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OPINIÃO ECONÔMICA
Antídoto contra a mudança
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
"Uma manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, Gregor Samsa
deu por si na cama transformado
num gigantesco inseto."
Franz Kafka, "A Metamorfose"
Segundo o governador de
São Paulo, Geraldo Alckmin,
do PSDB, "tudo o que foi colocado pelo deputado Roberto Jefferson vem sendo confirmado, ponto a ponto". Essa é, realmente, a
impressão generalizada. Por isso, merece atenção a recente entrevista de Jefferson a Boris Casoy. Refiro-me em especial ao seu
relato sobre planos e temores do
PFL e do PSDB.
Baseando-se em conversa com
o presidente do PFL, Jorge Bornhausen, Jefferson contou que
existe um entendimento entre
PFL e PSDB para tentar preservar, em certa medida, o presidente Lula, permitindo que ele
chegue, enfraquecido, ao fim do
seu mandato. Isso teria sido
acertado entre Bornhausen e o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
"Eles temem a queda do presidente Lula", explicou, "porque o
vice-presidente, José Alencar, é
um homem muito ligado aos militares, com fortes primados nacionalistas, um empresário e capitão de indústria." Jefferson
previu que, assumindo o governo, Alencar "reduziria os juros e
enfrentaria a política dos bancos
e do FMI". Nessa hora de depressão e desesperança, Alencar seria
capaz de levantar a auto-estima
dos brasileiros, tornando-se "imbatível" nas eleições presidenciais de 2006, afirmou.
O leitor poderá acreditar ou
não nessas afirmações. Mas, pergunto, elas não são um pouco
mais plausíveis do que a versão,
propagada pelos lulistas, de que
as elites estariam pretendendo
desestabilizar ou até derrubar o
governo?
Verdade seja dita: o impeachment de Lula desorganizaria o
controle que as elites, especialmente os grandes bancos e os interesses a eles associados, têm
atualmente sobre as políticas
macroeconômicas e financeiras.
Esse controle foi preservado após
longo e cuidadoso trabalho de
cooptação de grande parte do PT
e da candidatura Lula. Conseguiu-se, assim, anular no "tapetão" o resultado das eleições presidenciais de 2002.
Com Lula bastante debilitado,
talvez definitivamente anulado,
esse controle só será ameaçado se
a crise arrastar o presidente da
República e o seu ministro da Fazenda.
Não interessa às elites, portanto, apressar o fim do governo Lula. Vou mais longe: nem sequer
lhes interessa tirar Lula do páreo
em 2006. Surgiria, nessa hipótese, um vácuo político, que poderia ser aproveitado, não por um
tucano ou algo equivalente, mas
por um candidato não-enquadrado, algum "aventureiro" que
pudesse colocar em risco a estabilidade medíocre da política
econômica brasileira.
O quadro político-eleitoral é
frágil e potencialmente volátil. A
confiança na classe política tende a zero. Denúncias graves estão atingindo não só o PT e o governo Lula mas o Congresso e todos os principais partidos, incluindo o PFL, o PMDB e o
PSDB. Nesse ambiente, aumentam consideravelmente as chances de que, em 2006, possa ocorrer a ascensão de um "outsider",
difícil de controlar ou cooptar.
A crise política adquiriu uma
dinâmica que a torna incontrolável. Mas parece claro que, da
ótica dos defensores do "status
quo", a preferência é pela preservação de Lula, não só como presidente mas até mesmo como
candidato em 2006. Desse ponto
de vista, o ideal é que ele chegue
desmoralizado às eleições, tornando-se presa fácil para um adversário capaz de defender com
mais autenticidade e naturalidade a atual agenda econômica
e financeira.
Ironia do destino. Por um processo tortuoso e melancólico, Lula sofreu metamorfose radical:
passou de paladino das mudanças a antídoto contra toda e
qualquer mudança.
Paulo Nogueira Batista Jr., 50, economista e professor da FGV-EAESP, escreve
às quintas-feiras nesta coluna. É autor
do livro "O Brasil e a Economia Internacional: Recuperação e Defesa da Autonomia Nacional" (Campus/Elsevier, 2005).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
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