São Paulo, domingo, 28 de fevereiro de 2010

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VINICIUS TORRES FREIRE

Centro do mundo, centro do Brasil


Extremismos de mercado e Estado se desmoralizaram; no Brasil, PT e PSDB imitam os sucessos dos adversários


A DESMORALIZAÇÃO do extremismo de mercado aparou ainda mais as pontas do espectro político, que andava penso para o lado liberal. O descrédito do mercadismo começou quando a finança estrebuchou devido a uma overdose do veneno que, na sua propaganda, era o elixir do progresso econômico universal. Tornou-se vexame quando a banca teve de ser estatizada ou socorrida pelo Estado. O descalabro não degenerou em tumulto político devido aos seguros e às proteções sociais do Estado. Mais recentemente, algumas instituições públicas capturadas pelos interesses da finança deram início a, digamos, uma "autocrítica".
O regulador do mercado britânico chamou várias inovações financeiras de socialmente inúteis ou nocivas. Disse que governos devem-se proteger da demência dos mercados por meio de intervenções estatais, o que era anátema faz três anos. O FMI passa a dizer coisa parecida. Parlamentos cúmplices da grande abertura das porteiras financeiras vão passar algum arame farpado no curral da finança -é o caso do Congresso americano.
Trata-se aqui, claro, do mundo ocidental rico, seus governos, sua opinião pública organizada, seus sistemas partidários, mídias, universidades, "think tanks" e outros "aparelhos ideológicos". O hemisfério novamente chinês é outra história. Claro que não houve mudança de fato nos poderes do mundo. Mais provável é que aumente ainda mais a desconfiança de ideias extremadas de mudança. Que cresça a suspeita em relação a ideologias economicistas, todas de fundo autoritário, o extremismo de mercado inclusive.
Mas é ridículo dizer que o pêndulo da história balança agora pela esquerda. Parece mais que a amplitude do pêndulo ficou ainda menor, e que com frequência ele passa pelo centro. O que seria esse "centro"? Uma espécie de consenso dos fracassos. Fracasso de estatismos de vária espécie, fracasso do extremismo de mercado, entre outros. Parece também o fracasso da diversidade política, em parte também resultado da uniformização social, econômica e cultural cada vez maior.
O Brasil tradicionalmente assiste a mudanças históricas à distância de uns passos atrás, embora não se desvie muito ou descure do exemplos dos "países avançados". Não deve escapar dessa tendência ao centro.
De resto, mesmo quando vamos dar um passo adiante, ficamos com saudades de ontem. Diluímos a novidade em um pouco de passado, em "transições transadas", pactos implícitos e outras conciliações.
O governo "liberal" de FHC aumentou o tamanho do Estado, embora em novo formato. O governo Lula refez a "aliança Estado-empresa" que, um dia e em outros termos, foi típica do velho desenvolvimentismo. Na campanha de Dilma Rousseff se reafirmam os "pilares" da política econômica de FHC. A oposição morre de medo de parecer inimiga dos métodos lulistas de pacificação popular, as Bolsas sociais.
As duas forças políticas dominantes do país tentam mimetizar sucessos do adversário. Isso num ambiente mundial em que parece predominar o consenso centrista dos fracassos. Será surpreendente se surgir novidade política nos próximos anos. Que dirá na próxima eleição.

vinit@uol.com.br


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