São Paulo, segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

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LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA

Conjuntura contraditória


Elevar os juros é nonsense, e voltar a baixá-lo é ainda prematuro; é preciso aguardar com atenção

UMA CONJUNTURA contraditória cria hoje desafios para a política econômica: de um lado, a crise bancária americana, que está se transformando em recessão e terá efeitos negativos sobre a economia brasileira; de outro, o aquecimento da economia brasileira, que levou a um pequeno aumento da inflação. Diante dos dois inversos, a ortodoxia e o mercado financeiro têm uma resposta única: aumentar a taxa de juros, acompanhando a curva dos juros no mercado futuro, que já prevê esse aumento.
Mas estão paralisados porque sabem que a recessão americana implicará redução de investimentos e de atividade econômica no Brasil e porque o presidente Lula recomenda a seus auxiliares econômicos que monitorem com cuidado a economia brasileira para evitar surpresas, já que o risco de os empresários começarem a segurar seus investimentos é real. Ora, quando o presidente diz isso, ele está afastando a alternativa de elevação da taxa de juros.
Sobre esses temas, os jornalistas Valdo Cruz e Sheila D'Amorim vêm publicando nesta Folha reportagens ao mesmo tempo contraditórias e esclarecedoras, a partir de uma fonte que eles identificam como a "equipe econômica", mas representa o setor ortodoxo e financeiro do governo. Para a ortodoxia, a inflação é o risco principal, e sua causa é dupla: de um lado, o aquecimento da demanda, e, de outro, a provável depreciação da moeda que decorrerá de uma diminuição dos investimentos estrangeiros especulativos no Brasil e da queda dos preços das commodities exportadas. Embora fatores aceleradores da inflação sejam de ordem muito diferentes, ambos apontariam na direção do aumento dos juros pelo Banco Central.
Entretanto, não faz sentido aumentar juros devido ao aquecimento da demanda, porque o excesso da demanda efetiva já está desaparecendo devido à perspectiva de recessão americana, que cria perspectivas negativas para os empresários brasileiros. O que o presidente solicita, ao contrário, é que se monitore a economia para que a política econômica busque diminuir, em vez de acentuar, a inversão cíclica. Quanto ao aumento da inflação devido à possível depreciação causada pela provável diminuição do influxo de dólares, trata-se de um aumento do lado dos custos, não da demanda. Se alguma depreciação cambial realmente ocorrer, será bem-vinda, porque o conseqüente aumento da inflação será pequeno e temporário e mais do que compensado pelo estímulo às exportações.
No momento, a melhor coisa que podem fazer as autoridades econômicas em relação à política monetária é seguir o conselho do presidente e aguardar com atenção. Aumentar a taxa de juros é nonsense, e voltar a baixá-la é ainda prematuro. O problema de curto prazo que o país enfrenta é fiscal, não é monetário. No momento, o quadro monetário é favorável, não justificando medidas corretivas. Não existe risco nem de substancial aumento da inflação nem de crise cambial. No médio prazo, entretanto, o país enfrenta o problema grave da sobreapreciação cambial. A grande queda do influxo de dólares no Brasil em 2008 não decorrerá da diminuição de investimentos especulativos, mas da diminuição do saldo comercial brasileiro devido ao aumento das importações e à diminuição relativa das exportações. É para esse problema que as autoridades econômicas precisam se manter atentas.


LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 73, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda, da Reforma do Estado e da Ciência e Tecnologia, é autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".

Internet: www.bresserpereira.org.br

lcbresser@uol.com.br


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