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Sonegação é o de menos em contas na Suíça
Ex-executivo acusa sistema financeiro do país de abrigar dinheiro de atividades ilegais graves, como tráfico e corrupção
"Tenho vergonha dos bancos suíços", afirma Rudolf Elmer, que por décadas administrou contas secretas de estrangeiros
MARCELO NINIO
DE GENEBRA
A sonegação de impostos é
apenas "a ponta do iceberg" das
contas secretas na Suíça. Na
maioria dos casos, essas contas
abrigam dinheiro de atividades
ilegais mais graves, que vão do
desvio de verbas públicas até o
tráfico de drogas e armas.
Quem diz isso conhece a engrenagem. O suíço Rudolf Elmer, 53, trabalhou mais de 30
anos no sistema financeiro,
muitos deles administrando
contas secretas de estrangeiros. A briga de Elmer contra a
mais poderosa indústria de seu
país começou após nove anos a
serviço do banco Julius Bär nas
ilhas Cayman, notório paraíso
fiscal no Caribe.
Em 2002, documentos sigilosos chegaram às autoridades
fiscais dos EUA, e o banco com
sede em Zurique obrigou os
funcionários a passar pelo detector de mentiras. Alegando
problemas de saúde, Elmer não
foi até o fim do teste, despertando suspeitas, e foi demitido.
De volta à Suíça, Elmer diz
que passou a sofrer ameaças do
Julius Bär, e decidiu contra-atacar: mandou e-mails anônimos a clientes do banco, prometendo divulgar suas identidades. Em 2005 ficou preso por
30 dias, por violação da lei de sigilo. Sonegação fiscal não é crime na Suíça, mas quebrar o sigilo bancário é, e dá cadeia.
A direção do Julius Bär nega
todas as acusações e diz que Elmer roubou dados do banco
com "intenções criminosas".
No fim de 2007, a Justiça de
Zurique rejeitou o processo
movido por Elmer, mas confirmou algumas denúncias, como
as ameaças e perseguições. Hoje ele vive nas ilhas Maurício,
de onde administra o site que
criou para denunciar práticas
antiéticas de bancos suíços
(swisswhistleblower.com).
Por telefone, ele explicou por
que declarou guerra ao sistema
financeiro de seu país: "Tenho
vergonha dos bancos suíços".
FOLHA - Apesar do risco, por que os
bancos suíços continuam a fazer esse tipo de operação?
RUDOLF ELMER - Os administradores de fortunas sofrem enorme pressão. Ou trazem fundos,
ou são demitidos. Além disso, a
Suíça, um país de 7 milhões de
habitantes, tem cerca de 3.000
administradores de fortunas
independentes. Eles viajam pelo mundo atrás de clientes.
FOLHA - A pressão internacional
pode levar a mudanças no sistema?
ELMER - Acho difícil. A Suíça
tem um centro financeiro tão
poderoso que a pressão sobre
os políticos é ainda maior. O
ministro das Finanças já disse à
UE [União Européia] que a Suíça jamais vai abrir mão do sigilo
bancário. Há uma queda de
braço nos últimos anos com a
UE, que quer mais cooperação.
FOLHA - O sr. administrou contas
de brasileiros?
ELMER - Tive três clientes brasileiros quando trabalhei em
Cayman, todos com contas acima de US$ 100 milhões. Eram
operações suspeitas, com o uso
de várias empresas e fundos. A
América do Sul é um dos alvos
preferencias dos bancos suíços,
e o Brasil em particular, pois há
grande número de indivíduos
com grande poder financeiro.
FOLHA - O sr. pode dizer quem
eram esses brasileiros?
ELMER - Por segurança, prefiro
não dizer. Que eu saiba, não
eram políticos.
FOLHA - Por que o sr. decidiu declarar guerra contra os bancos suíços?
ELMER - Trabalhar no sistema
financeiro mudou a imagem
que eu tinha -um país com reputação de fazer as coisas certas, fundador da Cruz Vermelha. Tenho vergonha dos bancos suíços. É ingênuo achar que
a evasão fiscal é um crime menor. Em geral, é a ponta do iceberg. Por trás, há crimes graves,
como tráfico de drogas e armas.
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