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OPINIÃO ECONÔMICA
Um país de muitas empresas
ANTONIO BARROS DE CASTRO
O IBGE acaba de lançar um conjunto de informações relativas às empresas brasileiras em 2000. As informações ali contidas não se prestam à análise de conjuntura, como acertadamente adverte uma matéria publicada a
esse respeito pela Folha de ontem.
Mas ajudam a ver de novos ângulos como estão se modificando a
estrutura e o funcionamento dessa economia e sociedade.
Merece destaque, antes de mais
nada, o número de pessoas que
possuem empresas ou são sócias
de alguma. De fato, mais de 5,5
milhões de pessoas se encontram
nessa condição. Esse número,
acrescido dos parentes, mostra
que uma considerável parcela da
população se encontra direta ou
indiretamente envolvida em um
tipo de atividade (e forma de vida) que requer a incessante tomada de decisões econômicas -nada triviais, dada a usual turbulência do ambiente.
O fenômeno que acaba de ser
assinalado chama ainda mais a
atenção se levarmos em conta que
o número de empresas (o estudo
se refere apenas às formalmente
registradas) vem aumentando rapidamente. Numa economia que
cresce a uma média pouco acima
de 2% ao ano, a quantidade de
empresas aumentou 6,2% ao ano
de 1998 a 2000. Aliás, o que o estudo mostra é que a taxa de natalidade é 1,5 vez maior do que a taxa
de mortalidade das empresas.
O surgimento e o desaparecimento de empresas ocorrem com
muito mais frequência nas categorias das micro e pequenas empresas, como seria de se esperar. E
esse fato pode significar tanto a
reiterada descoberta de novas
oportunidades como a corrida
para o (incerto) refúgio da empresa. De qualquer forma, a economia e a sociedade que poderão
daí resultar serão muito diferentes do que nos habituamos a conceber como Brasil.
Que uma elevada proporção de
empresas desapareça pouco após
ser fundada não me parece surpreendente. Creio ser assim por
toda parte. Afinal, em seu primeiro ano de vida a empresa nem sequer chegou a definir as rotinas
que virão a pautar a sua conduta
cotidiana -e já se defronta, plenamente, com os seus erros de
avaliação. Para além disso, os especialistas seguramente saberão
apontar por que e como, no contexto atual, a sobrevivência na fase inicial tornou-se ainda mais
difícil.
O que me parece verdadeiramente intrigante é a enorme superioridade dos nascimentos.
Existem aqui, seguramente, fatores demográficos. Por exemplo: as
pessoas passaram a viver mais e,
não raro, têm ânimo para empreender na terceira idade. Por
outro lado, o aumento da escolaridade verificado nos últimos
anos ajuda a enfrentar as dificuldades inerentes para estabelecer
um negócio. Mas há, sem dúvida,
que destacar certos fatores econômicos.
Primeiramente, a reestruturação das empresas verificada desde o início dos anos 90 lançou no
desemprego muita mão-de-obra
treinada e, inclusive, pela primeira vez, muito "colarinho branco".
As empresas, de sua parte, buscando o enxugamento, passaram
a comprar no mercado muito do
que antes produziam, gerando,
com isso, ao mesmo tempo, desemprego e oportunidades de empreendimento. O extremo barateamento de máquinas usadas e
instalações tornadas sem uso pode aqui ser apontado como mais
um fator de acesso a novos negócios. Outros, seguramente, poderiam ser arrolados. Limito-me,
porém, a acrescentar que parece
próprio da revolução industrial
presentemente em curso a maior
flexibilidade das técnicas, a
maior versatilidade dos produtos,
a mais fácil descentralização das
atividades e, por todas essas razões, a existência de mais poros
ou espaços para empreender.
No caso do Brasil, bem como em
algumas outras economias, contudo, essas possibilidades são severamente tolhidas pela instabilidade endêmica e o recorrente estado de pré-pânico.
Antonio Barros de Castro, 58, professor titular da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e ex-presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.
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