São Paulo, sábado, 27 de dezembro de 2008

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Governo dribla Congresso e turbina fundo

MP editada por Lula contorna oposição e abre possibilidade de capitalização ilimitada com emissão de títulos do Tesouro

Governo deve destinar maior parte dos recursos para projetos em estradas, portos, energia e saneamento básico

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Medida provisória editada ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva permite destinar ao fundo soberano mais que os R$ 14,2 bilhões previstos para 2009. Segundo a Folha apurou, a intenção de Lula é destinar mais recursos ao fundo em 2009, levando em conta a arrecadação de impostos e a execução de gastos.
O secretário-adjunto do Tesouro Nacional, Cleber Oliveira, disse ontem que a MP (medida provisória) "abre a possibilidade" de dar mais do que os R$ 14,2 bilhões que o governo destinará ao fundo até a próxima quarta-feira. "Vai ser avaliado ao longo do ano [de 2009].", afirmou Oliveira.
Para dificultar a possibilidade de a oposição questionar o destino do dinheiro ao fundo, o governo modificou, por meio da MP, a lei de sua criação aprovada pelo Congresso na semana passada.
Poderão ser emitidos títulos da dívida pública no valor equivalente aos R$ 14,2 bilhões poupados pelo governo ao longo de 2008 e que seriam destinados para abater a dívida pública se não fosse feita a mudança via MP. Esses títulos são papéis vendidos pelo governo ao mercado com o objetivo de capitalizar o Tesouro.
O valor de R$ 14,2 bilhões corresponde a 0,5% do PIB previsto para 2008. Desde a idéia da criação do fundo, o governo disse que destinaria esses recursos para ele. Até lá, ficariam contabilizados como superávit primário (toda a economia do setor público para pagar os juros de sua dívida).
Ao destinar R$ 14,2 bilhões para reduzir a dívida pública e aumentá-la por meio de emissão de títulos no mesmo valor, uma ação compensa a outra. A oposição não aprovou na semana passada a possibilidade de o governo destinar diretamente esse montante ao fundo. A MP dribla essa proibição. Dificilmente, a oposição conseguirá inviabilizar a operação.
Motivo: caso não seja aprovada pelo Congresso, os efeitos da MP durante sua vigência não podem ser anulados, porque ela tem força de lei nesse período. Como o governo precisa que a MP vigore até a próxima quarta, prazo limite para destinar os recursos ao fundo, a transferência dos R$ 14,2 bilhões será feita na prática.
Indagado se esse manobra era uma "rasteira" no Congresso, o secretário-adjunto do Tesouro sorriu. Depois, disse: "O Congresso saberá avaliar o desenho posto pelo governo". Oliveira acrescentou que "o governo está plenamente amparado [juridicamente] para todos os atos que serão tomados".
Além do decreto para capitalizar o fundo, serão editadas portarias para detalhar tecnicamente como ele será operado. Esses atos, de acordo com o secretário-adjunto do Tesouro, serão tomados até o dia 31.

Projetos
O governo vai definir ao longo de janeiro em quais projetos aplicará os R$ 14,2 bilhões. De acordo com um ministro, serão feitos gastos em projetos de infra-estrutura que exijam mão-de-obra intensiva (geração de empregos). Lula está preocupado em evitar um onda de desemprego ao longo do ano que vem. Já há sinais de queda significativa na geração de empregos em virtude dos efeitos da crise econômica internacional no Brasil.
Segundo o ministro, os projetos prioritários para receber recursos do fundo serão de saneamento básico, estradas, portos e energia. Esse dinheiro ficará aplicado no exterior, mas poderá retornar ao Brasil para ser investido por meio do FFIE (Fundo Fiscal de Investimentos e Estabilização), administrado pelo Banco do Brasil. Os projetos financiados serão definidos pelo Palácio do Planalto. A União, com recursos do fundo, é a cotista única do FFIE.
O fundo soberano é mais uma das medidas do governo para tentar atenuar os efeitos da crise, a exemplo do que já fez outras áreas, como redução de impostos e a liberação de recursos compulsórios dos bancos no Banco Central para ampliar a oferta de crédito.


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