São Paulo, domingo, 28 de julho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

EM TRANSE

Equipe econômica pretendia recorrer ao Fundo apenas para tranquilizar transição, mas crise estourou no governo FHC

Tática para a transição com FMI dá errado

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

VIVALDO DE SOUSA
COORDENADOR DE ECONOMIA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Com o dólar ultrapassando a barreira dos R$ 3 e a escalada do risco-país para níveis equivalentes ao de calote, a equipe econômica fechou a semana avaliando que, se não houver uma melhoria no curtíssimo prazo, terá de tomar uma atitude a contragosto.
Isto é, prorrogar o atual acordo, aumentar o pacote de empréstimos desse acordo ou fechar um novo acerto com o FMI (Fundo Monetário Internacional) antes de 6 de outubro, dia do primeiro turno das eleições no Brasil.
Esse acordo é visto pelo governo FHC como a única maneira de superar a turbulência financeira que o país atravessa. Tal crise, na avaliação da equipe econômica do governo, é agravada pela liderança de dois candidatos da oposição nas pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República.
Nas conversas com o FMI, os integrantes da equipe econômica chegaram a discutir a hipótese de propor um acordo com o FMI somente depois do primeiro turno da eleição. O argumento: seria mais fácil obter um compromisso com metas de inflação, metas fiscais e respeito aos contratos de dois candidatos do que de três ou quatro.
O compromisso dos presidenciáveis é a garantia que o FMI gostaria de ter para evitar que, após a posse do novo presidente, a atitude do governo mudasse e houvesse o risco de o país não pagar o novo empréstimo. Com a equipe de FHC não há esse risco. O pagamento de parte dos dois empréstimos do Fundo chegou a ser realizado antecipadamente.

Acordo urgente
Diante da piora do cenário externo, com o aprofundamento da crise nos Estados Unidos, e da situação interna -a alta do dólar e o maior nervosismo no mercado financeiro-, o governo passou a trabalhar com a hipótese -que já havia sido discutida antes- de prorrogar o atual acordo ou fechar um novo com prazo de duração de no máximo 12 meses.
Nesse caso, a idéia é obter um empréstimo do FMI com valor entre US$ 5 bilhões e US$ 12 bilhões -a obtenção desse dinheiro pode ser fechada por um acerto já na semana que vem. Além disso, o piso das reservas internacionais líquidas (que excluem os recursos do Fundo) poderia ser reduzido. O piso está hoje em US$ 15 bilhões. Os recursos para as intervenções no mercado vem dessas reservas, atualmente próximas de US$ 27 bilhões.
Apesar de o governo ter intensificado as conversas com o FMI para fechar um acordo antes de 6 de outubro, uma outra negociação poderá ser feita após a escolha do sucessor do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Se o cenário econômico continuar ruim, o que é difícil de prever hoje, poderá ser oferecida ao novo governo a possibilidade de assinar um acordo com prazo mais longo com o FMI.
Nesse caso, o valor do empréstimo e suas condições seriam negociados com o presidente eleito. Mas tudo dependerá da evolução da situação econômica e da vontade do próximo presidente.

Futuro econômico
Além da crônica vulnerabilidade externa do Brasil, o que amarrou o crescimento do país nos anos FHC, a perspectiva de um presidente de oposição leva o mercado financeiro a desconfiar do futuro econômico do país.
Hoje, segundo as últimas pesquisas de intenção de voto, estão na frente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), entre 32% e 35%, e Ciro Gomes (PPS), na faixa de 25% a 27%. O tucano José Serra, candidato do governo, está abaixo dos 15%, aproximando-se de Anthony Garotinho (PSB), cujo percentual ronda os dez pontos.
O presidente do Banco Central, Armínio Fraga, já obteve do FMI aval para propor um acerto, mas a condicionante do Fundo de um endosso de candidatos de oposição pode dificultar o acordo.
Mais: o Fundo pede a manutenção dos juros em patamares elevados. A vice-diretora-gerente do FMI, Anne Krueger, não gostou da queda dos juros básicos da economia de 18,5% para 18% ao ano, decidida pelo Banco Central neste mês, avaliando que não era o momento de afrouxar a política monetária. Malan e Armínio negam que Krueger tenha criticado a redução nos juros.
Segundo a Folha apurou, Malan teme que a pressão da campanha presidencial de Serra por boas notícias na economia leve o mercado a duvidar da manutenção do atual rumo econômico, que combina ajuste fiscal e juros altos.
Apesar de o governo afirmar que a lógica eleitoral não contaminará a campanha, o presidente Fernando Henrique Cardoso tem dado sinais de que pretende socorrer Serra na economia. Uma evidência disso foi a anunciada intervenção no mercado de combustíveis, para tentar baixar o preço do gás de cozinha, produto que mais subiu nos oito anos do Plano Real (472% nos cálculos do IBGE). O preço do gás foi duramente atacado por aliados de Serra, que também fez campanha contra a liberdade da estatal do petróleo de fixar os preços da gasolina.


Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: Elevação do risco anula efeito do corte nos juros
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.