São Paulo, sexta, 29 de janeiro de 1999

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Especialista prevê queda do dólar em 99

do enviado especial

Quem imagina que a forte turbulência nos mercados cambiais do planeta está no fim que ouça a previsão de um dos maiores especialistas em economia internacional, Fred Bergsten.
"Um dos grandes eventos econômicos globais de 1999 tende a ser um forte declínio na taxa de câmbio do dólar", diz ele.
Bergsten preside o Instituto para Economia Internacional.
Como é óbvio, pela sua hegemonia como moeda de referência global, uma eventual desvalorização acentuada do dólar terá conseqüências para todo o planeta.
Para o Brasil, podem ser negativas, se estiver correta outra previsão de Bergsten: o surgimento de "uma grande variedade de pressões protecionistas nos Estados Unidos".
Motivo: o déficit das contas externas norte-americanas (US$ 300 bilhões previstos para este ano, ou 3,5% de seu PIB). Era nesse patamar que o déficit dos EUA estava na metade dos anos 80, época em que o dólar perdeu mais de 50% de seu valor ante o marco alemão e o iene japonês.
Pior: o protecionismo, prevê Bergsten, se voltará, entre outros setores, para as indústrias de aço (o que, aliás, já está ocorrendo), têxteis e produtos agrícolas -exatamente aqueles em que a desvalorização do real tornaria a produção brasileira mais competitiva.
Bergsten engrossa o coro pela introdução do que chama de "flexibilidade controlada" do câmbio entre as três grandes moedas (dólar, marco e iene).
Quer dizer o seguinte: os governos estabeleceriam uma banda de flutuação para a relação entre elas. Sempre que o limite máximo ou mínimo da banda estivesse sendo violado, interviriam, comprando ou vendendo, para restabelecer o equilíbrio.
Bergsten usa um argumento que serve para o presente regime brasileiro de livre flutuação cambial: "A flutuação freqüentemente degenera em prolongados desalinhamentos que montam o cenário para novos surtos de instabilidade financeira".
A previsão de turbulência para o futuro imediato -e talvez para o não tão imediato- é virtualmente consensual entre participantes do 29º encontro anual do Fórum Econômico Mundial, no qual Bergsten apresentará hoje sua previsão sobre o dólar.
Basta dizer que Charles Dallara, diretor-gerente do Instituto de Finança Internacional, o conglomerado dos grandes bancos planetários, pergunta: "Sobreviveremos a 1999 na economia global? E como o faremos?".
Resposta (otimista) de Kenneth Courtis, economista e estrategista-chefe do Deutsche Bank para a Ásia-Pacífico: "Sobreviveremos porque o mundo está fazendo um esforço sem precedentes de reflação da economia".
Reflação é o neologismo que Courtis criou para contrapor-se com a deflação, que significa uma queda generalizada nos preços, causando forte contração da economia.
O economista do Deutsche Bank cita, por exemplo, o fato de que, de outubro para cá, 74 bancos centrais no mundo reduziram seus juros. Ele prevê que virão novas quedas nas taxas e, também, nos impostos, tudo para relançar o crescimento econômico.
Mas, se essa "reflação" não funcionar, os números apresentados pelo próprio Courtis são assustadores. Dois deles:
1 - Há um excesso de produção no mundo. Só de automóveis, são produzidas 60 milhões de unidades, para vendas que não passam de 44 milhões. O excedente iguala a produção da Europa Ocidental.
2 - Há, igualmente, excesso de endividamento. Os 100 principais bancos dos países mais ricos do mundo têm empréstimos a mercados emergentes no valor de US$ 2,4 trilhões.
Mas seus ativos não passam de US$ 1,6 trilhão, assim mesmo contando US$ 300 bilhões de bancos japoneses, que são mais virtuais que reais.
"Se a Indonésia, a Rússia e o Brasil pagarem apenas US$ 0,65 por dólar que tomaram emprestado, haverá uma perda de US$ 800 bilhões para os bancos, ou exatamente a metade de seus ativos", aterroriza Courtis.
Detalhe: no encontro de 98 do Fórum, foi Courtis quem previu que o real desabaria em mais ou menos seis meses, o que lhe valeu ser chamado de "palpiteiro" pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. (CR)



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