São Paulo, sexta-feira, 28 de novembro de 2008

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CHRIS WATLING

Dívida dos EUA põe pressão no dólar


Os riscos inflacionários começarão a crescer e também o risco de destruição do dólar como moeda de reserva global

AS PERSPECTIVAS do dólar são desanimadoras.
Em curto prazo, a recuperação que é aguardada nos mercados de ações poria fim à recente corrida de repatriação de dólares. A correlação invertida entre o dólar e o S&P 500 está bem estabelecida e não deve desaparecer em curto prazo. A tendência de curto prazo deve ser ainda mais reforçada pelo colapso do sistema financeiro, que prejudica a capacidade dos EUA para reiniciar o processo de alavancagem e atenua a força de sua recuperação cíclica. A incapacidade de retomar o processo de alavancagem torna impossível que os EUA liderem o mundo na fuga à recessão. E isso reforça a falta de atrativos do dólar em curto prazo.
Em médio prazo, a economia norte-americana enfrenta problemas estruturais significativos. A interação entre uma economia pesadamente endividada e um sistema financeiro devastado, em especial, sugere uma década de crescimento econômico baixo, enquanto a poupança nacional é reconstruída, e a confiança no sistema, restaurada. Os EUA são um país devedor, e suas dívidas para com o restante do mundo superam US$ 2 trilhões.
Há duas escolhas políticas distintivas para uma economia exageradamente endividada, diante de um colapso do sistema financeiro. O caminho adotado pode ter impacto significativo sobre as perspectivas cambiais de longo prazo.
A primeira escolha seria nada fazer, à espera de que a economia resolva seus próprios problemas por meio de uma recessão severa ou até depressão, com uma limpeza do sistema gerada pela quebra das empresas mais fracas, o que manteria as empresas mais fortes no mercado.
A segunda seria usar todas as ferramentas de política econômica para tentar reverter a desaceleração.
A primeira escolha é considerada impalatável do ponto de vista político, porque milhões perderiam seus empregos e muitas empresas fechariam as portas. A segunda, embora aparentemente mais palatável, acarreta risco muito maior. Caso não funcione, semeará uma década ou mais de crescimento decepcionante, com alta lenta na poupança e dores prolongadas de reajuste. Caso funcione, semeará futura inflação.
Uma política ineficaz resultaria em uma "década perdida" ao estilo japonês, acompanhada de moeda fraca. Uma política efetiva combateria a deflação de dívidas e compensaria o pior da recessão imediata, mas arcaria com um risco muito real de inflação no futuro. Isso cria risco real de crise cambial grave, quando os investidores passarem a rejeitar ativos denominados em dólares. De qualquer forma, o dólar cairá.
No momento, as autoridades econômicas americanas estão a meio caminho de adotar a segunda solução. Os juros sofreram cortes agressivos e agora são de quase zero. Os políticos estão a ponto de adotar um segundo pacote de estímulo fiscal. Os bancos foram recapitalizados. O governo começou a adquirir e garantir dívidas problemáticas.
Um fracasso da primeira rodada de medidas de reanimação da economia provavelmente conduzirá a um segundo, e mais arriscado, conjunto de escolhas políticas -que envolveriam intervenção não-esterilizada. Dados o colapso da confiança no sistema financeiro, a falta de poupança nos EUA e a desalavancagem continuada nos balanços, porém, essas políticas iniciais, cujo objetivo principal é manter a economia à tona pela criação de crédito (em lugar de pelo aumento da poupança), parecem destinadas ao fracasso.
Quando os EUA começarem a adotar o próximo conjunto de políticas para a cura da deflação, os riscos inflacionários começarão a crescer. Com eles virá o risco de fraqueza sustentada do dólar em médio prazo e o risco de destruição do dólar como única moeda de reserva global.

CHRIS WATLING é presidente-executivo da Longview Economics. Este artigo foi publicado originalmente no "New York Times".

Tradução de PAULO MIGLIACCI

Excepcionalmente, hoje, a coluna de LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS não é publicada.



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