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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Liberalização não traz
eficiência a mercados
GILSON SCHWARTZ
da Equipe de Articulistas
A economia não vive sem alguma ideologia, mas é curioso como
a pesquisa econômica mais avançada continua colocando em xeque alguns dos princípios mais
difundidos e supostamente inquestionáveis da "boa doutrina".
As virtudes da liberalização dos
mercados continuam sendo as
principais vítimas nesse processo
de crítica e autocrítica.
Leia-se, por exemplo, o insuspeito "Journal of Multinational
Financial Management" (volume
9, edição de novembro de 1999,
publicado pela editora Elsevier).
Há nessa edição um estudo, bastante sofisticado tecnicamente,
que levanta sérias dúvidas quanto
aos efeitos da liberalização financeira nos mercados de ações que
ficaram conhecidos como "emergentes" (ou seja, de países menos
desenvolvidos).
O texto é "Financial liberalization and stock market efficiency:
an empirical examination of nine
emerging market countries" ("Liberalização Financeira e Eficiência do Mercado Acionário: exame
empírico de nove mercados
emergentes"), escrito pelos professores Hiroyuki Kawakatsu e
Matthew R. Morey, do departamento de economia da Universidade da Califórnia em Irvine e do
Smith College de Massachusetts.
Segundo a hipótese dos mercados eficientes em finanças, na medida em que ocorrer a liberalização e houver maior acesso do público aos mercados de ações, as
cotações passarão a refletir uma
disponibilidade maior de informação.
Ou seja, a teoria prevê que o aumento na oferta de informação levará a um aumento na eficiência
do processo de formação de preços no mercado de ações.
Kawakatsu e Morey realizaram
uma bateria de testes econométricos usando dados de nove países
em dois períodos de liberalização
financeira. Os nove países pesquisados foram Argentina, Brasil,
Chile, Colômbia, Índia, Coréia do
Sul, México, Tailândia e Venezuela. O período analisado vai de
1976 a 1997.
O resultado: apesar de a teoria
sugerir o contrário, descobriram
que a liberalização não aumentou
a eficiência dos mercados emergentes. Aliás, a maioria dos testes
econométricos indicou que esses
mercados já eram bastante eficientes antes da liberalização.
Os testes não confirmam a hipótese de que a abertura ao capital estrangeiro aumentou a eficiência dos mercados. Isso não
significa que esses economistas
são contra a liberalização. Reformas desse tipo são em geral
acompanhadas por outras mudanças. Portanto, nada garante
que os mercados reajam a medidas na área de investimento ou
comércio.
Ocorre que "não ser contra" ou
"não confirmar a hipótese" significa deixar os defensores da liberalização sob suspeita. Principalmente quando se constata que,
depois da liberalização, outras características acabaram se impondo, tais como a valorização excessiva e insustentável das cotações
(os fenômenos conhecidos como
"bolhas especulativas").
Talvez, sem a liberalização, o resultado fosse até pior (do ponto
de vista dos investidores e do financiamento às empresas).
Depende do critério usado na
medida dos resultados e mesmo
na definição do que é mais importante no funcionamento de um
mercado, questão que nada tem
de trivial.
Abrir espaço para esse tipo de
questionamento já é suficiente
para tomar distância com relação
à defesa cega nas virtudes da liberalização dos mercados para os
fluxos de investimento globais.
Distância, diga-se, que é ainda
mais relevante num momento em
que o debate econômico internacional se volta para os meios de
reduzir a mobilidade dos capitais
especulativos.
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