil. Nichos de leitores podem
ser "agrupados e servidos por
um jornalismo muito específico que não poderia sobreviver
no modelo antigo".
O Nieman Lab, como é conhecido o centro dirigido por
Benton, completa hoje um ano.
Ancorado na Fundação Nieman para o Jornalismo, entidade com 72 anos de existência, o
laboratório tornou-se um dos
principais centros de debate
sobre mídia nos EUA.
Benton, 33, será o palestrante de abertura hoje, às 19h30,
do MediaOn-99, evento que vai
até quinta, em São Paulo. Sua
palestra será sobre "como o jornalismo de qualidade pode sobreviver e prosperar na era da
internet". Leia informações em
www.mediaon.com.br.
A seguir, trechos da entrevista de Benton à Folha:
FOLHA - O orçamento para produzir jornalismo de qualidade será continuamente reduzido com o aumento da concorrência on-line?
JOSHUA BENTON - Acho que sim,
se você usar a definição de "jornalismo de qualidade" da era
pré-internet: muitos repórteres bem pagos passando semanas atrás de uma investigação.
Mas também não se pode esquecer como a internet contribui para o jornalismo de qualidade. Tornou trivial a transmissão de uma reportagem de
qualquer lugar no mundo. Deu
aos repórteres as ferramentas
de pesquisas mais poderosas
disponíveis até hoje. Permite
que reportagens se propaguem
com facilidade. Nichos de leitores podem agora ser agrupados
e servidos por um jornalismo
muito específico que não poderia sobreviver no modelo antigo. Há mais jornalismo de qualidade sendo produzido agora
do que no passado. Está apenas
sendo produzido de forma diferente e por pessoas diferentes.
FOLHA - Qual é o futuro para os leitores eletrônicos de texto, os e-readers, como o Kindle?
BENTON - Sou cético a respeito
dos e-readers. Os usuários gravitarão em direção a produtos
multifuncionais. Não querem
os que só permitem ler livros,
mas também o que permitem
navegar na web.
Acho que é zero a chance de
um produto como o Kindle ter
impacto significativo nas finanças dos jornais impressos. Os
publishers sonham que os
usuários do Kindle passariam
novamente a querer pagar pelo
conteúdo de notícias. Isso se
daria porque eles estariam lendo as notícias digitalmente
num Kindle, e não na web. Não
creio que isso seja provável
nem as informações estatísticas disponíveis até agora corroboram esse ponto de vista.
FOLHA - Então jornais tradicionais
como o "New York Times" não adotariam os e-readers como uma parte
importante dos seus negócios?
BENTON - Jornais como o "Times" vão querer usar o Kindle e
outros e-readers simplesmente
porque essas publicações precisam que suas notícias estejam acessíveis em todos os lugares possíveis. Também porque eles buscarão alguma receita marginal. Mas será uma
pequena parte do negócio.
FOLHA - Já outros aparelhos chegando ao mercado, inclusive um da
Apple. Essa competição não ajudaria a difundir a tecnologia, tornando-a financeiramente viável?
BENTON - O aparelho da Apple
será melhor que o Kindle. Se
propiciar um acesso à internet
facilitado, tornará ainda mais
tolo o sistema de assinaturas
hoje oferecido pelo Kindle.
FOLHA - Qual tendência prevalecerá na web: notícias gratuitas ou conteúdo pago?
BENTON - Jornais como "The
Wall Street Journal", "Financial Times" e a revista "The
Economist" são exceções. Cobram por parte do que produzem na web. Essas empresas
miram em um leitorado no setor financeiro. Os leitores dessas publicações sentem a necessidade de lê-las para ter um
bom desempenho em seus empregos. Em resumo, são meios
que têm uma margem comparativa muito maior do que jornais de interesse geral.
O sistema de micropagamentos está condenado. Os consumidores de notícias não gostam
desse sistema, a ferramenta de
compra é complicada e uma
notícia que você lerá uma vez
-e cuja a qualidade você conhecerá ao ler- é muito diferente de uma música que o
usuário pode comprar para depois ouvir centenas de vezes.
FOLHA - Além dessas opções já comentadas, quais outras há para as
empresas de mídia jornalística na
era da internet?
BENTON - A publicidade, que
ainda é de longe a maior fonte
de receita para os sites de notícias nos EUA.
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