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LUÍS NASSIF
O BNDES, a escrita e a fala
O presidente do BNDES
(Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Carlos Lessa, padece da
chamada "dissonância cognitiva" entre o que escreve e o que
fala. Seu discurso de posse, no
banco, tinha nexo e, em linhas
gerais, abordava o que se espera
de um banco de desenvolvimento. Dizia que banco de desenvolvimento não é banco de
investimento, porque, enquanto o segundo privilegia a segurança, o primeiro precisa
apoiar setores novos, que sejam
relevantes para o país.
Igualmente correto é seu conceito de "operação-hospital".
Quando uma empresa viável é
inviabilizada por problemas de
gestão ou de capitalização, deve-se afastar o empresário, mas
preservar a empresa. Se fechada, perdem os empregados, perdem os credores e perde o país.
Não faz sentido, no entanto, colocar o BNDES como gestor de
empresas em dificuldades.
No plano das declarações, o
meio-de-campo embola. Tome-se sua afirmação de que o banco vai se engajar no Fome Zero,
financiando indústrias de alimento, especialmente da cadeia
protéica, e a logística de distribuição. Ou sua declaração de
que "entre financiar uma indústria para dar alimentos ou
uma emissão de capital vou para a indústria".
O problema da fome no Brasil
é de renda, não de insuficiência
de produção de alimentos. O
banco vai continuar financiando a indústria de alimentos, assim como a de autopeças, a indústria de base, de base tecnológica e outras que se habilitarem
aos seus financiamentos, porque esse é seu papel. Vai financiar a logística porque ela é fundamental para o aumento da
competição interna. O fato de
alimentos transitarem pelos novos caminhos abertos não tornará o banco mais ou menos
engajado no Fome Zero, porque
esse não é seu papel.
Também é falso o dilema entre financiar indústria de alimentos ou emissão de capital.
Confunde-se setor de produção
com modelo de capitalização.
Declara que a prioridade do
banco é a "inclusão social" e
que irá privilegiar a geração de
empregos. Dito assim, fica parecendo que definiu como prioridade apoiar setores de mão-de-obra intensiva -justamente os
que menos agregam valor, os
que menos aumentam a renda
e os que menos ajudarão o país
a se tornar competitivo internacionalmente e, certamente, os
que menos se encaixam no conceito de "setores novos", defendido por ele próprio.
Quando ele diz que o novo
modelo de atuação do BNDES
não será o de JK, nem o de Vargas, nem o de Geisel, ótimo!
Mas qual o modelo? Fome Zero
pode vir a ser modelo de política social, não de política de desenvolvimento. O discurso escrito esclarece alguns pontos; o
discurso falado confunde. Como a fala rende mais manchetes do que a escrita, seria prudente policiar-se mais nas declarações.
Fome tutelada
Essa história de o Fome Zero
controlar como deve ser gasto o
dinheiro distribuído aos famintos é o auge da síndrome da tutela e do academicismo. Montar
uma estrutura em âmbito nacional para adquirir alimentos,
definir que o beneficiado pode
comprar arroz e feijão, mas não
pode comprar bolachas, exigir
nota fiscal para comprovar o
que foi comprado é de uma falta
de senso fantástica.
É operacionalmente inviável,
politicamente autoritário, socialmente antipedagógico. Na
maioria das cidades ou esses
conselhos municipais serão manipulados pelos respectivos prefeitos ou pelos fornecedores ou
politizarão a bandeira. Será a
volta dos padrinhos na política
social.
E-mail - LNassif@uol.com.br
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