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País avança, mas segue vulnerável
Turbulência mostra que, apesar de reservas terem crescido, deficiências como dívida alta ainda pesam
Real foi a 2ª moeda que mais
se desvalorizou neste mês
até a última quinta-feira;
tensão afeta mais o Brasil
que os demais emergentes
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A despeito dos progressos
alardeados nos últimos anos, a
nova onda de turbulência financeira global mostrou que o
Brasil continua entre os líderes
do ranking de países mais vulneráveis às oscilações da economia no resto do mundo.
Embora não estejam no horizonte visível terremotos como
os que caracterizaram a segunda metade dos anos 90, o recente temor em relação aos rumos
dos juros e da atividade econômica nos Estados Unidos provocou no país abalos superiores
aos sofridos pela grande maioria das assim chamadas economias emergentes.
Um levantamento feito pela
LCA Consultores mostra que,
em um grupo de 21 países selecionados, o Brasil sofreu a segunda maior desvalorização de
sua moeda neste mês, até a
quinta-feira passada -só perdendo para a Turquia (ver quadro ao lado).
Dados do Banco Central consultados pela Folha apontam
ainda a África do Sul, que não
consta do trabalho da LCA,
com uma desvalorização cambial semelhante à brasileira no
mesmo período -nos dois países, a alta do dólar ficou perto
dos 10%.
A companhia está longe de
ser honrosa. Turquia e África
do Sul convivem com déficits
altos nas transações de bens e
serviços com o exterior, o que
as torna dependentes de capital externo para manter suas
reservas em moeda forte.
Já o Brasil ostenta superávits
nas contas externas desde
2003, exibidos pelo governo
Luiz Inácio Lula da Silva como
uma das principais evidências
de que foram superadas as fragilidades que custaram sucessivas crises financeiras nos
anos FHC (1995-2002).
No risco-país, medido a partir da diferença entre os juros
pagos por um emergente e as
taxas dos papéis norte-americanos, o impacto sofrido pelo
Brasil também esteve entre os
mais altos do mundo. Na amostra elaborada pela LCA, só Colômbia, Turquia e Venezuela
tiveram resultados piores.
"É preciso observar que, embora o país tenha melhorado,
ainda é pior do que a maior
parte dos outros", avalia Luís
Suzigan, da LCA.
Em outras palavras, os demais emergentes também
aproveitaram a conjuntura internacional favorável para fortalecer suas contas externas e
preservaram a vantagem que
tinham na comparação com a
economia brasileira.
Ambiente favorável
Nos últimos três anos, uma
combinação de taxas de juros
historicamente baixas no mundo em desenvolvimento e alta
dos preços de produtos básicos
permitiu que os emergentes expandissem suas exportações,
atraíssem grande volume de investimentos externos e acumulassem mais dólares em suas
reservas oficiais.
De lá para cá, o governo Lula
pôde quitar sua dívida com o
FMI (Fundo Monetário Internacional) e elevar suas reservas
cambiais disponíveis de US$
17,7 bilhões para US$ 50,8 bilhões, e as cotações do dólar
despencaram. A maioria dos
demais países fez o mesmo
-ou mais.
Para Suzigan, a própria queda do dólar em relação ao real
ajuda a explicar por que o nervosismo foi maior no país. "O
Brasil demorou mais que os outros países para conter a apreciação de sua moeda e, portanto, não chega a ser uma surpresa a desvalorização [deste mês]
ter sido superior aqui."
Já para Roberto Padovani, da
consultoria Tendências, não há
uma explicação definitiva para
o impacto maior da crise sobre
o real. "É uma boa pergunta."
Arrisca, porém, três possíveis
respostas. A primeira, clássica
no mercado, é que os papéis
brasileiros têm mais liquidez
-são mais facilmente negociáveis- que os da maioria dos
emergentes. Logo, quando há
incerteza, são os primeiros a serem vendidos, o que significa
saída de investidores e alta do
dólar. Suzigan também cita a
explicação.
A segunda, outro clássico: o
Brasil avançou nas contas externas, mas permanece com indicadores ruins nas contas fiscais, em especial a dívida pública acima de 50% do PIB (Produto Interno Bruto).
Por fim, há o complicador
que afetou mais fortemente o
dólar na semana passada: a insegurança dos investidores estrangeiros que compraram títulos de longo prazo em moeda
nacional, corrigidos pela inflação. Eles tentaram se desfazer
dos papéis quando viram o
mercado nervoso, mas descobriram que não havia compradores -fora o próprio governo,
que acabou socorrendo-os- e
partiram para o mercado de
câmbio.
Tranqüilidade
Mais otimista, o economista-chefe do Banco Pátria, Luiz
Fernando Lopes, atribui à última causa praticamente toda a
discrepância entre a alta do dólar no país e nos demais emergentes. Lopes argumenta que a
queda na Bolsa de Valores brasileira foi semelhante ou inferior da observada na maioria
dos outros países.
Mesmo com dúvidas sobre a
solidez dos indicadores que
acalmaram o mercado na quinta-feira e na sexta-feira, ele
aposta que a tranqüilidade permanecerá, a menos que surjam
fatos novos.
"O mercado gostou, é o que
interessa. Mas qualquer outra
informação pode trazer o nervosismo de volta."
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