|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CONTAS EXTERNAS
Segundo cenário do BC, governo poderia dispensar ajuda; para analistas, contar com Fundo seria mais seguro
FMI chega e país avalia renovação de acordo
NEY HAYASHI DA CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Técnicos do FMI (Fundo Monetário Internacional) chegaram
ontem ao país para fazer mais
uma revisão do acordo do Brasil
com o Fundo. A revisão deve ser
aprovada sem problemas, mas o
que mais preocupa o governo
brasileiro agora é decidir o que fará em novembro, quando acaba o
acordo com o FMI.
Cenário traçado por técnicos do
Banco Central indica que o Brasil
seria capaz de equilibrar suas contas externas em 2004 sem a ajuda
do FMI, sendo possível, portanto,
não prorrogar o atual acordo.
O problema é que nem sempre
as projeções se confirmam. Basta
um desempenho pior das exportações ou uma retração maior dos
investimentos estrangeiros para
que o governo seja obrigado a recorrer novamente ao Fundo.
Nesse contexto, a equipe econômica estuda a possibilidade de renovar o entendimento com o
Fundo para proteger o país de
eventuais crises e manter a confiança do mercado financeiro.
A equipe do FMI deve se encontrar com o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda). Na quinta
passada, o ministro disse que a
prorrogação do acordo ainda não
estava definida.
Se a revisão for aprovada, o governo poderá sacar parcela de
US$ 4,265 bilhões. É o que deve
ocorrer, pois o principal parâmetro da revisão, o superávit primário [economia para pagamento de
juros], está sendo cumprido com
folga. O acordo previa um valor
de R$ 31,4 bilhões para o primeiro
semestre -só até março o país já
estava R$ 5,5 bilhões acima disso.
As primeiras projeções do BC
mostram que seriam necessários
US$ 30 bilhões para que as contas
externas pudessem fechar o ano
de 2004 em equilíbrio. Desse valor, US$ 5 bilhões se referem ao
esperado déficit em transações
correntes (resultado da negociação de bens e serviços com outros
países), e outros US$ 25 bilhões
estão relacionados a vencimentos
da dívida externa no ano que vem.
Para a hipótese de cobrir essa
necessidade de financiamento
sem o socorro do FMI, o BC estima em US$ 12,6 bilhões os investimentos estrangeiros no ano. Esse
valor é o projetado pelo mercado,
segundo levantamento que o próprio BC divulga com base em consultas feitas a 70 bancos e empresas de consultoria. Mas nem sempre a projeção dá certo. Neste ano,
a estimativa de investimento estrangeiro do BC passou de US$ 16
bilhões, em janeiro, para US$ 10
bilhões, em junho.
Os US$ 17,4 bilhões restantes viriam de empréstimos que tanto o
governo quanto o setor privado
precisariam conseguir no exterior
ao longo de 2004. O valor equivale
a 69,6% das parcelas da dívida externa que vencem no ano que
vem. No primeiro semestre deste
ano, as empresas conseguiram rolar com folga a totalidade dos
compromissos do período.
Entre outros fatores que ameaçam a projeção dos técnicos do
BC está a perspectiva de que as exportações brasileiras caiam. Para
2004, já se espera um superávit na
balança comercial (exportações
acima das importações) menor
que o deste ano: uma previsão de
US$ 15,1 bilhões em 2004, contra
um resultado esperado para este
ano de US$ 17,3 bilhões.
Em conversas informais, a equipe econômica admite que seria
mais confortável contar com a
ajuda do FMI -mesmo que os
números permitam o desligamento do programa do Fundo.
Ao longo do primeiro semestre
deste ano, por exemplo, o Brasil
precisou de US$ 11,2 bilhões para
fechar as contas externas. No
mesmo período, recebeu US$ 3,5
bilhões em investimentos e US$
10,1 bilhões em empréstimos, totalizando US$ 13,6 bilhões.
Mesmo assim, o governo recorreu a um empréstimo de US$ 8,2
bilhões do FMI no início do ano.
O valor se refere ao acordo fechado em 2002 e serviu para reforçar
as reservas internacionais do país.
Desse valor, já foram descontadas
as parcelas que o Brasil precisou
pagar à instituição por financiamentos concedidos ao país em
anos anteriores.
O acordo atual é uma prorrogação do acertado em 1998, no final
do primeiro mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. De lá para cá, o Brasil tomou US$ 47 bilhões emprestados
do FMI, que deverão ser pagos até
2007. Sobre esse valor, incidem
juros de US$ 2,9 bilhões, dos quais
US$ 1,65 bilhão já foi quitado.
O economista Paulo Nogueira
Batista Jr., professor da FGV-SP, é
um dos que defendem que o acordo não seja renovado. Para ele,
uma eventual prorrogação pode
prejudicar a posição do governo
na negociação de vários temas
importantes da sua agenda externa, principalmente em relação à
formação da Alca (Área de Livre
Comércio das Américas).
Na sua opinião, os debates em
torno dos entendimentos com o
FMI ficam, equivocadamente,
centrados na subordinação do
país às teorias econômicas liberais
defendidas pelo Fundo. "Esse aspecto é o menos importante",
afirma Batista Jr.
O economista lembra que os
empréstimos concedidos pela
instituição são feitos com o dinheiro de seus acionistas, sendo
os EUA o maior deles. "A continuidade do acordo abre uma porta para a pressão americana [nas
negociações da Alca] vir do lado
financeiro, por meio do FMI."
Embora diga que o Brasil deveria agir de forma mais independente em relação ao FMI, Batista
Jr. afirma que o baixo nível das reservas internacionais líquidas,
hoje em US$ 17,7 bilhões, é um
obstáculo ao encerramento do
acordo com a instituição.
Na sua avaliação, o governo errou ao não aproveitar a calmaria
dos investidores para comprar
dólares diretamente no mercado.
Isso ajudaria o país a recompor
suas reservas em moeda estrangeira e, ao mesmo tempo, evitaria
que uma valorização excessiva do
real pudesse colocar em risco o
equilíbrio das contas externas.
Para o mercado, a continuidade
do acordo é vista como positiva. O
economista-chefe do Lloyds TSB,
Odair Abate, diz acreditar ""que o
Brasil já seja capaz de caminhar
com as próprias pernas" de agora
em diante, mas afirma que a continuidade do acordo seria uma
maneira de o Brasil ter acesso a
uma importante linha de crédito
sem que custos adicionais fossem
impostos ao país.
Texto Anterior: Painel S.A. Próximo Texto: Frase Índice
|