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Crise na pecuária pode gerar falta de carne
Secas na Austrália, na Argentina e no Uruguai e falta de estrutura no Brasil podem fazer com que o produto falte em dois anos
Brasil teria grande chance de avançar como fornecedor mundial de carne bovina se a estrutura dos frigoríficos fosse mais adequada
MAURO ZAFALON
ENVIADO ESPECIAL À ARGENTINA E AO URUGUAI
O fornecimento mundial de
carne bovina pode passar por
uma desestruturação nos próximos anos. Duas regiões são as
principais responsáveis pelo
fornecimento de carne ao mundo: América do Sul e Oceania. E
todos os países envolvidos com
o fornecimento do produto têm
problemas a curto prazo.
A Austrália, líder mundial em
receita com exportações até
2006, vive constantes secas, o
que diminui a produtividade do
país. A Argentina, que já foi líder mundial e exportava acima
de 700 mil toneladas na década
de 60, perde espaço e está
ameaçada de importar carne
bovina em dois anos.
No caso dos argentinos, dois
fatores são cruciais para a pecuária no momento: intervenção do governo e a forte seca vivida pelo país.
O Uruguai, outro importante
participante do mercado mundial, também viveu um período
de secas e deve sofrer as consequências nos próximos dois
anos.
O Paraguai, que vem exportando mais, também teve um
período de seca, embora menos
grave do que Argentina e Uruguai. O volume de exportação
do país ainda é pequeno.
Diante desse cenário, o Brasil
teria grande chance de avançar
no fornecimento mundial de
carne bovina, mas a desestruturação da rede de frigoríficos
em algumas das principais regiões produtoras do país pode
comprometer esse avanço.
"Se o Brasil não resolver essa
situação de estrutura da cadeia
frigorífica em áreas de grande
produção, o mundo poderá sofrer uma falta de carne em dois
anos", segundo Luciano Vacari,
superintende da Acrimat (Associação dos Criadores de Mato
Grosso).
Na sua avaliação, o país precisa criar um mercado sólido de
comercialização de gado, melhorando o relacionamento entre pecuarista e frigorífico.
Além disso, é preciso tornar as
negociações entre varejo e atacado mais transparentes. "Ninguém sabe o que acontece [nessas negociações]", diz ele.
O Brasil tem boi, boa genética, política externa, dólar favorável, qualidade do produto e
preço, mas o parque industrial
está totalmente desmontado
em algumas áreas, segundo ele.
Vacari cita o exemplo de Mato Grosso, principal rebanho do
país, que tem 38 plantas habilitadas a exportar, mas 15 estão
paralisadas. Essa parada elevou
ainda mais as dívidas dos frigoríficos com os pecuaristas, que
somam R$ 120 milhões.
Esse cenário traz desconfiança na comercialização de gado
e, para devolver essa confiança,
Vacari diz que a associação fará
tudo o que for possível para a
recuperação das finanças dos
frigoríficos, mas tem uma exigência. Quer colocar representantes dentro do escritório e
das dependências de abate dos
frigoríficos para ter garantia de
que o gado do pecuarista será
pago.
A Abiec, entidade representante dos grandes frigoríficos
exportadores, não quis se manifestar sobre a proposta da
Acrimat, dizendo apenas que a
decisão deve ser tomada individualmente pelas empresas.
Endividamento
O fechamento das portas de
vários frigoríficos faz o gado de
algumas regiões de Mato Grosso rodar até 800 quilômetros
para ir ao abate, o que derruba o
preço do animal, compromete a
renda do pecuarista e elimina a
possibilidade de novos investimentos.
Vacari diz que as dificuldades
dos frigoríficos aumentaram
com o endividamento excessivo, principalmente com dinheiro do BNDES, e após algumas
administrações desastrosas.
Júlio César Malheiros, da Secretaria de Desenvolvimento
Rural de Mato Grosso, diz que o
país tem dois anos para se preparar para eventual redução de
carne nos países vizinhos.
Otávio Celidonio, do Imea
(Instituto Mato-grossense de
Economia Agropecuária), diz
que, apesar de todos esses problemas, o cenário é bom para a
pecuária e a atividade deve
avançar no país.
Vacari diz que o país precisa
avançar no Sisbov, que é muito
burocrático, e o Ministério da
Agricultura não tem condições
físicas de atender a todos os pedidos de habilitação de fazendas. O ministro da Agricultura,
Reinhold Stephanes, concorda
com Vacari e diz que está pedindo agilização "para os dois
Estados [Mato Grosso e Mato
Grosso do Sul] onde os problemas são maiores".
Esse avanço é importante para o pecuarista porque com o
Sisbov ele consegue ganhar
10% a mais, percentual difícil
de ser conseguido apenas com
mais produtividade, diz Vacari.
O jornalista MAURO ZAFALON
viajou a convite da Acrimat
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