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TRANSIÇÃO
Dilma Rousseff (Minas e Energia) diz que novo modelo não está pronto
Futura ministra descarta privatização de elétricas
Sérgio Lima/Folha Imagem
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Dilma Rousseff, futura ministra de Minas e Energia, em reunião ministerial ontem em Brasília |
SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL
A economista Dilma Rousseff,
55, deixa de lado a mineirice de
origem quando fala do futuro do
setor elétrico, que comandará a
partir do dia 1º de janeiro, como
ministra das Minas e Energia. E
fala grosso, no melhor estilo gaúcho, desenvolvido à frente da Secretaria de Minas e Energia do Rio
Grande do Sul: "nós não vamos
privatizar nenhuma empresa federal do setor", diz ela.
O governo do PT também não
deve levar adiante o desmanche
da atual estrutura que mantém integradas geração, transmissão de
energia e distribuição do sistema
Eletrobrás. "Não há nenhuma lei
no país que determine a desverticalização das empresas, isso foi
uma decisão política do atual governo, não temos por que cumprir isso", diz.
O novo modelo de gestão do setor elétrico será desenhado em
parceria com todos os agentes. Ela
afirma, entretanto, que não pretende "reinventar a roda", mas
promover uma reestruturação no
setor, fundamentada na retomada do planejamento pelo Estado,
e na parceria entre os setores público e privado para investir na
expansão da oferta de energia.
Da nova política do setor também deverá ser riscado o MAE
(Mercado Atacadista de Energia).
Criado pelo atual governo para
funcionar como uma Bolsa, para
comercializar a sobra de energia
de regiões não afetadas pelo racionamento, ele será extinto, segundo Roussef.
Folha - A sra. pretende dar continuidade ao processo de privatização e à desverticalização de empresas estatais?
Dilma Rousseff - Não existe nenhuma lei que preveja a desverticalização -a separação entre geração, transmissão e distribuição
de energia-, essa foi uma medida política. Nós não temos por
que cumprir isso. Quanto às empresas federais, nós não vamos
privatizar nenhuma.
Folha - Qual será o novo modelo?
Rousseff - Nós temos diretrizes
para o novo modelo, não temos o
novo modelo até porque ele tem
de ser construído. Assegurar através de um planejamento participativo em que todos os agentes do
sistema sejam chamados a participar e opinar, que tenha conteúdo de planejamento de longo prazo, que assegure a estabilidade do
modelo. Estamos pensando em
constituir um pool com todas as
geradoras e distribuidoras para
compra de energia, uma agência
compradora de energia, e que use
como lastro a chamada energia
velha para constituir hoje um patamar para viabilizar a expansão
do setor elétrico.
Outra diretriz nossa é preservar
a competitividade da energia hidrelétrica. É muito melhor assegurar compra de energia nova
(dos novos empreendimentos)
junto com a energia velha (das antigas hidroelétricas), fazendo um
mix para baratear o produto final.
Folha - O Copom prevê aumento
de 30,3% nos preços da energia
elétrica em 2003. A sra. concorda
com tal projeção?
Rousseff - Eu não sei com que
cenário o Copom está trabalhando, mas eles devem se basear nos
seguintes indicadores: a variação
cambial, o IGP-M e a Selic. O reajuste das tarifas ao longo do ano
sofre o efeito desses três indicadores. Então, dependendo do desempenho da inflação nos próximos meses, você pode ter uma
projeção um pouco mais baixa do
que essa ou em torno dessa.
Folha - A sra. espera um aumento
menor?
Rousseff - Eu acho que o cenário
vai ser bem mais otimista. Você
vai ter uma taxa de câmbio mais
estável e, portanto, uma pressão
inflacionária mais sob controle.
Dessa forma, pode chegar a patamares menores, em torno de 25%,
27%, mas dificilmente escapará
disso. Isso é fruto de uma concepção que indexou um serviço, a
energia elétrica, ao IGP-M.
Folha - Como o novo governo vai
enfrentar as duas bombas armadas
para estourar em 2003: a revisão
tarifária, que envolverá 17 concessionárias, e a abertura do mercado
com a liberação de 25% da energia
velha das geradoras, que será comercializada por meio de leilões? O
preço pode explodir?
Rousseff - Não, não pode. No caso da revisão tarifária, trata-se de
um reposicionamento das tarifas,
não de reajuste. O modelo atual
prevê que cada distribuidora tem
direito a um reposicionamento de
tarifas quatro a cinco anos depois
da data da assinatura do seu contrato de concessão. Aí poderá haver revisões tarifárias, inclusive,
abaixo dos reajustes tarifários. A
revisão tarifária é uma avaliação
dos últimos quatro anos de atividade das empresas quando vai-se
avaliar se o setor elétrico está tendo seu equilíbrio econômico e financeiro mantido ou não.
Folha - Qual é a real situação do
setor elétrico encontrada pela
equipe de transição?
Rousseff - A não ser que alguém
tenha uma imaginação muito fraca, supor que a situação do setor
elétrico é boa é inviável. Nós tivemos ao longo do ano de 2001 uma
das mais graves crises de que se
tem notícia na história da energia
elétrica no país. Cortar 20% a 25%
do consumo, transformar o consumo de 2002 em algo similar ao
de 1999 é algo de proporções dantescas e houve impacto disso sobre o desenvolvimento, através
do crescimento do PIB. Houve
uma queda real na produção industrial.
Folha - Um estudo recente diz
que até 2012 o país não sofre risco
de racionamento. A sra. concorda?
Rousseff - Isso é uma falácia. Primeiro, esse estudo esquece que
esse excedente que hoje existe se
deve ao fato de que houve uma
queda brutal no consumo de
energia. No entanto, se o PIB crescer 5% o consumo de energia pode chegar a crescer de 6% a 7%.
Então, não podemos supor que o
Brasil possa crescer com um crescimento residual da oferta de
energia. Não. Nós seremos chamados sistematicamente a ampliar a oferta de energia. E mais,
todos esses cálculos são feitos
considerando uma distribuição
de renda inamovível, ou seja, que
não há melhora na distribuição de
renda, como nós queremos que
ocorra. Se olharmos todos os planos econômicos recentes - o
Real, o Cruzado- cada variação
de renda real no bolso da população resultou em compra de eletrodomésticos. Ou seja, aumenta
o poder aquisitivo e se gasta mais
energia.
Folha - Como o novo governo pretende elevar a oferta de energia?
Rousseff - O setor elétrico exige
uma política de planejamento de
longo prazo. E hoje, no Brasil, ele
vai exigir que nós sejamos capazes de construir uma efetiva parceria entre o setor público e o privado. Isso porque o setor privado
é hoje o segmento estratégico
dentro do setor elétrico. Ele não é
um agente passivo. Ele é um protagonista. São dezenas de empresas que investiram e que a gente
deseja que continuem investindo.
Ora, esses agentes seguiram a
orientação da política macroeconômica que vigorou no Brasil, ou
foram influenciados por ela . Eles
se endividaram e hoje têm problemas para fazer a rolagem das suas
dívidas.
Folha - Esse setor está em crise no
mundo inteiro, não tem como investir. Quem vai investir na expansão da oferta aqui?
Rousseff - Algumas dessas empresas tiveram problemas, mas isso não significa que, num quadro
de estabilidade, você não tenha
investidores privados internacionais que queiram fazê-lo. Mas não
vamos achar que os investimentos privados foram feitos no Brasil
só com empréstimos internacionais. Houve grande peso dos fundos de pensão do BNDES. É óbvio
que vamos ter de conviver com
esse cenário de dificuldade de crédito internacional. Ao mesmo
tempo, as estatais têm recursos
mas estão proibidas de investir
para garantir o superávit primário.
Folha - Vocês contam com os recursos das estatais para a expansão da oferta?
Rousseff - Eu acho que essa vai
ser uma das fontes, jamais a única. Por um simples motivo, porque não é suficiente. Eu creio que
é viável manter um superávit fiscal alto e aumentar o investimento das empresas públicas como
condição de expansão do setor
elétrico.
Folha - O programa do PT chegava a propor a extinção do MAE, isso
vai ocorrer?
Rousseff - O MAE não desempenha, nunca desempenhou e jamais desempenhará seu papel, é
uma ficção. Vamos extinguir a ficção. Ele continuará como mercado de diferenças, regulado, não
vai ser essa maluquice que a cada
vez que funciona pune alguns
agentes e, em muitos casos, leva a
ganhos especulativos de outros.
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