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OPINIÃO ECONÔMICA
2006 não será nenhum passeio
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Aos funcionários públicos
Quero falar um pouco sobre as eleições municipais e
o que elas podem sinalizar para
as eleições de 2006. Começo com
um episódio acontecido há mais
de dez anos, mas nem por isso
menos relevante para o momento
atual. Em uma mesa de debates,
eram dois os principais expositores. De um lado, um conhecido físico nacionalista, um senhor de
certa idade, mas vigoroso nas
idéias e na forma de expressá-las.
De outro, um também conhecido
economista e político paulista, do
PT, tão arrojado e enfático quanto o seu companheiro de mesa. O
físico defendeu suas idéias nacionalistas com clareza e sem concessões, como é do seu feitio. O
economista petista aproveitou
para fazer a sua média com as teses da moda (já é antigo o processo de conversão de diversas lideranças desse partido) e atacou
duramente o nacionalismo do
seu interlocutor, lançando mão
de adjetivos como "ultrapassado" e equivalentes. Entusiasmado com a própria "modernidade", o petista arriscou uma piada: "Essas idéias são da geração
Dalva de Oliveira".
Para quê? O nosso físico subiu
nas tamancas, tomou o microfone e descascou o bambu no economista. Desmontou os argumentos cosmopolitas do paulista
e finalizou: "Antes pertencer à
geração Dalva de Oliveira do que
à geração Roberta Close!". O auditório veio abaixo, e o economista petista saiu com o rabo entre
as pernas (com perdão da expressão).
Volto aos dias atuais. Pode-se
dizer que os partidos que integram a base do governo federal,
inclusive o PT, tiveram bons resultados em muitas cidades importantes. Em Belo Horizonte,
por exemplo, o prefeito Fernando
Pimentel, do PT, reelegeu-se com
folga no primeiro turno. Trata-se, aliás, de figura promissora,
que ainda poderá desempenhar
papel importante na política nacional. Outros exemplos: as vitórias dos prefeitos petistas Marcelo Déda e João Paulo, ambos reeleitos com folga, já no primeiro
turno, em Aracaju e Recife, respectivamente.
Porém um outro aspecto do resultado das eleições merece ser
destacado: o fracasso do PT em
várias grandes cidades do Estado
de São Paulo. Em Ribeirão Preto,
o candidato do companheiro Palocci não chegou nem ao segundo
turno. Em Campinas, o candidato petista também ficou fora do
segundo turno. Em São Bernardo
do Campo, cidade do presidente
da República, Vicentinho, figura
de proa do PT, também foi fragorosamente derrotado. E aqui, na
capital, a derrota da companheira Marta parece provável, apesar
dos esforços em seu favor do governo federal, que considerava
São Paulo como um campo emblemático de disputa com a oposição.
Razões estritamente locais certamente pesaram nesses resultados. Mas é significativo que vários integrantes da cúpula do PT
tenham sofrido derrotas eleitorais acachapantes em São Paulo.
Não se deve perder de vista que o
PT paulista é a fração hegemônica do PT nacional. Boa parte da
cúpula do governo e do partido é
daqui de São Paulo.
É no PT paulista que se destaca
a "geração Roberta Close", talvez
pela proximidade geográfica com
o poder econômico e financeiro,
com todos os seus meios de sedução e tentação. Há muitas exceções importantes, mas a verdade
é que várias lideranças paulistas
do PT já fizeram o seu "aggiornamento" há bastante tempo.
Quem conhece um pouco a trajetória desses políticos não se surpreendeu totalmente com o que
aconteceu no governo Lula até
agora.
Assim, o susto proporcionado
pelas eleições municipais é bem-vindo. Do ponto de vista nacional, o PT e os demais partidos
que dão sustentação ao governo
Lula estão em dívida com o seu
eleitorado. A maioria dos eleitores não estava, e nem podia estar,
a par da grande influência exercida pelo "modelo Roberta Close". Mesmo os que tinham alguma noção disso ficaram surpresos com a extraordinária, para
não dizer escandalosa, dissonância entre os compromissos de
campanha e a atuação em Brasília.
Como se sabe, os petistas praticamente não cumpriram o que
prometeram. Ainda bem, pois algumas promessas e propostas
tradicionais do PT, especialmente na área econômica, eram bastante primitivas. Mas nem tudo
era bobagem, longe disso. E, de
qualquer maneira, não há governo que possa se consolidar e fazer
respeitar se não mantém um mínimo de coerência entre o seu
comportamento na oposição e no
poder.
Vamos dar os funcionários públicos como exemplo, já que hoje
é seu dia. Esse era um setor maciçamente petista, que encarava a
perspectiva de um governo Lula
com otimismo e até entusiasmo.
Assim, a decepção foi enorme, e
não preciso nem lembrar por quê.
Ora, que sentido faz agredir frontalmente um setor da sociedade
que dava sustentação ao PT havia tantos anos? O pior é que não
há governo que possa funcionar
sem o concurso do corpo de servidores permanentes do Estado. Se
o governo Lula tivesse tido um
mínimo de sabedoria, teria atendido algumas de suas reivindicações e evitado truculências na reforma previdenciária. Teria
agradado menos aos volúveis
mercados financeiros, mas contaria hoje com o apoio e o trabalho dedicado dos seus servidores
em todos os níveis. As suas condições práticas de funcionamento
seriam certamente muito melhores.
Os resultados das eleições em
São Paulo, berço e centro de gravidade do PT, constituem um
prenúncio do que poderão ser as
eleições de 2006. A "geração Roberta Close" vai ter que rebolar.
Paulo Nogueira Batista Jr., 49, economista e professor da FGV-EAESP, escreve
às quintas-feiras nesta coluna. É autor
do livro "A Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail -
pnbjr@attglobal.net
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